Quando Metal Gear Survive foi anunciado, houve muito burburinho na comunidade, em suma por conta de toda a polemica envolvendo a saída de Hideo Kojima, o criador da série, da Konami em meio à produção de Metal Gear Solid V: The Phantom Pain.
Boa parte dos comentários criticavam a postura da desenvolvedora e distribuidora, por continuar a franquia mesmo sem o seu “pai biológico”, por assim dizer, como uma forma de ganhar dinheiro de maneira “desonesta” – no sentido de produzir um spin-off descarado que não faria diferença para os fãs. Outros ainda afirmavam que a decisão de criar este game era uma resposta da empresa ao seu famigerado ex-funcionário, tal como uma forma de demarcar território e mexer na ferida.
Esses argumentos podem ser facilmente rebatidos com o simples conceito de que a Konami é, acima de tudo, uma empresa como qualquer outra e, portanto, possui inúmeras pessoas que devem remunerar, variados boletos para pagar mensalmente e acionistas e investidores a quem devem prestar contas com regularidade. Em suma: a companhia japonesa precisa se manter de alguma forma.
E então Metal Gear Survive chegou às lojas e… Bem, falta alguma coisa nesse jogo.
Survive é, como o título bem diz, um jogo de sobrevivência. Todas as mecânicas do game giram em torno de manter o personagem são e salvo, do começo ao fim do game. Na teoria, tudo é lindo e maravilhoso, mas a forma como é executada chega a ser cruel.
Survive deixa aquele gosto amargo na boca. Embora os conceitos apresentados sejam muito interessantes, na prática, a experiência é só desgastante.
Na história, o jogador assume a pele de um soldado da Mother Base que se destaca entre os demais e é nomeado como o líder. Ser a cabeça que vai guiar os demais personagens ao longo da trama significa que você é o mais capacitado e o que melhor executa a ideologia e os ensinamentos do Big Boss – sim, aquele mesmo.
Passado o breve brilho nos olhos pela promissora primeira impressão que o game traz até aqui, o jogador é colocado para montar a aparência de seu personagem principal em um sistema de criação bem genérico e sem grandes atrativos. Após a parte da concepção, eis que o game apresenta o complexo – e cansativo – tutorial de Survive.
Nos primeiros minutos tudo parece uma maravilha. As ideias que o game apresenta são realmente legais e renderiam uma bela e inesquecível experiência de sobrevivência virtual. Todavia, em pouco tempo você percebe como o universo de Survive é opressor, e como o jogo em si é punitivo de uma maneira nada agradável.
O conceito de punição em games serve, em tese, para fazer com que o jogador crie constantemente novas táticas, tente caminhos diferentes, utilize itens diferentes… Enfim, tudo em prol de nunca cair na mesmice e, ao final da aventura, ganhar a merecida sensação de reconhecimento próprio e de superação. É bonito, né? Mas com Survive não é assim que acontece.
Resumindo tudo o que o jogador precisa fazer em Survive para sobreviver: caçar comida boa (pois pode ser que você colete algo estragado) e água limpa e fresca, além de achar um local seguro para descansar. Além de tudo isso, é necessário coletar itens para criar objetos que podem ser usados em prol da sobrevivência, e por fim, tentar voltar para casa ativando Buracos de Minhoca em sua Mother Base improvisada, utilizando a energia Kuban do game.
O crafting do game é bastante engenhoso e fornece desde barreiras a armas de fogo ao jogador, recompensando de fato o jogador que se aventurou em busca de materiais melhores e/ou mais raros.
Como já comentado, as mecânicas de sobrevivência são excelentes, em teoria, mas na prática são intragáveis. Deixe-me explicar porquê.
Survive é um spin-off em sua mais pura essência. Não há conexão nenhuma com os demais jogos da franquia e seus personagens são esquecíveis.
Ao longo de todo o game, o jogador precisa prestar atenção em três necessidades básicas: fome, sede e vigor (mais tarde, entra um quarto elemento, o oxigênio, mas falaremos disso logo menos). O primeiro e o segundo são resolvidos encontrando água e comida em boas condições. E não é recomendado, aliás, ingerir nada estragado ou sujo, pois o personagem ficará intoxicado e isso punirá o jogador ainda mais do que o comum.
Já para preservar o terceiro item, basta não correr como um maluco, tampouco enfrentar todos os inimigos que se avista por aí. O quarto e último aspecto do game, inserido um pouco à frente na jogatina decorre de quando são acessadas as áreas cinzentas do mapa.
“Mas Jejé, o que exatamente te incomoda?”, você me pergunta. Bem, é simples: a necessidade de sempre colocar o jogador para caçar, literalmente, já que a fome e a sede do boneco nunca são saciadas mesmo que seja feito um banquete.
No começo do game, quando o seu “Big Boss” ainda possui pouca resistência, chega a ser irritante ao extremo entrar em uma missão com o personagem relativamente bem, e em questão de minutos, ter que parar tudo para caçar comida e água novamente. A punição para quem se opõe a ideia, inclusive, não apenas é incabível, como torna tudo rapidamente chato e cansativo.
E, antes que você se questione, não é só de coletar comida, água e material que Survive é feito. Existem inimigos e batalhas contra chefes que são muito legais. Contra os Andarilhos, os principais oponentes do game (basicamente zumbis), é necessário utilizar stealth, marca registrada do game – em especial no começo da aventura.
Além disso, as missões não possuem muita variedade e rapidamente você sentirá que Survive é só um jogo maçante e repetitivo, com momentos em que é preciso sobreviver a ondas de inimigos de uma só vez e depois caçar, caçar, caçar e caçar.
Survive é um spin-off em sua mais pura essência. Do começo ao fim. Tanto que, diferente da série principal, até mesmo a história aqui é qualquer coisa, e não há conexão nenhuma com os demais jogos da franquia – o que, por um lado é excelente, já que não será necessário ter jogado nada de Metal Gear antes para embarcar nesta aventura.
Os personagens do game são esquecíveis num geral e os arcos envolvendo os mesmos não fazem, no final das contas, tanta diferença assim, tampouco são memoráveis. A experiência em Survive no quesito storytelling é deveras decepcionante. E para completar, todas as grandes reviravoltas da história acontecem apenas perto do final da aventura.
Survive possui easter eggs a torto e a direito, com referências não apenas ao universo Metal Gear, mas também a outros títulos da Konami. Novamente, porém, nada demais.
O resumo da opera é que Metal Gear Survive deixa aquele gosto amargo na boca e, embora a jogabilidade seja fácil de ser dominada e os conceitos apresentados sejam muito interessantes, na prática, a experiência é só desgastante. Uma pena.
O game foi testado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Konami.