Assassin's Creed: Syndicate

por Durval Ramos

Um jogo para reconquistar os fãs

Eu realmente queria acreditar em Assassin’s Creed: Syndicate. Depois de todos os problemas com Unity, queria ver a franquia se reerguendo e mostrando que tudo não passou de um ponto fora da curva. Mesmo que a fórmula já venha demonstrando alguns sinais de cansaço, que é possível ir além e trazer de volta o brilho à saga. E foi isso o que eu encontrei.

Sem qualquer dúvida, o novo game é o melhor  título da série desde Assassin’s Creed 2. A Ubisoft sabia da responsabilidade que este lançamento carregava e apostou todas as suas fichas em um retorno às origens para reconquistar a confiança dos fãs. Para isso, deixou de lado a ideia de querer sempre fazer algo maior e mais complexo e se ateve ao básico e ao essencial para entregar um excelente jogo.

Reduzir é ampliar

Ao nos levar para a Londres do século XIX, em meio às transformações da Revolução Industrial, vemos o quanto o game evoluiu e melhorou em relação aos anos anteriores. Assassin’s Creed: Syndicate é tudo aquilo que Unity deveria ter sido, trazendo um contexto histórico interessante e muito bem representado, uma boa utilização das dimensões do mapa e, acima de tudo, sem pecar pelo exagero.

Este é o melhor jogo da série desde Assassin’s Creed 2. Ele simplifica mecânicas ao mesmo tempo em que evolui outras — tudo sem deixar de ser incrível.

Ao longo das várias entrevistas dadas ao longo dos últimos meses, o estúdio reforçou o quanto eles se concentram na experiência central da série. E isso é facilmente notado enquanto você caminha pelas ruas da capital inglesa ou salta pelos telhados das fábricas. Tudo aquilo que estava ali apenas para fazer volume foi retirado e houve uma enorme preocupação em tornar as coisas muito mais simples e ágeis.

Isso fica claro na própria jogabilidade. O uso do arpão simplificou a exploração vertical. Com o novo acessório, não é mais preciso perder tempo procurando o melhor ângulo para escalar o Big Ben e ir do topo de um prédio a outro é algo que você pode fazer em questão de segundos. Essa é uma adição que faz toda a diferença em termos de dinâmica e ritmo e, mesmo sendo uma evolução daquilo que vimos em Assassin’s Creed: Revelations, tem o ar de novidade que a série precisa.

O mesmo acontece com as carruagens. Uma das coisas que mais incomodava no mapa enorme de Unity era o tempo gasto para ir de um ponto a outro do cenário. No entanto, Syndicate resolve isso muito bem. Assim como em um GTA vitoriano, você pode abordar qualquer veículo, expulsar o cocheiro e seguir seu caminho com o dobro da velocidade.

Assassin's Creed: Syndicate

Assassin’s Creed: Syndicate é tudo aquilo que Unity deveria ter sido. Ele é o verdadeiro avanço da série para a nova geração.

Essas charretes oferecem ainda ótimos momentos. Como é possível largar a direção e ficar sobre a estrutura, o jogo se aproveita disso para criar cenas bem diferentes e divertidas. Seja um combate em movimento, uma perseguição ou mesmo para pular de charrete em charrete, as missões exploram essa nova possibilidade de diversas maneiras e sem soar repetitivo.

Esse, aliás, é outro cuidado com o qual a Ubisoft se preocupou. Ao contrário dos games anteriores, Assassin’s Creed: Syndicate conta com missões bem interessantes e variadas. Ainda que tenhamos aqueles desafios chatos de seguir alguém ou não perder de vista tal inimigo, esses momentos são bem pontuais. De maneira geral, o jogo conta com situações bem diferentes e que exploram tanto o período histórico quanto as novas mecânicas.

Assassin's Creed: Syndicate

Até mesmo os momentos modernos foram melhorados. Como eles não são mais jogáveis, aquela interrupção que tanto incomodava os jogadores deixa de acontecer. As cenas no presente ainda existem e são importantes, mas são apresentadas tudo a partir de rápidas cutscenes, o que não atrapalha o ritmo da trama.

O fim do modo multiplayer também contribuiu para essa simplificação, já que ele não faz falta e até ajuda o game a ser bem melhor do que seus antecessores. Sem sua parcela online, a Ubisoft pôde se concentrar em fazer com que Syndicate seja um jogo redondo e funcional, preocupando-se com os detalhes e com o próprio acabamento. Tanto que você quase não encontra bugs e nem grandes quedas de framerate.

Coisas de família

Esse retorno às origens de Assassin’s Creed: Syndicate também está presente na trama. Como a Revolução Industrial não é um fato com data marcada, mas um processo histórico, a Ubisoft teve muito mais liberdade de trabalhar seu enredo e de criar seus próprios personagens. Assim, a luta entre Assassinos e Templários fica bem mais interessante, principalmente por não se preocupar com eventos específicos — acabando com aquela passagem de tempo horrível que tínhamos até então. Tudo é bem mais contínuo e lógico.

A escolha da Londres do século XIX em plena Revolução Industrial é o cenário perfeito para a guerra entre Assassinos e Templários. E a história aproveita isso muito bem.

Além disso, a escolha do momento não poderia ser mais acertada. As transformações sociais, econômicas e políticas trazidas durante a Revolução Industrial fazem com que Londres seja o palco perfeito para o novo capítulo da batalha entre as duas ordens. Assim, de um lado, temos os Templários controlando todo o processo de produção e, do outro, os Assassinos tentando acabar com esse domínio sobre a capital. Quase um jogo comunista — se o Comunismo existisse nessa época.

Esse contexto se encaixa muito bem com aquilo que vimos nas aulas de História, além de criar situações que empolgam, principalmente pelos vilões bastante interessantes e críveis. Outro ponto que chama a atenção é que Syndicate esquece aquela baboseira sobre Sábios que vimos nos jogos anteriores para retomar a busca pelos Piece of Eden.

Assassin's Creed: Syndicate

Jacob e Evie Frye são carismáticos e os melhores personagens da série em anos. Não vai demorar para que estejam ao lado de Ezio e Altair entre os mais amados pelos fãs.

Porém, nada disso seria possível sem a presença dos irmãos Jacob e Evie Frye, a nova dupla de assassinos da série. Eles fazem sua estreia em grande estilo, e não apenas por ser a primeira vez em que teremos dois personagens jogáveis, mas porque eles são uma grande adição na narrativa. Depois de vários anos com heróis apáticos e pouco carismáticos, os gêmeos Frye conseguem reverter isso. Eles têm uma dinâmica bem própria e os diálogos mostram que logo eles aparecem lado a lado de Ezio e Altair na lista de assassinos mais queridos dos fãs.

Só que essa novidade não é positiva apenas na narrativa. Cada um dos novos personagens possui seu próprio estilo e você sente isso na jogabilidade. Enquanto Jacob é muito mais bruto e porradeiro, sua irmã segue por uma pegada bem mais focada no stealth e na velocidade. Com isso, apesar das várias semelhanças aqui e ali, cada um dos novos heróis possui sua própria mecânica. Não por acaso eles possuem equipamentos e habilidades diferenciados.

Um recomeço que vem das ruas

Por fim, Assassin’s Creed: Syndicate é tudo aquilo que os fãs esperavam há anos. Sem exageros ou ideias exageradamente ambiciosas, ele se concentra naquilo que é preciso para se fazer um bom jogo: ótimos personagens, história interessante e mecânicas simplificadas. A partir desses pequenos elementos, ele corrige toda a bagunça que os games anteriores fizeram e mostra que a série ainda é muito divertida.

Assassin's Creed: Syndicate

E não se trata apenas de cortar os excessos e aparar as arestas, mas de fazer isso ao mesmo tempo em que evoluiu aquilo que os seus antecessores já fizeram. Basta ver como a própria mecânica da Irmandade vista em Assassin’s Creed: Brotherhood se transformou nas gangues de Syndicate. É uma transformação simples, mas que funciona dentro do contexto apresentado.

A Ubisoft parece ter esquecido de que essa simplicidade é algo que funciona e se deixou levar por um entusiasmo cego até agora. Foi preciso cair para olhar para trás e entender isso. Assassin’s Creed: Syndicate pode não ser a reinvenção da série, mas é um ótimo recomeço. Ele é o verdadeiro início da série para esta nova geração.

O jogo foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Ubisoft.