Talvez de todos os Assassin’s Creed lançados nos últimos anos, nenhum tenha lidado com tantas responsabilidades quanto Unity. Como se não fosse o bastante representar a terra-natal da Ubisoft em plena Revolução Francesa, o game é o primeiro título da série a ser lançado com exclusividade para a nova geração – em outras palavras: sem as restrições que o hardware dos consoles passados ofereciam.
Com isso, as expectativas para o que a produtora vai trazer de novo são imensas. O próprio modo cooperativo integrado à campanha apresentado durante a última E3 já é o primeiro indício de que o título quer aproveitar este marco para trazer algo realmente diferente. E, embora essa novidade não esteja presente na Brasil Game Show, a demonstração nos ajuda a ter uma noção das mudanças que estão a caminho.
Maior, mas não mais bonito
O novo game da série estava disponível no evento em dois estandes: Microsoft e Ubisoft, ambos rodando em um Xbox One. No entanto, o que deveria ser apenas uma questão de escolha pelo tamanho da fila se revelou algo um pouco diferente. Isso porque, apesar de ambas as empresas estarem com a mesma demo, a diferença gráfica entre elas era clara.
Seja por usar um TV não calibrada ou mesmo optar por uma build um pouco mais antiga, as duas estações de Assassin’s Creed: Unity presentes na Ubisoft — onde testamos o game — traziam um visual bem abaixo daquilo que já tínhamos visto na E3 ou mesmo no estande do Xbox. Texturas mal-feitas, problemas com modelagem e detalhes e até mesmo questão de acabamento (a impressão em alguns momentos era de que Arno flutuava sobre o chão) deram uma péssima impressão inicial sobre o game. Por sorte, uma rápida conferida na outra versão amenizou as coisas.
Deixando isso de lado, podemos ver uma evolução no motor gráfico em vários outros sentidos, sobretudo em relação ao tamanho do mapa. Assassin’s Creed: Unity pode não se destacar por ser um jogo bonito, mas surpreende por ser assustadoramente grande. Pela primeira vez na série, nós finalmente sentimos a imensidão do local, seja pela área total quanto pelo que vamos encontrar.
Isso porque as construções presentes na cidade podem finalmente ser exploradas por completo, deixando de ser apenas um enfeite na paisagem urbana. Com isso, o conteúdo existente dentro de uma parcela do mapa é ampliado consideravelmente, uma vez que não são mais apenas as ruas ou os telhados que vão lhe ser útil. São pequenos mundos existentes por trás de cada porta e cada um com suas próprias surpresas.
Além disso, com um mapa bem maior, a própria movimentação do herói precisa ser mais pensada do que nos jogos anteriores. Correr desesperado pelas ruas até achar um lugar seguro não é mais uma alternativa viável e é preciso que você domine o cenário para se dar bem – algo que exige um tempo para se acostumar.
Exemplo disso é a missão presente na demo, na qual Arno deve invadir uma catedral para assassinar um soldado inimigo. À primeira vista, a tarefa não é nada excepcional, mas você logo percebe o quanto as coisas mudaram quando tenta entrar no local indicado. A construção é tão grande que você leva alguns bons minutos estudando sua estrutura em busca de uma entrada. As coisas não são mais jogadas na sua cara e, como um bom assassino, é preciso estudar a situação antes de agir.
O próprio jogo oferece algumas dicas nesse sentido, mas que foram de pouca ajuda em nossos testes. No início da missão, além de listar os objetivos gerais, o game indica quantas entradas a áreas possui, quantas passagens secretas e mais algumas informações úteis. Contudo, como o tempo da demo era bem restrito, nos limitamos a procurar o caminho mais óbvio: o telhado.
Não há como negar que a falta de indicações irrita depois de um tempo. Talvez tenha sido apenas um efeito da própria demonstração, já que a gente sempre joga com um pouco de pressa por conta da fila que se forma atrás de nós, mas a sensação que ficou é que a Ubisoft quis tornar as coisas tão grandes que criou uma complicação desnecessária. De qualquer forma, depois de muito rodar e ficar pendurado em gárgulas, encontramos a única janela aberta em um dos cantos da catedral, que nos leva para a área interior.
É quando você passa para a área interna – sem qualquer tipo de transição ou corte, diga-se de passagem –, que Assassin’s Creed: Unity mostra seu valor. O interior da catedral realmente corresponde ao colosso visto de fora, sendo repleta de galerias, corredores e outras estruturas típicas da época. E, assim como foi complicado encontrar a entrada, achar uma saída se revela igualmente complicado.
Essa é a chave para se dar bem no novo título. Como dito, a Ubisoft não apenas tornou as coisas maiores, mas fez mudanças na lógica do jogo e é preciso se adaptar para sobreviver a elas. No caso da missão, mais do que entrar na catedral e eliminar seu alvo, você precisa estudar muito bem o local para conseguir fugir em segurança. Tanto que, da primeira vez que testei a demo, fiquei correndo em círculos pelos enormes salões porque não me lembrava onde estava a maldita passagem por onde vim – e acabei fracassando.
Não se trata mais de invadir um lugar, fazer uma bagunça e sair correndo desesperado para qualquer lado até que os soldados desistam de procurá-lo. Antes de agir, Arno deve analisar tudo ao seu redor para que suas ações sejam minimamente percebidas. Como Altaïr nos ensinou lá atrás, um assassino não deve sair das sombras jamais.
Silencioso e mortal
É pensando nisso que Assassin’s Creed: Unity resgata o modo stealth que há tempos havia sido deixado de lado na série. Agir furtivamente ganhou novos contornos por aqui, seja por conta das mudanças no sistema de combate ou mesmo pelas novas mecânicas inseridas.
Enfrentar os soldados inimigos já não é mais tão simples quanto antes. A Ubisoft decidiu tirar aquela aura de super-herói que rondava os assassinos há alguns jogos e trouxe de volta o desafio de enfrentar múltiplos oponentes. Por mais que a lógica de explorar o contra-ataque continue, você logo percebe que as coisas não estão mais tão simples como antes e que ficou bem mais fácil de Arno tombar diante de um grupo. Apesar das novas animações de combate, a inteligência artificial dos adversários e mesmo seu nível de habilidade foi melhorado, trazendo um desafio bem maior do que o habitual.
Por isso, atacar sem ser visto acaba sendo a melhor opção. E o assassino conta com algumas pequenas ajudas nesse sentido, como o botão que faz com que ele caminhe agachado e mais silenciosamente – algo retirado diretamente de Watch Dogs. Além disso, sempre que você faz algo que pode chamar a atenção, um pequeno espectro seu é deixado no local, como um indicativo de que os guardas notaram algo naquele lugar. E, ao mesmo tempo em que isso serve como um alerta para você sair dali o mais rápido possível, isso pode ser usado como elemento estratégico, uma vez que é possível atrair os inimigos até aquele ponto para eliminá-los com mais facilidade.
Na demonstração, Arno contava com um arsenal bem reduzido. Além de suas icônicas Hidden Blades, ele ainda contava com algumas bombas, uma pistola e mais alguns acessórios que, no fim das contas, não serviram de muita coisa na missão. Como a tarefa era simplesmente eliminar um templário que estava no primeiro andar da catedral, um único assassinato aéreo dá conta do recado. A partir disso, fica por sua conta: correr em direção à saída ou tentar enfrentar as hordas de soldados que vão ao seu encontro.
Cidade luz
Embora a demonstração se limite apenas a uma única missão, sem nos permitir explorar tudo o que Paris tem a oferecer, já é possível ter uma rápida noção do que vamos encontrar. As ruas são apinhadas de gente, mostrando tanto o clima conturbado que antecede a Revolução Francesa quanto o poder da engine da Ubisoft.
As aglomerações realmente parecem vivas, sem aquele efeito ridículo de que estamos olhando para vários personagens agindo de maneira igual e robótica. Você percebe que eles se comportam de maneira independente, o que dá muito mais veracidade à ação. Populares se aglomeram para iniciar um protesto, mais pessoas se aproximam enquanto outras saem da multidão ou passam apressadas com medo que aquilo termine em bagunça. Se você observar a cena por alguns minutos, vai perceber como tudo funciona de maneira natural.
Assassin’s Creed: Unity pode não trazer todo o visual que muita gente esperava – tanto que muitos já levantaram a possibilidade de um downgrade –, mas logo você percebe que isso é o que menos importa no todo. A Ubisoft conseguiu dar novas dimensões ao universo da série, resgatar a exploração urbana e o sistema de stealth, além de fazer com que todo esse mundo funcione de maneira viva e orgânica.
É claro que a demo nos permitiu olhar apenas uma fração ínfima do que o jogo tem a oferecer, mas serviu para empolgar e mostrar que ainda há espaço para a renovação. Unity pode não ser a revolução na série que muitos queriam ver, mas é um importante passo em direção para tirar a franquia da mesmice.