Eu queria ter gostado mais de The Witcher 3: Wild Hunt. Depois de meses de expectativa regados a muitos vídeos, imagens e até mesmo um teste que me deixou ainda mais ansioso para o game, eu realmente queria um marco na história dos RPGs. Uma experiência completamente diferente daquela que eu já tive; uma imersão única. Infelizmente, não foi dessa vez.
Só que isso não quer dizer que ele seja ruim — muito pelo contrário. Mesmo com todos os vários problemas aqui e ali, eu simplesmente não conseguia largar o controle. “Apenas mais uma missão”, mentia para mim mesmo pela enésima vez enquanto cavalgava pelos campos pantanosos de Velen ou explorava os segredos de Skellige em busca de um tesouro ou de um monstro novo. Eu só queria continuar um pouco mais.
E esse é o grande segredo da CD Projekt RED. O mundo de The Witcher 3 é tão vasto e imersivo que você simplesmente não consegue se afastar dele. Tudo é feito para prendê-lo por horas nas caçadas, nas brigas políticas ou mesmo para ajudar uma velha a recuperar sua panela.
Assim, por mais que ele esteja longe de ser perfeito como muita gente acreditou, não há como não se empolgar com o Carniceiro de Blaviken. Geralt de Rívia volta como um dos melhores e mais divertidos jogos desta ano e também desta nova geração. Assim como seu protagonista, The Witcher 3 é falho, mas, ainda assim, incrível.
E o grande atrativo de Wild Hunt é exatamente o seu mundo. Trata-se de um dos maiores cenários já criados em um video game e que certamente vai consumir algumas boas dezenas de horas de sua vida caso você tente descobrir todos os segredos que se escondem entre um vila e outra. E é aí que a verdadeira graça do game se encontra.
Por mais que a história comece já em meio a uma série de reviravoltas, a verdade é que é muito mais divertido explorar os quatro mapas disponíveis do que seguir a trama. É um ambiente tão rico e repleto de detalhes que não há como não dedicar um tempo apenas para conhecer e desbravar novas áreas ou ouvir qual o pedido bizarro que aquele camponês tem a fazer.
É muito mais interessante e divertido explorar o mundo do que seguir a campanha. A verdadeira graça de The Witcher 3 está na exploração e na caçada — e isso é sintomático.
Esse interesse muito maior nas missões secundárias do que na campanha principal, no entanto, revela um ponto incômodo de Wild Hunt e que há tempos preocupavam os jogadores que iriam ter seu primeiro contato com a série. Ainda estamos falando do terceiro título de uma trilogia e você sente o peso disso em vários momentos. A trama não se preocupa em contextualizar os novatos e isso afeta o seu entendimento e faz com que você perca muito do que está acontecendo.
The Witcher 3 até consegue introduzir seus personagens de maneira que todo mundo entenda seu papel dentro da trama, mas falha em fazer com que nos afeiçoemos àqueles novos rostos. Não é difícil ver que Ciri é alguém importante para Geralt, mas você só vai compreender que existe uma relação paternal entre eles mais para frente. E isso afeta a tomada de certas decisões que definem o rumo da história e mesmo seu relacionamento com outras pessoas.
Parece algo bobo, mas isso realmente faz diferença. Tanto que não foram poucas as reclamações de gente que sentiu falta de uma breve introdução para apresentar esses elementos cruciais ao enredo e que quase não são trabalhados. O game parte do pressuposto que você já conhece aquele mundo, mas ignora que a mitologia da série é gigantesca e que boa parte do público está tendo eu primeiro contato aqui.
A história se perde e a impressão que fica é que Geralt está correndo em círculos seguindo uma série de missões que não te levam a lugar nenhum.
Porém, ao contrário da maioria dos RPGs, a melhor forma de evoluir seu personagem é seguir a campanha principal e não passar horas matando lobos. Isso significa que você é obrigado a avançar na história para poder fugir dela.
Por sorte, as tramas iniciais são bem interessantes e servem tanto de incentivo para esses primeiros passos — todo o arco envolvendo o Barão de Velen é uma das melhores coisas desse começo — como para que você entenda um pouco da dinâmica daquele universo tão particular.
Isso não quer dizer que a história de The Witcher 3 seja ruim — muito longe disso. O que acontece, na verdade, é que ele tenta ser tão grandioso que acaba se perdendo no caminho. E você percebe isso claramente em vários momentos com missões que não te levam a lugar algum e que estão ali apenas para fazer com que o jogo dure mais algumas horas. Todo o segundo ato poderia ser cortado pela metade e você não estaria perdendo nada.
A grande estrela do jogo são os relacionamentos. A relação do herói com Ciri é uma das coisas mais interessantes de Wild Hunt e o encontro dos doisé uma das cenas mais bonitas do ano.
Ainda assim, mesmo com toda a lentidão de Novigrad que transforma Geralt em um garoto de recados, o resultado é bem positivo. Como dito, o primeiro arco abre o game muito bem e nos introduz muito daquela mitologia enquanto a última parte aprofunda toda a questão de relacionamentos que é a grande base de Wild Hunt.
E é por isso que é tão importante você se importar com os personagens. Como há várias tomadas de decisão, o enredo se desenvolve a partir das suas escolhas e de seu posicionamento diante de algumas questões e de que personagens você se aproxima. Seja seu relacionamento com Triss e Yennifer, suas alianças na guerra e mesmo o quão próximo você é de Ciri: tudo vai depender de você.
O lado bom é que essa dinâmica não é prejudicada por conta desse meio enrolado e você consegue criar os laços necessários e se interessar pelo que realmente importa, ainda que isso demore mais do que deveria. E, quando isso acontece, é possível aproveitar de verdade todo o dilema de Geralt e suas complicações.
Deixando essas questões narrativas de lado, fica claro que a verdadeira vocação de The Witcher 3: Wild Hunt é a ação. Ainda que a interface e os comandos assustem no começo, você logo se acostuma com as diferentes combinações e tudo aquilo que o bruxo tem a seu dispôr na hora de ir atrás de algum monstro.
O mundo de The Witcher 3 é vasto e imersivo — do jeito que um bom RPG precisa ser.
As caçadas são realmente muito divertidas, seja pelas pequenas histórias que as envolvem ou mesmo pelo clima épico de cada grande confronto. O engraçado é que você não precisa aceitar um desses contratos para se deparar com um dos inimigos especiais, o que dá um gostinho a mais para a exploração. Afinal, como reagir quando você está cavalgando tranquilamente e se depara com um enorme dragão em seu caminho para, somente depois, saber que aquilo era uma quest?
O sistema de combate simplificado ajuda bastante nesse sentido. Por mais que seja complicado sobreviver nas primeiras horas, você logo pega o jeito das batalhas e a tomar gosto pelas caçadas, principalmente quando domina o uso dos Sinais e as particularidades dos óleos e elixires.
Diante disso, é quase impossível não se sentir instigado a vasculhar cada canto do mapa em busca de segredos e inimigos para enfrentar. Como dito, explorar os cenários é o que há de mais divertido em The Witcher 3, principalmente quando isso revela mais detalhes sobre aquele universo. Há uma série de easter eggs escondidos, assim como referências e elementos que te fazem querer conhecer um pouco mais daquela realidade.
É um pouco estranho ver a comoção que se criou em torno de Wild Hunt. Ele está muito longe de ser um jogo ruim, mas também não é a maravilha que muitos fãs comentam. Ele tem uma série de problemas de narrativa, interface e mesmo técnicos que não podem ser ignorados.
Por outro lado, isso não o deixa menos divertido. Mesmo com todos esses deslizes, ele acerta onde realmente importa e consegue ser completo, imersivo e, acima de tudo, muito divertido. Seja com o bom humor de alguns momentos ou com a intensidade de muitos combates, ele certeiro onde precisa.
Acima de tudo, The Witcher 3: Wild Hunt faz muito bem aquilo que é básico em qualquer RPG de fantasia: ele consegue colocar o jogador dentro daquele mundo de modo que ele não quer sair de lá tão cedo. E é por isso que a enrolação é tão incômoda. Ele já é grande e envolvente o bastante para não depender de artimanhas preguiçosas para prender o jogador por mais algumas horas.
O jogo foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela CD Projekt Red.