Dead Rising

Dead Rising Triple Pack

por Felipe Demartini

Rigor mortis

Apesar de ser a mais recente, Street Fighter V não foi a primeira vez que a Capcom criou títulos exclusivos para determinados consoles. A prática, inclusive, é bastante comum na empresa, desde os idos do Nintendinho até os dias de hoje. E se, agora, o PlayStation 4 tem o game de luta para chamar de seu, os usuários de consoles da Microsoft sempre puderam contar com a franquia Dead Rising.

Assim como o quarto título da série, que chega no final do ano, o primeiro, até agora, também era exclusivo do Xbox 360, e com exceção de um lançamento para o Nintendo Wii, aproveitando o motor gráfico de Resident Evil 4 e que se parece mais com um remake do que um port, nunca havia saído de lá. Muitos colocarão as mãos no game somente agora, dez anos depois de seu lançamento original, em um aspecto que, por si só, já torna a remasterização Dead Rising Triple Pack relevante.

Ou não, já que a sensação que temos ao jogar o primeiro jogo da série depois de tanto tempo é parecida com a noção que temos de um cadáver em decomposição, como tantos que esmagamos no game. O tempo não fez nada bem ao título, e, agora, em Full HD, essas marcas aparecem como nunca. Estamos falando de um game que não apenas tem uma década nas costas, mas que também é de começo de geração, uma época em que os desenvolvedores ainda estavam aprendendo algumas lições.

Os gráficos, aqui, acabam sendo o menor dos problemas. Eles têm aquele estilo antigo a que tanto nos acostumamos recentemente, com diversos relançamentos do tipo. A remasterização, entretanto, nada mais é do que um mero upscalling nas texturas, o que torna o resultado bem aquém do que se espera de algo do tipo. Não é feio, mas não é o “extreme makeover” que um título desse tipo permite – e merece.

A maior questão, entretanto, acabam sendo os controles. Dead Rising é um jogo extremamente truncado, com uma movimentação digna de jogos antigos, do começo da era tridimensional. Mirar uma arma, por exemplo, se torna um martírio quando a mesma alavanca de movimentação é usada para fazer isso. Até é possível modificar isso nas opções, mudando de lado, mas o resultado continua sendo difícil de se acostumar.

É impossível andar e atirar, mas apenas para o protagonista, enquanto todos os inimigos humanos – uma ameaça maior que os desmortos – são mais rápidos e fortes do que ele. As batalhas contra chefes, então, se tornam um sufoco, e uma é encontrada logo de início, já mostrando que este não é um título para os fracos.

No primeiro Dead Rising, controlamos Frank West, um repórter fotográfico em busca de fama e fortuna. Ele vê no desastre de Willamette a chance para obter justamente isso, e parte sozinho para lá. Com o relógio contando 72 horas (em tempo real), o jogador deve tirar fotos, descobrir a verdade sobre o que está acontecendo e ainda resgatar alguns sobreviventes no processo.

Essa descrição faz com que o título pareça ser sério, entretanto, é exatamente o inverso. Por trás da catástrofe e da sensação de pressão pelo relógio que não para de correr, está um game altamente focado na diversão, com hordas gigantescas de zumbis para aniquilar das formas mais diferentes e criativas possíveis. Isso sem falar no vasto guarda-roupas de West – ele, afinal de contas, está em um shopping, e sendo assim, experimenta todas as possibilidades que estar preso em um local assim abre.

Dead Rising

É justamente nessa questão que reside o principal apelo não apenas do primeiro jogo, mas de todo o Dead Rising Triple Pack. Apesar da contagem regressiva, temos aqui um game relativamente livre, que permite ao jogador seguir do jeito que quiser, usar as armas que desejar e, acima de tudo, cumprir as missões na ordem em que preferir. Parece comum, hoje, em jogos de mundo aberto, mas na época, era algo novo.

O tempo não fez nada bem ao primeiro Dead Rising, um game do começo da geração passada. Agora, essas marcas aparecem como nunca.

Quando zumbis estão envolvidos, tudo fica ainda melhor. Um dos grandes objetivos de Dead Rising era aproveitar o potencial do Xbox 360 para gerar centenas de mortos-vivos ao mesmo tempo. E eles estão lá, em todo seu esplendor e putrefação. Voltam, também, as quedas na taxa de frames, justificáveis no original, mas fruto de uma falta de otimização neste relançamento.

Se jogar “sério” é seu intuito, entretanto, talvez você esteja melhor servido com Dead Rising 2, a sequência lançada em 2011. Sem Frank West, mas com Chuck Greene como protagonista, o título reúne a insanidade e a diversão a uma jogabilidade incrivelmente melhorada e com objetivos mais definidos. Até mesmo o upscalling realizado pela Capcom cola aqui, pois já estamos falando de um título com visuais contemporâneos.

Dead Rising

Evoluindo praticamente todos os aspectos de seu antecessor, a continuação é maior e melhor. Estamos em um cassino, que inclui um shopping, arena de jogos e diversas outras áreas. Temos um protagonista com um senso de urgência muito maior – sua filha está infectada, e precisa ser medicada uma vez por dia para não se transformar em zumbi. E, acima de tudo, uma zoeira com menos limites ainda.

Dead Rising 2 traz variação à fórmula aumentando o rol de roupas, a quantidade de mortos-vivos e, principalmente, combinações a serem feitas. E muita coisa está disponível logo de início, ao contrário do antecessor, no qual as coisas demoravam para acontecer. Manter o jogador ligado enquanto se banha em sangue e imagina maneiras criativas de acabar com os zumbis é o grande trunfo da sequência.

Quem procura uma opção de jogo de mundo aberto deve voltar seus olhos – e dinheiro – para Dead Rising 2.

O título também foi um dos poucos da franquia a ter um lançamento multiplataforma, chegando ao PC, PS3 e Xbox 360. Aqui, vale a pena jogar de novo, principalmente pela diversão, em um jogo de 2011 que não perdeu seu apelo mesmo tanto tempo depois, tendo também firmado as bases para praticamente todos os games da série que vieram depois.

Por último, mas não menos importante, Dead Rising Triple Pack nos traz Off the Record, uma espécie de expansão do segundo jogo da série, apesar de a Capcom, provavelmente, não curtir muito essa nomenclatura, preferindo falar em “reimaginação”. Ao jogar o título, entretanto, não dá para afastar a sensação de que estamos diante de um mod lançado por vias oficiais.

Dead Rising

No game, Chuck Greene é substituído por Frank West. O repórter caiu em desgraça ao não saber lidar com a fama obtida ao sobreviver a Willamette, e se vê obrigado a participar de programas de TV de qualidade questionável para pagar as contas. Ele, entretanto, acaba envolvido no incidente em Fortune City, e mesmo infectado e fora de forma, decide encarar os zumbis mais uma vez, com sua câmera, para recuperar o antigo status.

Alguns diálogos e situações até são diferentes, mas na maior parte do tempo, o que temos aqui é West nas mesmas cutscenes de Greene, o que inclui também diálogos iguais e até mesmo reações semelhantes diante dos personagens. A personalidade dos dois não é tão parecida assim, se você parar para pensar, o que torna o resultado bastante esquisito, principalmente se você tiver jogado algum dos games anteriores.

Existem, claro, adições aqui para justificar o spin-off, que nem mesmo é considerado canônico. A mecânica de fotografia, por exemplo, está de volta, garantindo experiência extra para West, assim como novas áreas em Fortune City, roupas e equipamentos inéditos. Entretanto, basicamente, é o mesmo jogo de sempre, mas um pouquinho piorado, e com muita vontade de caçar níqueis.

Dead Rising

A coletânea Dead Rising Triple Pack pode ter bastante apelo para fãs da franquia, que eventualmente tenham a conhecido apenas na atual geração, no terceiro jogo, e gostariam de ter acesso aos outros. Mas aqui, é melhor não ir com muita sede ao pote, principalmente em relação ao primeiro, que está bem abaixo dos outros em termos de qualidade e jogabilidade. A ideia é semelhante a uma franquia de filmes de terror, que começou com baixo orçamento e foi melhorando, na medida em que caía no gosto do público.

Quem procura uma nova opção em termos de jogo de mundo aberto, entretanto, deve voltar seus olhos – e dinheiro – para Dead Rising 2. Ele ainda é um ótimo título, mesmo cinco anos depois de lançado, e apresenta tudo aquilo que os jogadores de hoje procuram em um game do tipo. Se matança é o que você quer, aqui está sua melhor oportunidade de encontrar isso.

Os games foram analisados no PlayStation 4, em cópias cedidas pela Capcom.