A relação entre as empresas no mundo dos games nem sempre é feita de forma clara. A cada título lançado, principalmente quando falamos dos blockbusters do mercado, são diferentes nomes envolvidos desde a etapa de produção até a efetiva chegada do título em nossas mãos. Nesse meio, claro, muita confusão na cabeça dos jogadores sobre quem, exatamente, está fazendo o que.
Por isso, no retorno dessa série mais de um ano depois de sua última publicação, vamos falar de algo que pode parecer óbvio para quem entende o conceito, mas gera dúvidas para quem não o compreende bem. Afinal de contas, quais os papeis da desenvolvedora e da distribuidora (ou publicadora, em alguns casos) na criação de um jogo?
Colocando a mão na massa
Vamos começar no início do processo, quando um título efetivamente está sendo criado. É aqui que está a parte da desenvolvedora, a companhia que trabalha de forma direta no game, desde a criação de seu enredo e personagens até a composição visual, mecânicas, programação, testes de bugs e tudo mais. É ela a responsável por todo o jogo, do ponto de vista técnico.
A Naughty Dog, por exemplo, é uma das produtoras de maior destaque dentro do rol de companhias que trabalham exclusivamente para a Sony. Na Microsoft, temos a 343 Industries, responsável pela série Halo, enquanto a Nintendo conta com a Game Freak, que trabalha quase que exclusivamente com os títulos da série Pokémon.
É de responsabilidade da desenvolvedora os DLCs lançados após a chegada de um jogo às lojas. Patches de correção para problemas de funcionamento ou a criação de novas funções? Também é com eles. Basicamente, tudo aquilo que envolve colocar a mão diretamente em aspectos técnicos é trabalho da produtora. Por isso, na hora de reclamar de problemas no seu Mass Effect: Andromeda, brigue com a BioWare e não com a Electronic Arts.
Lançando um produto
Um bom jeito de entender essa relação entre produtora e distribuidora é imaginar o mercado literário. Um livro é escrito por um autor, que, nessa comparação, tem a mesma função da desenvolvedora – criar a obra, efetivamente. A publicadora, então, é quem leva essa obra para as mãos do público.
É uma relação que remonta aos idos da indústria de games. Lançar um jogo sempre foi tarefa cara, e ainda é, pois além da produção em si, era preciso coloca-los em cartuchos ou discos, fabricar as caixinhas e distribui-los para as lojas, em um gigantesco trabalho de logística para garantir que o título estivesse nas prateleiras de todo o mundo na data marcada.
Mesmo com o advento dos jogos digitais, essa relação não mudou, e a distribuição física de games ainda é uma tarefa das mais complicadas. Aqui, o braço longo das grandes companhias acaba sendo mais eficaz do que iniciar um processo por uma companhia, e é por isso que as relações entre desenvolvedoras e distribuidoras continuam existindo, e dificilmente morrerão.
Vamos voltar aos citados acima. Falando apenas em exclusivos, a Sony, por exemplo, é a responsável pela distribuição dos jogos da Naughty Dog, assim como faz com outros de seus estúdios exclusivos. A Microsoft traz os títulos da série Halo desenvolvidos pela 343 Industries ao público, enquanto a Nintendo é quem fabrica os cartuchos de Pokémon quando um novo game da saga finaliza seu desenvolvimento pelas mãos da Game Freak.
A Electronic Arts também é uma empresa gigantesca, com boa parte de seus títulos desenvolvidos por parceiras e apenas publicados por ela. Alguns deles são Battlefield (DICE), Need for Speed (Ghost Games), Mass Effect (BioWare), Dead Space (Visceral Games), entre outros. Nem sempre, entretanto, é tão simples assim e é justamente aqui que começa a confusão na cabeça da galera.
Empresas dois em um
Muitas vezes, a mesma empresa é responsável pela produção e também distribuição de um título no mercado. É o caso da Capcom, que desenvolve os principais títulos de suas séries maiores, como Street Fighter e Resident Evil, em seus estúdios no Japão, usando a própria estrutura de publicação para lança-los ao redor do mundo. O mesmo vale para a Electronic Arts, que por meio de sua divisão EA Sports, produz todos os seus títulos esportivos, como FIFA e Madden.
A Nintendo, já citada duas vezes aqui, também pode trabalhar nesse esquema. Apesar de ter estúdios parceiros e exclusivos trabalhando para si, ela também possui suas próprias desenvolvedoras. The Legend of Zelda: Breath of the Wild foi produzido internamente, assim como Mario Kart 8, 1-2-Switch ou os vindouros Splattoon 2 e Super Mario Odyssey, apenas para citar lançamentos recentes.
Casos assim são mais raros, e como os exemplos aqui denotam, apenas grandes companhias são capazes de reunir os trabalhos de produção e lançamento de um jogo no mercado. Entretanto, existem exceções, como é o caso da Codemasters, que desenvolve e também lança os games de suas séries de corrida no mercado internacional.
Divulgação e propriedade
O papel de uma distribuidora existe também no mercado digital, pois suas funções não se resumem apenas à produção de caixinhas e colocação de títulos nas prateleiras. Muitas vezes, os recursos e alcance de uma empresa gigante também são usados em esforços de marketing, como forma de alavancar os resultados de um game. É assim com a série Dark Souls, da From Software, distribuída pela Bandai Namco.
Até mesmo games puramente digitais acabam carregando o nome de uma distribuidora consigo, pelos mesmos motivos. Em outros, aquele jogo só se tornou possível depois que uma grande empresa apostou na ideia, o que, muitas vezes, significa que rolou aporte financeiro. Unravel, da Coldwood Interactive, é um exemplo disso. A simpática aventura de Yarny se tornou o primeiro título de um programa de fomento da Electronic Arts para produtores independentes e novas histórias.
Há também uma segunda questão que permeia a relação entre distribuidores e desenvolvedores, que tem a ver com a propriedade sobre a marca utilizada. Muitas vezes, a produtora de um jogo não necessariamente tem os direitos sobre a franquia em que está trabalhando, pois eles pertencem à publicadora. Aqui, ela age como uma contratada para realizar um determinado trabalho.
É o que acontece, por exemplo, com Need for Speed. A marca é de propriedade da Electronic Arts, mas quem trabalha ativamente em novos jogos desde a geração passada é a Ghost Games. Em outros casos, há uma variedade de produtoras trabalhando em uma mesma saga, como no caso de Call of Duty, franquia que pertence à Activision e tem três desenvolvedoras – Infinity Ward, Treyarch e Sledgehammer Games, cada uma criando seus próprios títulos.
É por conta dessa diferenciação entre quem trabalha em uma marca e quem tem propriedade sobre ela que, muitas vezes, vemos uma dança das cadeiras no mercado. A Bungie subiu ao estrelato no mundo dos games como a criadora da série Halo, mas na verdade, essa é uma franquia da Microsoft. Quando a desenvolvedora original saiu, Master Chief ficou nas mãos da 343 Industries.
Ela, agora, segue com sua própria marca, Destiny, que apesar de publicada pela Activision, não pertence à gigante. Isso significa que após o fim do contrato entre elas, que deve durar quatro jogos, a Bungie pode seguir sozinha com a série de ficção científica, buscando outra distribuidora, por exemplo.
O mesmo vale para Life is Strange. A marca pertence à Square Enix, não à Dontnod, desenvolvedora do primeiro game, apesar de ambas as empresas trabalharem de maneira bem próxima. Isso não impediu, porém, que a distribuidora vendesse por si só os direitos de produção para a Legendary Pictures, que criará uma série de TV baseada no título, ou passasse o desenvolvimento de um prelúdio para as mãos da Deck Nine.
Em teoria, a produtora original não possui nenhum tipo de poder em casos desse tipo, mas isso nem sempre se traduz em realidade. Recentemente, a Square Enix resolveu se desvencilhar da franquia Hitman, e após acordo, transferiu as propriedades sobre a saga de volta para a desenvolvedora original, a IO Interactive. Ela, agora, segue de forma independente, mas pode encontrar uma nova distribuidora pelo caminho.
Diferenças regionais
Acordos de distribuição, muitas vezes, não valem internacionalmente por uma série de motivos. Seja por falta de penetração de uma determinada empresa em um território ou acordos diferentes feitos fora dos países de origem, a combinação entre produtoras e distribuidoras pode mudar, gerando alguns “crossovers” bizarros.
No Brasil, por exemplo, os jogos de Fórmula 1 da Codemasters foram, por alguns anos, publicados pela Bandai Namco. Também aqui em nossa terrinha, a Warner Bros. é a responsável por trazer os títulos da Capcom em formato físico.
Mas você sabia que, no Japão, é a Sony quem publicou os episódios mais recentes de Call of Duty para o PlayStation 4? Ou que a mesma Capcom que nos traz Street Fighter também entregou God of War e Grand Theft Auto aos japoneses? São misturas que parecem irreais no Ocidente, mas que do outro lado do mundo, se tornaram acordos de negócios muito lucrativos para ambas as partes.
A série “O que é”, de tempos em tempos, elucida termos bastante usados na indústria dos jogos. Você pode contribuir com dúvidas e sugestões pela área de comentários ou em nosso grupo no Facebook.