Renegado por muitos por não carregar um numeral no título e por ser um “jogo de download”, Resident Evil Revelations 2 chega às lojas com uma grande responsabilidade nas costas. É, ao mesmo tempo, um título que chega para servir como um pedido de desculpas aos fãs após RE6, um título com qualidade abaixo do esperado e, na mesma medida, serve como uma série de testes de formato, enredo e, acima de tudo, pegada.
Qual será o futuro dessa franquia? A ação desesperada, vinda das arenas online de Call of Duty, só que com monstros? O terror vagaroso e aterrorizante de The Last of Us? Os sustos vazios que tanto alegram a molecada em jogos como Five Nights at Freddy’s? Ou um misto de tudo isso, justamente a colcha de retalhos que transformou Resident Evil 6 em algo sem personalidade e muito aquém do esperado?
O episódio que abre Resident Evil Revelations 2 para o mundo chega para mostrar como será o clima dessa aventura que vai durar um mês inteiro.
A resposta não é fácil, bem longe disso. Mas parece que a Capcom se saiu nela com louvor, mesmo sem tirar uma nota 10. Em seu primeiro capítulo, “A Colônia Penal”, Revelations 2 firma as bases do que está por vir pela frente e mostra que o bom e velho Resident Evil pode voltar tão forte como há quase 20 anos.
O episódio que abre Resident Evil Revelations 2 para o mundo chega para mostrar como será o clima dessa aventura que vai durar um mês inteiro. De um lado, conhecemos a história de Claire Redfield e Moira Burton, sequestradas durante um dia de festa na organização governamental TerraSave e jogada em um pesadelo kafkiano, de onde devem escapar, inicialmente, buscando comunicação com o exterior.
Logo no começo, o game já faz questão de mostrar que o jogador está em um ambiente hostil, onde monstros podem saltar a qualquer momento, atacar de todos os lados, detonar portas e acabar rapidamente com sua munição. Sim, aqui, como nos velhos jogos da franquia, cada tiro conta, e se você não for bom de mira e souber administrar bem seus recursos, é melhor diminuir a dificuldade, ou então, você passará por alguns perrengues.
Isso é verdade até mesmo na campanha de Barry, que apesar de chegar à ilha muito mais armado do que Claire, ainda assim precisa cuidar para não ficar sem balas. A missão de resgate do veterano da franquia à sua filha é extremamente angustiante e carregada de significado emocional. Ao lado de Natalia, ele se vê na posição de pai em que parece ser falhado. Do outro lado dessa moeda, Moira parece estar completamente desligada dele, ao ponto de nem mesmo imaginá-lo como uma possibilidade de salvação naquele momento de desespero.
Para os fãs da ação, a Capcom oferece o extra Raid Mode, que também evolui os conceitos do Revelations original. O modo de combate contra inimigos dos mais diferentes tipos e atributos garante pontos que podem ser usados para evolução de personagens, além de velhos conhecidos, como mais uma forma de trazer sorrisos aos rostos dos fãs. Aqui é o local para acalmar o dedo nervoso, atirar sem parar e deixar a estratégia tomar conta no modo campanha.
Desde antes do lançamento, sabíamos que cada capítulo de RE Revelations 2 teria cerca de 2h de duração. Mesmo assim, não dá para deixar de pensar que ele poderia ser um pouco mais longo e que fomos cortados em seu auge.
Se você espera algum desenvolvimento em termos de história logo neste primeiro capítulo, porém, é melhor ter um pouco mais de paciência. Apesar de contar com um gancho considerável, que vai te fazer ter vontade de jogar o segundo capítulo imediatamente, “A Colônia Penal” evolui muito pouco o enredo. O objetivo aqui é apresentar seus personagens, a relação entre eles e, acima de tudo, mostrar que a Capcom não se esqueceu dos fãs veteranos.
Eles recebem um afago com uma série de referências a frases clássicas da franquia. Falando mais uma vez de Moira, é ela a responsável por um dos melhores diálogos desse primeiro capítulo, que com uma metalinguagem rara na franquia, torna canônica uma das piadas mais comentadas entre os fãs. A acidez, rebeldia e fragilidade da filha de Barry são grandes destaques do capítulo, mostrando mais uma vez que o roteirista Dai Sato é capaz de esmerilhar quando tem nas mãos uma página em branco, onde pode desenhar um novo personagem. Ele já fez isso no primeiro Revelations, com Jessica Sherawat, e agora, parece repetir a dose.
Alguns fãs, porém, podem se sentir incomodados com as semelhanças demasiadas a The Last of Us, outro clássico recente do terror. Neste game, a Capcom não faz a menor questão de esconder que se inspirou no game da Naughty Dog, e o faz em muitos outros aspectos além das já conhecidas mortes furtivas ou da aparência geral de Barry. As bancadas para melhorias de armas estão lá, assim como a montagem de itens a partir de recursos encontrados separadamente. Se você forçar a interpretação, poderá até mesmo ver um pouco de Ellie em Moira.
Mesmo com tantas similaridades, não dá para dizer que Resident Evil perdeu sua identidade. Influências diretas de outros jogos ou filmes são lugar comum na franquia, que sempre foi uma colcha de retalhos de referências e citações não apenas a games, mas à cultura pop em geral. E ainda assim, ela sempre teve sua carinha própria. Isso perdura aqui.
Desde antes do lançamento, já sabíamos que cada capítulo de Resident Evil Revelations 2 teria cerca de duas horas de duração. É exatamente isso – o trecho com Claire, mais curto, pode ser finalizado em mais ou menos 40 minutos, enquanto o de Barry, mais desafiador, leva cerca de uma hora. Mesmo tendo conhecimento prévio disso, não dá para deixar de pensar que ele poderia ser um pouco mais longo e que fomos cortados em seu auge.
A acidez, rebeldia e fragilidade de Moira são grandes destaques do capítulo, mostrando mais uma vez que o roteirista Dai Sato é capaz de esmerilhar quando tem nas mãos uma página em branco, onde pode desenhar um novo personagem.
Como já dito, “A Colônia Penal” chega para estabelecer o clima e também a jogabilidade do título. Não é como se o episódio fosse um grande tutorial, mas ao mesmo tempo, passamos pelo menos dois terços dele nos acostumando com controles, conhecendo as dinâmicas de jogo e entendendo como funcionam os inimigos e o mundo do game. E quando finalmente acreditamos estarmos aptos para enfrentar esse desafio, o capítulo chega ao fim, deixando uma sensação que pode ser encarada como frustração.
Aqui, a Capcom acerta pela antecipação, como bons seriados, deixando o jogador empolgado para o próximo capítulo por meio de um cliffhanger que, pode até mesmo, mudar algumas tradições da franquia. Mas, ao mesmo tempo, erra em entregar uma experiência que pareça completa, mesmo que fragmentada.
Assim como fez no primeiro Revelations, nesta sequência a Capcom parece, mais uma vez, ter encontrado o equilíbrio ideal entre o “velho estilo” da franquia e o novo. É claro, será impossível agradar a todos, mas no que pôde, a empresa fez a lição de casa direitinho, olhando para o passado para ver o que funciona e deixando de lado aquilo que não agradou.
Ainda nessa toada de repetir o passado, Resident Evil Revelations 2 perpetua um dos maiores problemas da nova era da franquia, a inteligência artificial.
Saem as QTEs, entra a câmera livre de Resident Evil 6, unida à jogabilidade mais fluída vista no game. Para que o jogador pare para observar o cenário, encontre itens e veja o que interessa, estão aí as habilidades de Moira e Natalia, que localizam munições e dinheiro, além de permitirem uma evolução mais estratégica das cenas de ação, seja pela lanterna capaz de atordoar oponentes ou pela habilidade de enxerga-los à distância, permitindo ataques furtivos.
De início, porém, a impressão que fica é que esses dois estilos não se encaixam e, principalmente, que o cenário de Claire é estreito demais para uma movimentação tão livre. Felizmente, pelo menu de opções, é possível selecionar a velocidade de movimentação da câmera e adequar os controles ao estilo de cada um.
Outro ponto que pode causar certa confusão é o conjunto de controles. Ao velho estilo da franquia, corremos mais rapidamente com o personagem utilizando o X ou A, dependendo da plataforma. O problema é que Resident Evil Revelations 2 grita a um shooter e, para quem está acostumado com o estilo, é instintivo pressionar o analógico para correr, o que acaba gerando o efeito contrário e fazendo com que o personagem se abaixe e passe a andar mais devagar. Leva algum tempo para que o jogador se acostume, e nesse meio tempo, alguns danos bobos podem acabar sendo sofridos.
Ainda nessa toada de repetir o passado, Resident Evil Revelations 2 perpetua um dos maiores problemas da nova era da franquia, a inteligência artificial. Em momentos de combate extremo, você verá sua companheira controlada pelo computador comportando-se de maneira bem distante do normal, permanecendo ao lado de inimigos que se aproximam ou falhando em fugir deles, acabando cercada e morrendo no processo.
Não é nada tão estúpido quanto Sheva, de Resident Evil 5, ou os personagens do infame Outbreak, mas ainda assim, capaz de incomodar, principalmente quando se leva em conta o fato de que a habilidade que permite a IA atacar os inimigos automaticamente precisa ser destravada com pontos. Existe uma única cena neste primeiro capítulo em que esse mal realmente se sobressai, firmando um precedente perigoso caso a gente tenha mais hordas de inimigos nos capítulos seguintes.
Em seu primeiro capítulo, Revelations 2 firma as bases do que está por vir pela frente e mostra que o bom e velho Resident Evil pode voltar tão forte como há quase 20 anos.
No final das contas, Resident Evil Revelations 2 chega em seu primeiro capítulo cumprindo exatamente aquilo que prometeu. É uma ode aos fãs e ao passado da franquia, ao mesmo tempo em que aproveita o que há de melhor nela nos anos recentes. É uma chuva de referências e nostalgia, ao mesmo tempo em que vem como um sopro de boas novas para a saga, que vem baqueada já há alguns anos.
O game já está pronto a essa altura do campeonato, então, os problemas de jogabilidade citados aqui não devem ser resolvidos ao longo dos próximos capítulos. Apesar de ainda se bater com o formato, Resident Evil Revelations 2 chega como um começo bastante promissor e, acima de tudo, vem para tirar o gosto ruim dos anos recentes da franquia. Se tudo o que foi prometido realmente for entregue, como parece o caso aqui, “A Colônia Penal” é apenas o começo de uma temporada de tirar o fôlego.
O jogo foi analisado no PlayStation 4.