Battlefield V traz a franquia de volta às suas origens, de onde, para muitos fãs, não apenas ela, mas a maioria das séries de tiro em primeira pessoa jamais deveria ter saído. O palco da batalha volta a ser a Segunda Guerra Mundial, mas o novo game da DICE e da EA não representam uma volta ao passado, muito pelo contrário — as dinâmicas, a jogabilidade e, principalmente, a pegada, são completamente atuais.
O novo jogo chega, também, em uma época que pode ser considerada por muitos como o momento de uma crise de identidade para a franquia, que viu sua tradicional data de lançamento adiada e o rival futurista passando à frente, e também para a empresa, que se tornou o sinônimo do mal das microtransações para o mercado. Battlefield V caminha no meio disso tudo e suas qualidades e defeitos, também.
Logo de começo, já dá para perceber que o subestimado Battlefield I deixou sua marca, o que é uma ótima tanto para o antecessor em si quanto para o atual. O novo campo de batalha está mais caótico, insano e, principalmente, delicioso para os ouvidos. A epicidade aparece desde o mais simples modo multiplayer até as Grandes Operações, citadas pela DICE como a menina dos olhos da jogatina online.
Battlefield V é mais um grande expoente de uma franquia que nem precisa comprovar porque é uma das principais do gênero. As práticas corporativas da EA, porém, acabam entrando novamente no caminho.
O apoio histórico, também, torna o modo mais encorpado. Estamos em combates que duram dias, transformados em etapas de batalha, que refletem acontecimentos reais da Segunda Guerra Mundial. Os objetivos também mudam de acordo com o andamento das campanhas e as Grandes Operações acabam tendo uma variação interessante de modos, compreendendo os diversos aspectos de Battlefield V em uma única sessão de jogatina.
É neste modo, também, que se percebe a influência de boa parte das novidades adicionadas às mecânicas. O trabalho em equipe continua sendo essencial para a vitória, ao contrário da correria e velocidade dos concorrentes no mundo do FPS, enquanto a construção de fortificações pelos aliados ou a ressurreição rápida de companheiros pelos médicos torna os combates muito mais tensos e viscerais.
Mais do que nunca, Battlefield V é um game para ser jogado com os amigos ou, pelo menos, com o uso de um headset para comunicação com a equipe. A não ser que você seja um franco-atirador e esteja fazendo seu papel de aniper à distância, seguir sozinho jamais é uma boa ideia. Assim como as próprias histórias da guerra são de companheirismo, sacrifício e união, o multiplayer do título também incentiva esse tipo de comportamento.
Um novo sistema de interação entre as diferentes classes traz mudanças sensíveis, mas importantes, ao andamento do multiplayer. A regeneração de vida funciona por meio de kits distribuídos pelos médicos, enquanto a munição não é mais tão abundante, e também pode ser entregue por companheiros. Um novo sistema balístico tornou a infantaria mais ofensiva e eficaz, principalmente à distância, com todos estes elementos, juntos, criando uma força ofensiva e defensiva importante quando bem usada, ou totalmente furada quando os jogadores não sabem bem o que estão fazendo.
O sistema de progressão, por outro lado, soa demorado. As fases do multiplayer são longas e exigem muitas ações, o que passa ao jogador a sensação de que ele está sendo essencial no cenário da guerra. Na hora de fazer as contas, entretanto, a pouca inntuitividade das mecânicas e menus, além da baixa contagem de experiência e o uso de pontos para compra de itens caso o usuário não queira esperar torna o processo de melhorar um tanto burocrático. Com isso, a sensação de ver aliados e oponentes bem mais avançados no campo de batalha pode desestimular os recém-chegados.
Como já é tradição em seu multiplayer, Battlefield V chega com alguns problemas no sistema de respawn, que nem sempre responde exatamente à vontade do usuário, além de problemas de animação nos personagens mortos. Indicadores vermelhos, quando o inimigo é marcado por um aliado, ajudam a diferenciar os cadáveres dos vivos, mas não será raro ver um movimento à distância, disparar e revelar sua posição, percebendo da pior maneira possível que aquilo era apenas um presunto travado e sambando contra uma parede.
A abordagem de jogo como serviço que será dada pela EA ao game já mostra suas marcas, passando a sensação de que há pouco conteúdo disponível neste lançamento. Não se engane, os mapas são grandes e existem diferentes operações a serem realizadas, mas elas podem ser contadas nos dedos e, rapidamente, o jogador se verá repetindo modos ou ambientes. A comunicação é clara, há muito mais a caminho, mas a sensação de estarmos diante de um game incompleto persiste.
O modo multiplayer de Battlefield V é caótico, gigantesco das Grandes Operações e altamente movimentado. É na campanha, por outro lado, que o jogo realmente é capaz de mostrar sua faceta artística, exibindo com louvor os belíssimos gráficos mesmo nos consoles base e o nível sempre alto de fidelidade sonora.
Nas Histórias da Guerra, conferimos pequenas crônicas de heróis desconhecidos, que não se tornaram figuras renomadas do combate mas executaram atos de bravura e, assim como os grandes nomes, mudaram o rumo do conflito. Vamos da resistência contra os nazistas nas montanhas nevadas da Noruega ao front francês, com soldados diante não apenas dos alemães, mas também do preconceito racial, passando pela segunda chance dada a um criminoso inglês que é levado ao campo de batalha.
Battlefield V é grandioso, interessante e, principalmente, belo. Entretanto, fica a sensação de que ele ainda tem muito a melhorar por meio de atualizações e, principalmente, adições de conteúdo.
E é basicamente isso. Novamente, e logo ao entrar no menu, a sensação é de estarmos diante de uma proposta capada. As Histórias da Guerra disponíveis no pacote inicial de Battlefield V garantem de quatro a cinco horas de jogatina, um total pequeno mas que é um padrão em jogos de tiro dessa categoria. Os capítulos são pequenos e objetivos, mas as grandes cenas de batalha e as belíssimas cutscenes vão deixar o jogador com vontade de mais.
A sensação de produto inacabado também aparece nos constantes bugs presentes no modo. Enquanto o “primor” é uma boa palavra para definir o conjunto visual e sonoro das Histórias da Guerra, a jogabilidade em si sofre com problemas que normalmente trabalham contra o jogador, o prendendo em portas que insistem em abrir para o lado errado ou fazendo inimigos brotarem da terra.
As fases são desafiadoras, apresentando uma dificuldade acima da média para um modo desse tipo, o que é bom. Não é legal, entretanto, ver médicos inimigos simplesmente surgindo para ressuscitar companheiros mortos, ou nazistas que saem voando após uma morte furtiva, alertando os outros soldados. A DICE também foge do realismo proposto ao apresentar alguns inimigos esponjas de balas, que nem mesmo reagem ao receberem uma rajada de metralhadora direto no peito.
Battlefield V sofre, ainda, do mesmo mal de outros shooters que tentam adicionar um pouco de furtividade à fórmula. Aqui, não existe meio termo: ou você está oculto ou todos os jogadores saberão sua localização, mesmo que você tenha lançado uma granada do lado oposto, apenas para chamar a atenção de todos. É uma quebra no realismo proposto, ainda, quando saímos de um intenso tiroteio para encontrarmos uma base tranquila e com soldados dormindo apenas poucos metros depois.
A autenticidade à proposta, como sempre, acaba sendo o aspecto mais forte do novo game, principalmente para os aficionados pela Segunda Guerra Mundial. O comportamento das armas e veículos, o funcionamento de tecnologia e até mesmo o idioma falado pelos personagens, sempre o original ao longo de toda a campanha, chamam a atenção para o cuidado histórico dado pela DICE ao título, como já é uma tradição.
E, não apenas por isso, mas também pelo aspecto caótico, épico e incrivelmente envolvente da maioria dos modos multiplayers, Battlefield V se firma como mais um grande expoente de uma franquia quenem precisa comprovar porque é uma das principais do gênero. Os problemas, entretanto, começam a saltar aos olhos mesmo daqueles que não são fãs de carteirinha, com as práticas corporativas da Electronic Arts novamente entrando no caminho da experiência.
Como está, o título é grandioso, interessante e, principalmente, belo. Entretanto, fica a sensação de que ele ainda tem muito a melhorar por meio de atualizações e, principalmente, adições de conteúdo, ficando aquém do que foi imaginado até mesmo por seus idealizadores. A ideia de termos um game que continuará crescendo por meio de novos conteúdos e updates é interessante, mas menos quando o pacote inicial soa capado, mas vendido por preço cheio.
Quem aderir a esse combate sabendo de tudo isso terá um prato não cheio, mas farto nas mãos, e com plena possibilidade de repetição, com a primeira grande entrega de conteúdo já marcada para dezembro. Mas é importante chegar sabendo, caso contrário, a sensação de ter comprado um bolo faltando um pedaço pode acabar impedindo o jogador de sentir o ótimo sabor de um épico do combate digital.
O jogo foi testado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Electronic Arts.