Quatum Break

Quantum Break

por Durval Ramos

Paradoxo temporal

O tempo acabou. Não apenas como uma expressão de linguagem, mas de maneira literal. Chegou aquele momento em que o tempo literalmente chegou ao seu fim e as consequências desse fim não são nada positivas.

Mas Quantum Break não é somente mais uma típica e confusa história de viagem no tempo. Estamos falando da Remedy, estúdio conhecido pelo peso de seus roteiros, e essa experiência na hora de contar sua história e é isso que faz com que o game se difira tanto daquilo que você já viu antes. Por mais que não seja tão inovador quanto muitos esperavam, ele continua bem acima da média.

 

E isso vindo de um jogo que tinha tudo para dar errado. Quando foi anunciado, Quantum Break era a representação máxima da integração entre games e TV que a Microsoft pretendia para o Xbox One. No entanto, a empresa logo desistiu dessa proposta e o estúdio teve de se virar para manter a proposta inicial. Assim, o jogo deixou de ser transmídia para ser apenas multimídia — e a diferença é gritante.

É claro que mudanças assim são problemáticas e, em alguns casos, fatais. Contudo, a Remedy soube lidar com todos esses reveses e, no fim, apresenta um excelente trabalho. Longe de ser revolucionário ou inovador como muitos imaginavam, mas ainda interessante, envolvente e divertido.

O fim do tempo

Como dito, a história de Quantum Break é confusa como toda trama envolvendo linhas temporais. Em resumo, alguém cria uma máquina para viajar no tempo, mas algo dá errado e isso faz com que o próprio tempo esteja prestes a implodir.

No meio de toda essa bagunça está Jack Joyce, o herói vivido pelo ator Shawn Ashmore. De alguma maneira, ele consegue controlar alguns fenômenos temporais ao mesmo tempo em que é perseguido pela Monarch, uma gigantesca empresa que parece ter alguma relação com todo o caos. E é aí que a correria começa.

A princípio, tudo é muito confuso — e é aí que está a graça de Quantum Break. A Remedy criou um roteiro que parece não fazer sentido, mas cujas peças vão sendo encaixadas aos poucos e revelando um panorama muito maior do que está acontecendo. E essa descoberta gradual é algo que prende o jogador do começo ao fim, mostrando que o enredo é, de verdade, o maior trunfo do jogo.

Quantum Break

A série expande o universo, mas é longa e quebra o ritmo do jogo. É uma custscene de luxo que funciona muito mais separadamente do que intercalando com o game.

Adicione a isso a própria série, que vem para complementar e expandir a narrativa. Enquanto o jogo em si concentra sua trama em Joyce, os episódios ao fim de cada ato do game apresentam e aprofundam outros personagens e a própria Monarch. A partir de mídias diferentes, a produtora traz pontos de vistas diferentes desse universo e mostrar como ele extenso. E faz tudo isso muito bem, ainda que com algumas ressalvas.

Primeiro porque esses episódios nada mais são do que cutscenes de luxo. A produção em live-action com atores renomados traz um peso muito maior à produção, mas sua função narrativa do jogo é a mesma da cena em CGI que você um pouco antes. E é por isso que a sua duração incomoda tanto.

Por mais interessante que seja acompanhar esse outro lado, não há como não se cansar ao se deparar com uma cena de quase 20 minutos ao fim de cada ato. Tudo bem que ela apresenta um outro lado da história e é responsável por mostrar as consequências de suas escolhas, mas é cansativo interromper a jogatina para conferir outro conteúdo, ainda mais tão longo assim. Fica claro que o formato funcionaria muito mais separado, como uma série, do que como uma cutscene mesmo.

Quantum Break

Porém, isso está longe de ser um problema, já que a Remedy conduz tudo muito bem. A quebra de ritmo é inegável, mas ela ainda consegue alinhar jogo e série de modo que o clímax de cada uma delas aconteça quase que simultaneamente, o que mantém o jogador/espectador empolgado. Além disso, o próprio game possui uma estrutura narrativa mais serializada, o que minimiza o impacto dessas interrupções.

Costuras temporais

Se a história de Quantum Break é seu ponto alto, a jogabilidade não fica atrás. Ainda que ele não seja nada inovador e nem revolucione o gênero, o game ainda consegue ser um shooter muito acima da média. A Remedy conseguiu costurar tudo aquilo que funciona no gênero, misturando ação e exploração com as características únicas do game para criar algo diferente que é, ao mesmo tempo, bastante familiar.

O destaque aqui fica por conta do cuidado que o estúdio teve com o design. Estruturalmente, o jogo é bastante linear. Assim como tantos outros títulos do tipo, o jogador é colocado em um grande corredor e deve seguir em frente e pronto. Porém, as situações apresentadas são tão bem construídas e pensadas que você realmente não percebe essa linearidade.

Quantum Break

Quantum Break utiliza muito bem os efeitos de controle do tempo tanto para criar combates mais dinâmicos quanto na exploração do cenário, mascarando a linearidade do game.

É um efeito que lembra muito o que Naughty Dog fez em The Last of Us, criando a falsa sensação de vastidão do mundo mesmo em trechos limitados. Quantum Break envolve o jogador e consegue esconder a simplicidade de seu caminho a partir de soluções simples, mas que funcionam muito bem. É a prova de que linearidade não é algo ruim, contanto que seja bem trabalhada. Ele é tudo aquilo que The Order: 1886 deveria ter sido.

Outro ponto está na estrutura dos combates. Ele não consegue fugir do clichês de “avance até ser surpreendido por bandidos”, mas compensa isso com ótimos confrontos. A utilização dos poderes de Jack Joyce muda completamente a dinâmica e é preciso entender o funcionamento de cada habilidade para saber como usar cada uma delas a seu favor. E como há inimigos com poderes parecidos, saber como tirar proveito disso é fundamental — e grande parte da graça do game. Só seria melhor caso fosse um pouco mais desafiador.

E essas skills não são úteis apenas para os tiroteios, mas para a própria exploração do cenário. Os poderes de Joyce podem ser usados em vários momentos para conseguir mais informações sobre aquele mundo, descobrir segredos ou mesmo para resolver certos puzzles. É uma combinação de level design com elementos de jogabilidade que cria a sensação de que você está em algo muito maior.

Quantum Break

Do jeito certo

Quantum Break não vai ser um clássico e nem é revolucionário como se esperava, mas ainda está acima da média. É um jogo com uma história muito bem construída e ótimas soluções que envolvem o jogador do começo ao fim.

De novo: Quantum Break não é nada inovador ou revolucionário como muitos esperavam. Contudo, isso não é problema, já que ele ainda consegue entregar algo diferente e muito acima da média. Ele continua sendo um shooter como tantos outros, mas muito bem feito e conduzido, seja pela sua excelente jogabilidade ou pela história que é muito bem contada. E é isso o que realmente importa.

É óbvio que todos os problemas de produção afetaram o potencial que existia ali. O vai e vem da Microsoft em relação às suas estratégias forçou a desenvolvedora a rever muitos conceitos e fica claro que a proposta de misturar mídias funciona muito mais separadamente do que intercalando-as. Porém, o trabalho de roteiro da Remedy segura muito bem essa bomba que lhe foi jogada nas mãos. Ele é um jogo que se arrisca, tropeça, mas não cai.

Isso vai fazer dele um clássico do Xbox One? Dificilmente, mas com certeza o coloca como um ótimo exclusivo do console.