Estamos diante do fim. Nesta quinta (26), estreia nos cinemas do Brasil “Resident Evil 6: O Capítulo Final”. Como o nome já indica, é o último filme da saga começada em 2002, e a despedida do diretor Paul Anderson e da atriz Milla Jovovich, que interpreta a protagonista Alice.
Nos últimos 15 anos, foram centenas de milhões de dólares arrecadados e um séquito de fãs, além de muita briga sobre o relacionamento entre os filmes e os jogos, que seguem caminhos bem diferentes. Mas não é exatamente sobre isso que vamos falar aqui, já que essa discussão não tem fim, e é tão antiga quanto as próprias adaptações de Resident Evil para os cinemas.
Aqui, vamos seguir o exemplo da Capcom, que com o lançamento do novíssimo Resident Evil 7, decidiu olhar para o passado da saga. Vamos fazer o mesmo e explorar os primórdios da adaptação da franquia para os cinemas, que datam de muito antes de “O Hóspede Maldito” chegar às telas.
Os trabalhos para levar Resident Evil para o cinema começam ainda em 1996, enquanto a Capcom se impressionava com o sucesso do primeiro jogo da série. Decidida a seguir por um rumo diferente do que aconteceu com Street Fighter e seu péssimo filme, a desenvolvedora vendeu os direitos da série de horror para uma produtora alemã chamada Constantin Films.
Ainda no mesmo ano, a empresa contrata o roteirista Alan B. McElroy, que surgia como uma boa promessa tendo recentemente concluído o argumento de “Spawn: O Soldado do Inferno”. Ele cria uma história parecida com o Resident Evil original à primeira vista, mas bem diferente depois. Temos Chris e Jill, ok, mas Wesker é um maluco internado em um sanatório. Não temos Umbrella, mas sim, um grupo de cientistas loucos que deseja infectar policiais de elite, não chamados de S.T.A.R.S., para que eles espalhassem o vírus pelo mundo.
Após diversas alterações, o roteiro foi descartado, e McElroy, demitido. O diretor francês George Sluizer, de “O Silêncio do Lago”, porém, manteve seu posto e começou a trabalhar ao lado de Kevin Williamson em uma nova história. O roteiro do mesmo autor de “Pânico”, que havia acabado de finalizar “Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado”, entretanto, acabou saindo pior do que a anterior, para desespero da produtora.
A trama se passaria em um futuro próximo, quando todas as doenças foram curadas. Por causa disso, a Umbrella estaria indo à falência e, por isso, cria o T-Vírus como forma de subornar os governos do mundo. Caso ela não recebesse altas somas de dinheiro, iniciaria o apocalipse. Para demonstrar seu poder, faz uma demonstração disso na cidade de Raccon City. Foi demais até mesmo para a produtora, que demitiu todo mundo e recomeçou os trabalhos do zero.
George Romero, considerado o pai dos filmes de zumbi.
Em 1997, George Romero é contratado para fazer uma série de comerciais de Resident Evil 2, que estava para sair, e assina para participar também do filme da franquia. O pai dos filmes de zumbis escreveria o roteiro e dirigiria o longa, que representaria seu retorno ao gênero após mais de dez anos. A empolgação era tanta que ele começou a conversar com atores assim que terminou a história, e antes mesmo de a Capcom e a Constantin darem sua benção.
Bruce Campbell foi um dos atores cotados para o filme, com o astro de “Evil Dead” assumindo o papel de Chris. Bill Pulman, o presidente de “Independence Day”, ou James Woods, de “Videodrome: A Síndrome do Vìdeo”, interpretariam o grande vilão, Albert Wesker. O orçamento era de US$ 40 milhões, um valor bem alto para a época. Enquanto isso, a Capcom começou até mesmo começou uma promoção com os compradores de cópias de primeiro lote de Resident Evil 2, que poderiam visitar o set e fazer uma ponta como zumbi.
Todo mundo parecia feliz, menos a Constantin. Pelas mãos de Romero, Resident Evil se tornaria uma trama bastante crítica, com a Umbrella e o governo trabalhando juntos em prol do dinheiro. Wesker trairia a empresa como nos games, e levaria os S.T.A.R.S. para a mansão, mas as semelhanças param por aí. Chris não seria membro do time – ele seria um índio moicano, que alucina com águias – e teria um relacionamento afetivo com Jill. E em um dos momentos mais idiotas do roteiro, Brad acaba infectado após se cortar com o dente de um tubarão infectado.
O roteiro também era bastante violento, e a ideia de Romero era criar um filme com censura dezesseis anos, muito acima da classificação que a Constantin desejava. O diretor se recusou a fazer alterações e acabou sendo demitido. Anos mais tarde, afirmaria em entrevistas que a Capcom havia aprovado sua ideia, mas que os produtores nunca haviam nem mesmo jogado um game da franquia e não tinham a menor ideia do que estavam fazendo.
Em meio a trancos e barrancos, a produção de um filme de Resident Evil estacionava, enquanto os jogos só acumulavam mais sucesso. Em uma última tentativa, Bernd Eichinger, presidente da Constantin Films, assumiu pessoalmente os trabalhos e contratou Jeremy Bolt como seu braço direito e produtor da adaptação.
Foi aí que as coisas começaram a clarear, e a entrada de Paul Anderson soou bem para todos. O diretor era amigo do produtor, e para a Constantin, um bom nome para assumir o filme, após as boas críticas de “O Enigma do Horizonte” e “Mortal Kombat”. O longa, por sinal, foi seu grande cartão de visitas, já que para Eichinger, os fãs não teriam problema em aceitar um diretor já responsável por outra adaptação de jogos para o cinema.
Mais do que isso, a chegada de Anderson era tudo o que a produtora precisava. O jovem diretor ainda não tinha grande sucesso e concordava com a visão da Constantin, de que o filme de Resident Evil deveria pegar mais leve na violência, para atingir a um público maior e mais jovem até mesmo que os próprios jogos. Ele também aceitou, sem pestanejar, uma série de alterações sugeridas por executivos.
Foi assim que “O Hóspede Maldito” começou a tomar forma: um filme de zumbis com pouco sangue e muita tecnologia, cheio de mulheres bonitas dando porrada e usando armas. Era a receita certa para fisgar o coração dos adolescentes. Paul Anderson afirmou, na época, seu desejo de fazer algo menos violento e mais assustador, investindo no suspense, e não no sangue. O que saiu disso foi um filme asséptico e limpo, ainda que focado no terror.
No começo dos anos 2000, enquanto as primeiras informações sobre o filme começavam a sair, o roteiro escrito por George Romero vazou na internet. E se a insatisfação já era grande com o fato de que o filme não teria personagens do game, ela só se tornou maior quando a história do papa dos zumbis foi analisada. Ela era tão fiel quanto a de Anderson, ou seja, muito pouco. Mas, pelo menos, ia ter Chris, Jill, Wesker e a mansão. Para a Constantin, entretanto, tudo estava dando certo e era tarde demais para voltar atrás.
No dia 30 de maio de 2002, estreava no Brasil “Resident Evil: O Hóspede Maldito”, com Milla Jovovich, Michelle Rodriguez e Eric Mabius no elenco. O filme custou US$ 33 milhões para ser produzido e arrecadou mais de US$ 100 milhões em todo o mundo. Mesmo distante dos games, a história agradou uma parcela de fãs, e uma sequência foi rapidamente encomendada.
Ao longo das continuações, quanto mais a trama se afastava dos jogos que a originavam, mais aumentava o lucro. O quarto filme, “Resident Evil 4: Recomeço” se tornou a adaptação de games para o cinema mais lucrativa da história e sagrou a franquia ao posto de maior em lucratividade para a distribuidora Sony Pictures, ultrapassando até mesmo os filmes do Homem-Aranha.
Mais do que isso, a série se tornou o trabalho das vidas do produtor Jeremy Bolt, do diretor Paul Anderson e da atriz Milla Jovovich. Os dois, inclusive, se conheceram durante as gravações do primeiro filme e, hoje, são casados e têm uma filha, que também está em “O Capítulo Final”.
O quinto filme, “Resident Evil 5: Retribuição”, entretanto, foi um tanto quanto decepcionante. Apesar de não ter registrado prejuízo, ele representou a primeira queda em números de bilheteria desde o começo da franquia. E se a ideia de Paul Anderson era finalizar sua saga no sexto filme, o resultado comprovou que essa era mesmo a melhor ideia.
Isso nos traz até aqui, um momento em que o longa que deveria fechar uma saga gigantesca com um estouro vem sendo assunto de uma divulgação insossa. Apesar de fortes trabalhos dedicados ao Brasil, incluindo a presença de Jovovich na última Comic-Com Experience, pouco se fala sobre “Resident Evil 6: O Capítulo Final”, principalmente em um momento no qual todos estão ligados no novo game da franquia. O cenário parece ser de um final apagado para uma saga que, mesmo longe de ser uma grande representante dos jogos na telona, fez a alegria de muita gente.
Este artigo foi baseado em texto originalmente postado no Resident Evil SAC. Aqui, aparece modificado e atualizado com novas informações.