Se o capítulo anterior de Life is Strange foi um soco no estômago, Dark Room é aquele gosto amargo que sobe à boca logo em seguida. Aquele momento em que, ainda tontos, tentamos entender tudo o que está acontecendo e imaginar o que está por vir após o golpe. É a hora de parar, respirar e processar tudo o que aconteceu até aqui.
E a Dontnod faz exatamente isso neste quarto e penúltimo episódio do game. Depois de uma sequência sem fim de reviravoltas e acontecimentos que nos deixaram sem reação, o estúdio puxa um pouco o freio de mão para que possamos não apenas digerir todas essas informações, mas também para desenvolver um pouco a trama que se desenrolava timidamente em paralelo aos dramas pessoais de Max e Chloe.
E é exatamente por deixar de lado esse aspecto que sempre foi o grande destaque de Life is Strange que Dark Room se transforma no capítulo mais fraco até agora. Isso não quer dizer que ele seja ruim — muito longe disso —, mas essa mudança de ritmo e de foco não passa despercebida. Ao contrário do que vimos até aqui, ele se torna lento e cansativo em determinados momentos, contrastando com o frenesi que já vivenciamos.
No entanto, esse é um mal necessário. A história deixou várias pontas soltas até aqui e é preciso começar fechá-las agora que estamos diante da conclusão da trama. Assim, fazendo jus ao nome do capítulo, finalmente temos algumas revelações vindo à tona e, como não poderia deixar de ser, mais algumas perguntas surgindo para fazer nossas cabeças explodirem uma vez mais.
Uma coisa que chama muito a atenção em Dark Room é que, ao contrário dos episódios anteriores, o controle do tempo é quase que deixado inteiramente de lado. Ele ainda está ali, mas bem longe de ser o centro das atenções e o cerne da jogabilidade. Você ainda pode voltar e refazer uma ação ou mudar de opinião em um diálogo, mas os puzzles baseados nesse recursos já não estão mais tão presentes assim.
Life is Strange deixa de lado a relação entre seus personagens para solucionar alguns de seus mistérios e finalmente trazer respostas — e mais algumas dúvidas.
E a razão é óbvia: o senso se urgência. Como dito, Life is Strange está próximo de sua conclusão e o quarto capítulo se preocupa muito mais criar essa corrida contra o tempo em busca de respostas do que ficar brincando de Ctrl+Z mais uma vez a cada nova conversa. A Dontnod não se prendeu a essa mecânica e conseguiu evoluir muito bem de modo que o recurso só aparece quando é realmente necessário.
Assim, você sente o imediatismo da situação na qual Max e Chloe se encontram e entende a importância daquilo a ponto de não se importar com a ausência do recurso. O jogo evoluiu tanto e desenvolveu tão bem seus personagens que o agora realmente se torna muito mais interessante do que os vários “ses” que podem surgir.
Mesmo perdendo um pouco o ritmo, Dark Room se destaca pelo senso de urgência. Não há brincadeiras com o tempo, porque o mais importante é resolver o agora.
Por outro lado, é irônico que o episódio mais focado nessa urgência é também aquele que mais sofre com a queda de ritmo. Como dito antes, ele vem numa pegada bem intensa e precisa pisar um pouco no freio para trazer alguma explicações, e isso faz com que as coisas fiquem um pouco mais lentas e maçantes. Parte desse problema está exatamente na forma usada pelo estúdio para fazer essas revelações.
Ao invés de trazer longas explicações para cada um dos mistérios que rondam Arcadia Bay, Life is Strange traz mais alguns puzzles para fazer com que essas respostas sejam entregues de maneira menos maçante possível. A princípio, eles até são interessantes, como a visita ao quarto de Nathan Prescott ou mesmo à busca pelos arquivos de David, mas esses momentos logo se estendem mais do que o necessário quando você ainda precisa perder tempo em diálogos pouco interessantes com Frank ou mesmo tentando juntar todas essas informações de maneira coerente.
O problema do capítulo é exatamente o seu segundo ato. Ele começa e termina muito bem, mas tropeça na hora de ligar essas duas pontas, o que torna as coisas monótonas. É o episódio mais fraco até agora, mas longe de ser ruim.
Esse último quebra-cabeça, inclusive, é um dos grandes problemas de Dark Room. Em termo de narrativa, sua existência é totalmente compreensível, mas o modo como ele se aplica quebra o bom ritmo que o próprio capítulo se desenrolava. Ele exige muita paciência, leitura e busca por detalhes que vai totalmente contra a ideia de que Max e Chloe estão correndo contra o tempo para impedir mais uma tragédia na cidade. Ele poderia ser reduzido à metade do tempo que não iria atrapalhar o andamento da história e nem atravancar o ritmo do jogo.
Isso faz com que o quarto episódio de Life is Strange seja nitidamente dividido em três atos, sendo o segundo o mais problemático deles. Contudo, mesmo isso não quer dizer que o game se perdeu — de maneira alguma. Ainda em termos de história, Dark Room consegue não apenas dar uma ótima continuidade àquilo que vimos antes, com destaque ao excelente início e ao reflexo das nossas escolhas anteriores, como ainda traz um incrível desfecho, que não só responde a várias perguntas que tínhamos até aqui como ainda cria novas questões ainda mais urgentes para serem resolvidas em sua conclusão. Tudo, é claro, explodindo algumas cabeças no caminho.
Já não é segredo para ninguém que Life is Strange vem despontando como um dos melhores jogos deste ano e Dark Room apenas reforça essa imagem. Em linhas gerais, ele consegue manter o mesmo bom desempenho que vimos até aqui e executa muito bem seu papel de trazer várias respostas à trama principal ao mesmo tempo em que deixa um belo gancho para o capítulo final. Tanto que é praticamente impossível terminá-lo sem querer saber quando o último episódio chega.
Mais do que isso, diante de todas as revelações, vemos o quanto a Dontnod conseguiu nos enganar. Embora o grande momento pareça completamente jogado à primeira vista, basta voltar aos capítulos anteriores para perceber que todas as respostas sempre estiveram lá e só não fomos capazes de enxergar. E o mérito disso é da própria narrativa, que conseguiu habilmente nos conduzir por um caminho graças à forma como nos relacionamos com seus personagens. Todas as evidências estavam ali, mas nosso envolvimento passional com Max e Chloe nos impediu de enxergá-las — algo que é muito difícil de fazer em qualquer história.
Dark Room tem seus tropeços, mas isso não desmerece o bom trabalho que vem sendo feito e muito menos o que ele traz de novo à trama. Diante de tudo o que foi construído até aqui, é até bom que tenhamos um momento para respirar, pois o fim está chegando — seja para Life is Strange, Arcadia Bay ou Max.
Façam suas apostas.