Se você já passou dos 20 anos de idade, com certeza se lembra de Silent Hill e Resident Evil. Possivelmente eles tenham sido seus primeiros jogos de horror, em uma época na qual você já tinha idade suficiente para entender o que era o terror e efetivamente se assustar. Ao mesmo tempo, você também jogou os clássicos de 8-bits e sabe exatamente quão divertidos eram os games de antigamente.
Agora, imagine tudo isso unido em uma fórmula só, só que nas plataformas recentes. Essa é a melhor forma de descrever Lone Survivor: The Director’s Cut, título lançado originalmente em 2012 para os PCs e que, desde setembro de 2013, está disponível também para o PlayStation 3 e PS Vita.
Na história, um personagem que é identificado apenas como “Você” – sim, ele representa o próprio jogador – está isolado em um prédio de apartamentos, muito tempo depois de uma praga devastar o mundo e transformar as pessoas em criaturas famintas semelhantes a zumbis. Seria uma história comum não fosse a linha tênue entre consciência e insanidade, com o protagonista muitas vezes vagando por um mundo de sonhos e, em outras, passando pelo que parecem ser alucinações.
E é nessa pegada que você não apenas nunca estará seguro, mas também estará lutando constantemente para discernir aquilo que é real do que é imaginário. Usando elementos bastante conhecidos do público de jogos de terror e mostrando que o Survival Horror pode não estar tão morto quanto imaginamos, Lone Survivor: The Director’s Cut é uma experiência indie com cacife de grande produção.
Usando elementos bastante conhecidos do público de jogos de terror e mostrando que o Survival Horror pode não estar tão morto quanto imaginamos, Lone Survivor: The Director’s Cut é uma experiência indie com cacife de grande produção.
Apesar de não ser necessariamente inovador – talvez apenas em sua apresentação –, o título criado por Jasper Byrne combina com maestria diversos elementos da cultura dos jogos de horror de sobrevivência. Mas não estamos falando apenas de características práticas, mas também das antigas sensações ou emoções causadas pelos jogos do tipo.
A jogabilidade simples, que é padrão nos jogos bidimensionais, ganha novos contornos quando o jogador deve vasculhar os cenários em busca de suprimentos ou informações que o auxiliem em suas jornadas. Assim como nos melhores jogos do gênero, absolutamente tudo pode ser examinado e muitos dos elementos do cenário, até mesmo os mais triviais, podem esconder detalhes sobre a trama ou indicar o que fazer em seguida.
Os recursos, como não poderia deixar de ser, são escassos. Logo de início, o jogador recebe uma arma para utilizar contra os monstros, mas a munição é limitada e o recarregamento o deixa vulnerável. Uma lanterna permite enxergar o ambiente ao custo de gasto de bateria, além de atrair os monstros das proximidades.
Mas o uso mais interessante dos suprimentos de Lone Survivor acontece na gestão da fome e do sono, que têm influência direta na sanidade do personagem principal. Ficar sem comer pode deixar o protagonista mais lento e fraco, enquanto a privação de descanso faz com que ele alucine com mais frequência. Os sonhos reais podem ser vantajosos, ocasionando o surgimento de mais itens, mas também podem significar a morte. A escolha fica totalmente a cargo de quem está jogando.
Byrne também aproveita a linha tênue entre realidade e loucura para incluir elementos míticos que auxiliam no desenvolvimento do enredo ou facilitam a jogabilidade. É o caso, por exemplo, dos espelhos que levam o jogador diretamente ao quarto que serve como base principal ou do misterioso homem com uma caixa na cabeça que aparece durante os sonhos e tem sua aparência modificada de acordo com as ações tomadas no “mundo real”.
Mas acima de tudo, Lone Survivor não aposta nos jump scares ou nas criaturas gigantescas para tentar assustar o jogador. Pelo contrário, faz isso com elementos simples e do cotidiano, contando pouco da história, dando quase nenhuma informação e deixando que ele explore o mundo e descubra como sobreviver por si só. E esse é o principal fator de imersão no mundo do game. Afinal de contas, é “Você” quem está ali.
Apesar de ter todo seu estilo derivado dos jogos do passado, Lone Survivor faz bom uso de técnicas atuais para envolver o jogador e leva-lo para dentro desse aterrorizante mundo. E aqui o principal destaque é a utilização do áudio, que consiste em sons constantes que trazem toda a desolação, desespero e insanidade direto para os ouvidos.
Logo de início, o jogador é orientado a usar um bom sistema de som – vale a pena escolher bons fones para o PlayStation Vita – e deixa-lo em um volume mediano. Muito rapidamente, o áudio deixará sua sala com a mesma atmosfera incômoda e perigosa do título, além de dar o tom de toda a experiência e também auxiliar no discernimento entre realidade e ficção.
Lone Survivor não aposta nos jump scares ou nas criaturas gigantescas para tentar assustar o jogador. Pelo contrário, faz isso com elementos simples e do cotidiano, contando pouco da história, dando quase nenhuma informação e deixando que ele explore o mundo e descubra como sobreviver por si só.
Os gráficos também ajudam, apesar de pixelizados e um tanto quando estourados na versão PlayStation 3. Não é difícil distinguir os cenários entre si e mesmo os menores itens presentes pelas salas possuem formas facilmente identificáveis e distintas. Você irá se perder, sem dúvida, mas isso se deve mais a falhas na construção dos ambientes do que ao visual em si.
Falando mais sobre isso, serão muitos os momentos em que você se verá voltando para onde veio ou entrando onde não deve devido a problemas com o posicionamento de portas e corredores. Apesar de adotar uma perspectiva 2D, o mapa do prédio residencial onde o game começa, principalmente, exibe uma perspectiva 3D, o que pode acabar confundindo o jogador em sua localização.
O problema torna-se ainda mais grave quando se leva em conta que toda a interação acontece em tempo real. Ou seja, mesmo o uso de menus ou a visualização do mapa deixam o jogador vulnerável aos ataques inimigos ou efeitos da fome e do sono, exigindo agilidade nas consultas e no gerenciamento de inventário.
Outra crítica pode ser feita por uma parcela dos jogadores, mais especificamente, por aqueles que esperam algum tipo de “conclusão” de um jogo. Lone Survivor não entrega a história de bandeja e, como tenta colocar o jogador na pele do protagonista, também não o coloca no centro dos eventos que levaram o mundo ao estado deplorável no qual ele se encontra.
Sendo assim, são poucas as explicações dadas sobre o que exatamente aconteceu. Em vez disso, o título se foca na história pessoal do protagonista e em como ele precisa agir para sobreviver. Assim como na vida, em situações de grande pressão, os detalhes perdem a importância e o contorno. A barriga ronca e os monstros se aproximam e tudo o que se quer é sair dali vivo, e não conhecer quem é o responsável por tudo aquilo.
Este jogo foi analisado no PlayStation 3.