O final de 2014 está sendo um dos mais movimentados da história da Ubisoft. A empresa, acostumada a lançar alguns de seus grandes títulos perto da temporada de Natal, decidiu despejar todas as suas grandes bombas para a nova geração de uma única vez. Para desespero dos jogadores que prezam por suas contas bancárias, os lançamentos de Assassin’s Creed Unity, The Crew e Far Cry 4 acontecem com poucas semanas de diferença.
Mas se existe um game que vem para mostrar o que a empresa será capaz de fazer na nova geração, é este shooter. Passando longe dos bugs que atrapalharam os Assassinos e da estreia da empresa nas pistas de corrida, Far Cry 4 evolui bases que já eram bastante sólidas e mostra o que a empresa é capaz de fazer quando tem nas mãos uma franquia de qualidade, boas ideias e um time competente para realizá-las.
Após as introduções iniciais e as necessárias cutscenes que envolvem o jogador na história, temos acesso ao mundo aberto e boa parte do caminhão de coisas que dá para fazer em Kyrat. Na trama, nosso personagem, Ajay Ghale, se envolve na guerra civil contra o excêntrico ditador Pagan Min e descobre ter mais a ver com o passado daquele país do que jamais imaginou.
Em meio a toda a imensidão de Far Cry 4, a Ubisoft mostra também que aprendeu com os erros do passado, apesar de ainda não ter chegado lá.
Se você for um complecionista ou tiver problemas de foco, vai ser difícil se manter em um caminho direto do ponto A ao ponto B. Em um percurso de 500m entre uma vila e uma missão, dá para encontrar aliados em franca batalha contra soldados inimigos, uma side mission que exige o sequestro de um caminhão ou aquele animal que você precisa caçar para obter uma melhoria. Tudo acontece ao mesmo tempo e o tempo todo.
Já era assim em Far Cry 3, no quarto game da série, a Ubisoft levou tudo a novos patamares. Ainda existem as torres para liberação do mapa, os postos avançados inimigos e as missões de caça a animais selvagens, só que agora, somam-se também a descoberta de lugares exóticos, os comboios inimigos que passeiam por Kyrat, os eventos de Karma que te colocam no dia a dia da guerra civil e uma série de outras atividades que manterão o jogador ocupado por muito tempo.
Como um jogo cross-gen, não dá para esperar muita maravilhosidade gráfica, mas mesmo aqui, a Ubisoft soube fazer a diferença na nova geração. No PS4, PC e Xbox One, o país aparece muito mais belo, com habitantes e soldados por todos os lados e coisas acontecendo o tempo todo.
A ideia é de estar participando ativamente do dia-a-dia da revolução e, caso se canse dos combates, sempre dá para observar o anoitecer do topo de uma colina e ficar impressionado com a draw distance absurda. Mas olhe, lá no horizonte, um rinoceronte! Vamos traçar um ponto de rota e seguir até lá. E assim, Far Cry 4 segue em frente, sem parar…
Falando nos animais, muitos deles roubam a cena aqui. Os elefantes já eram uma adição bastante esperada a Far Cry 4, mas o que ninguém contava era com a presença de outros bichos que fazem toda a diferença, como os rinocerontes que fazem as vezes de tanque de guerra, os lobos que surgem aleatoriamente ao ouvir o som dos tiros e sentir o cheiro de sangue ou os gaviões que atacam do céu quando você menos espera. E o que falar dos texugos, que só podem ser criações de Satanás?
Quem souber usar a natureza ao próprio favor terá uma vantagem absurda em relação aos inimigos. Experimente atirar rapidamente em um rinoceronte e, ao vê-lo enfurecido, correr para perto de uma base inimiga. Depois, suba em um telhado e aprecie o caos, deixando que o animal faça todo o trabalho sujo por você. E torça para que ele não se lembre de sua existência depois disso.
Ainda falando sobre o mundo aberto do game, é digna de nota a atenção da Ubisoft com os detalhes. Tudo, absolutamente tudo tem uma história. A disposição de móveis, lixo e elementos em uma casa denotam a personalidade da família que lá morava, enquanto o desespero de uma mãe ao ver o seu filho soldado morto em combate é notável na beira da estrada, quando você passa de carro.
No PS4, PC e Xbox One, o país aparece muito mais belo, com habitantes e soldados por todos os lados e coisas acontecendo o tempo todo.
Pelo rádio, a estação Free Kyrat comenta a situação política do país, provoca Pagan Min e tem sua programação alterada de acordo com o andamento do enredo. Ao se aproximar de uma torre ainda sob o controle inimigo, começam as interferências e as mensagens mudam completamente, com informes estatais alertando aos ouvintes sobre a influência nociva dos rebeldes e a necessidade de se seguir fielmente às ordens do Rei.
Carros espalhados pelo mundo contam com enfeites e fotos pessoais de seus donos, enquanto arquivos espalhados por todo o país trazem mais informações sobre o enredo, dão pistas misteriosas ou trazem relatos pessoais de quem passou por ali antes. Far Cry 4 utiliza de maneira magistral uma região tão rica em cultura quanto o Himalaia, e o adapta de forma perfeita para contar sua própria história.
Em meio a toda a imensidão de Far Cry 4, a Ubisoft mostra também que aprendeu com os erros do passado, principalmente no que toca o enredo. Enquanto o jogo anterior foi bastante criticado por seus personagens insossos e poucos interessantes – com exceção do fantástico e subutilizado vilão Vaas Montenegro – o novo game tenta modificar um pouco esse cenário, apesar de não chegar exatamente lá.
Vamos começar logo pelo aspecto principal, o ainda mais fenomenal antagonista Pagan Min. Ele está na capa e seu rosto está estampado por todos os lados em Kyrat, mas assim como Vaas, ele também é muito pouco utilizado. Na soma de todas as suas aparições, ele não deve ter mais do que 15 minutos de tela, apesar de falar com o protagonista pelo rádio praticamente o tempo todo e protagonizar uma das missões mais divertidas do game – não vamos comentar qual é para não dar spoilers, mas você saberá quando chegar a ela.
O protagonista, desta vez, não é o dudebro do game anterior, e sim, um sujeito cuja fama era desconhecida para ele mesmo. Em Kyrat todos o conhecem e, acima de tudo, o veem como um herói. Sua história vai se desenrolando ao pouco durante as missões e, apesar de bem contada, chega sem um fator humano. Não existe, por exemplo, nenhuma dúvida ou hesitação nas ações de Ajay, que parece seguir em frente sem pensar no que está acontecendo.
Será que alguém que passou uma vida inteira ignorante sobre seu local de nascimento e as tensões que acontecem por lá realmente embarcaria, sem pestanejar, em uma jornada que o tornaria líder de uma revolução? Provavelmente não, e aqui, faltou personalidade e criatividade para trabalhar melhor os conflitos internos que, vejam vocês, até tinham sido pincelados no protagonista escroto de Far Cry 3.
Por outro lado, são bastante interessantes as tensões internas que acontecem dentro do Caminho Dourado e, em alguns momentos, o jogador é colocado em posição de alterar o balanço de poder no grupo rebelde. Tais mudanças não alteram quase nada nos rumos da trama, mas passam uma sensação de dimensão para a trama, uma vez que ali, mais do que a vida dos protagonistas, está em jogo também o futuro de um país.
Far Cry 4 não deixa de repetir os problemas de conectividade presentes em qualquer lançamento recente. O uPlay mais uma vez exerce seu papel de atrapalhar o modo online.
Far Cry 4 está sempre online, mesmo que o jogador esteja sozinho. A qualquer momento, dá para pedir ajuda ou oferecer as próprias armas para um colega. Porém, é difícil conseguir uma partida desta maneira e, muitas vezes, o jogo acaba interrompendo até mesmo o progresso em atividades single player devido a falhas na conexão. Não existem palavras para definir a frustração de ver o ataque quase bem-sucedido a uma fortaleza inimiga ser interrompida por conta disso.
O jogo, então, não deixa de repetir os problemas de conectividade presentes em qualquer lançamento recente de grande porte. Como sempre acontece, o uPlay mais uma vez exerce seu papel nefasto de atrapalhar o modo online do game e, em nossos testes, foi impossível jogar o modo cooperativo com usuários aleatórios no PlayStation 4.
Com os amigos da lista do console, porém, a jogatina seguiu de forma um pouco mais fácil. Não existem problemas de funcionamento ou lag uma vez que ambos estão conectados e as partidas compartilhadas tornam o ato de caçar animais ou liberar postos avançados muito mais divertidas e insanas.
Levando em conta toda a imensidão do mundo aberto e a gigantesca quantidade de missões da campanha principal, Far Cry 4 acabou renegando o modo multiplayer competitivo a segundo plano, mas esta é uma questão que realmente não faz muita falta. Aqui, a Ubisoft tenta apresentar alternativas divertidas aos tradicionais mata-mata e capture a bandeira, por exemplo, além de oferecer um construtor de mapas que torna tudo muito mais divertido. Porém, tudo isso acaba passando quase que despercebido, pois lutar contra a ditadura de Pagan Min ou caçar texugos sempre vai parecer mais divertido.
Far Cry 4 evolui bases que já eram bastante sólidas e mostra o que a empresa é capaz de fazer quando tem nas mãos uma franquia de qualidade, boas ideias e um time competente para realizá-las.
Na mais recente edição do New Game Pocket, comentei que Far Cry 4 seria um bom jogo para inaugurar um console da nova geração e mostrar não apenas aquilo que é possível nas novas platafornas, mas também o que deve ser padrão. Quando gravamos, eu estava há menos de 24 horas com o jogo, mas mesmo agora, depois de analisá-lo completamente, essa impressão permanece.
Far Cry 4 tem seus problemas, principalmente em termos de história e conexão online, mas não dá para ignorar que a Ubisoft sabe onde está errando e tentou consertar, mesmo sem muito sucesso. Aquilo que já era muito bom, porém, ficou ainda melhor e o resultado final é extremamente positivo.
Então, dá para afirmar sem medo: Far Cry 4 é um dos melhores jogos da geração atual – para não dizer o melhor – e permanece como o soberano no mundo de FPS de mundo aberto. O game da Ubisoft é uma viagem que deve ser feita sem medo e vale cada centavo gasto em sua aquisição, seja pela beleza visual, pela quantidade absurda de objetivos para serem completados ou, de forma mais simples, pela riqueza de detalhes envolvida em praticamente todos os seus aspectos.
Far Cry 4 foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Ubisoft.