A história da franquia Luigi’s Mansion é como a de seu próprio protagonista. Em um mundo dominado por Mario e em que todo mundo só fala do encanador de roupa vermelha, seu irmão de cor verde veio conquistando as pessoas na humildade, ganhando seguidores, memes próprios e, principalmente, títulos para chamar de seus, muitas vezes, tão bons quanto o de seu companheiro de aventuras.
Sempre foi assim com essa série. Nascida nos idos do GameCube, ela não tem uma lista de lançamentos consistente. Ao contrário de Mario, o qual sabemos que sempre terá pelo menos um grande game por plataforma, Luigi não segue a mesma tônica, com lançamentos espalhados. O segundo de sua franquia, por exemplo, saiu exclusivamente para o Nintendo 3DS, e por lá ficou.
Agora, e finalmente, ele ganha o apogeu e o destaque que merece. Com lançamento no último Halloween, Luigi’s Mansion 3 chega para consagrar a série no panteão de grandes exclusivos da Nintendo, com uma aventura cheia de personalidade, carisma e criatividade para agradar a jogadores de todas as idades e estilos, como apenas a “Big N” consegue fazer. E o melhor de tudo, ou nem tanto assim, é que este título ainda mostra ter um bom caminho a seguir em busca da própria aprimoração.
Luigi’s Mansion 3 consagra a série entre as grandes da Nintendo, com uma aventura cheia de personalidade, carisma e criatividade para agradar a todo tipo de jogador.
No game, que poderia muito bem se chamar Luigi’s Hotel, a turma toda é levada ao Last Resort, uma luxuosa hospedagem. Como diz a regra dos filmes de terror, se você recebe um voucher para ficar de graça em um local luxuoso desses, é claro que é uma armadilha, e quase todos, com exceção do magrelo de roupa verde, acabam presos em quadros como parte da vingança de fantasmas caçados pelo italiano em jogos passados.
Mais uma vez de posse de seu aspirador de fantasmas, Luigi precisa agora vasculhar os andares do hotel em busca de seus companheiros e, também, recapturando todos os espectros. Ajudas do passado retornam, enquanto novos amigos em forma de amoeba se unem à aventura para adicionar um caráter de variedade e exploração que chama a atenção desde o primeiro ao último minuto.
Deixando a abordagem linear de seu antecessor de lado, Luigi’s Mansion 3 faz o que costumamos chamar por aqui de mundo semi-aberto, no qual o jogador é livre para explorar os andares, descobrir seus segredos e usar os poderes recém-descobertos, enquanto o game, sempre, indica o caminho a seguir e guia os rumos da história pelos andares do Last Resort.
Esse direcionamento se dá por meio de um sistema tradicional de chefes de fase, com praticamente todos os andares do hotel trazendo um combate desse tipo. Os fantasmas mais fortes entregam os botões do elevador do Last Resort, abrindo o caminho para novas “fases” e, também, novos desafios, com o seguinte dificilmente sendo igual ao anterior.
A principal marca de Luigi’s Mansion 3, como essa progressão deixa claro, é a criatividade. O título está sempre encontrando novas maneiras de fazer com que os jogadores utilizem suas habilidades, isso quando não adiciona recursos efetivamente novos na forma de novos inimigos, possibilidades para o aspirador de espíritos ou puzzles com o cachorro Polterpup ou Gooigi, a versão amoeba do protagonista.
Ela, inclusive, é a que mais abre possibilidades do novo título, sendo capaz de atravessar grades ou entrar em lugares pequenos. Apesar da vida mais baixa, Gooigi tem as mesmas capacidades de Luigi, o que também abre as portas para enigmas cooperativos, em que os jogadores devem posicionar os dois e os utilizar ao mesmo tempo, bem como para um modo online que serve como um passatempo extra interessante.
A utilização da geleca em forma de italiano também dá vazão a um outro aspecto de Luigi’s Mansion 3. Ao mesmo tempo em que direciona o jogador exatamente para onde deseja que ele vá, o game também permite uma exploração livre, com cristais, diamantes e outros itens colecionáveis para serem coletados e descobertos em todos os cantos.
Complementa tudo isso um design de fases muito inspirado e que faz bom uso das capacidades do Switch. Os serrilhados e quedas na taxa de quadros por segundo que normalmente aparecem nos títulos da plataforma quase não dão as caras aqui, com um cenário que parece vivo e reage às interações do jogador. Tudo, praticamente, pode ser sugado ou quebrado, e todo o cenário esconde alguma coisa, nem que seja apenas uma moedinha.
Os controles confusos são praticamente a única falha de um jogo que se aproveita das bases fortes do passado, adicionando novos recursos e situações para levar tudo adiante.
Caso deseje, o jogador pode perder horas explorando cada cantinho ou pensando na solução de enigmas nem sempre óbvios. Em outros casos, perceberá estar diante de um obstáculo intransponível, tendo de retornar ao andar mais tarde e com habilidades adicionais para coletar um item, tudo sem ficar perdido, pois cada andar possui sua própria característica e o mapa, apesar de não indicar pontos de interesse, é incrivelmente objetivo.
Essa, aliás, também pode ser uma palavra para definir Luigi’s Mansion 3, uma vez que, se desejar, o jogador também pode ignorar completamente as missões extras e seguir diretamente ao ponto, sem sentir que está perdendo algo com isso. A progressão andar a andar pode ser veloz caso o usuário deseje, e assim, dá para sentir o avanço da dificuldade e das ideias de seus desenvolvedores, da Next Level Games, na medida em que a trama se desenrola e as novas possibilidades do título vão se abrindo.
Em determinados momentos, e de forma bastante estranha, inclusive, o game parece preferir essa abordagem em relação à primeira. Luigi estará sempre em contato com o Professor E. Gadd, que aparece desde o primeiro jogo da série. Basta desviar um pouco do caminho central da trama, em alguns momentos, para que ele entre em contato com o protagonista pedindo agilidade no cumprimento dos objetivos principais.
Isso acontece o tempo todo e tenta impor um senso de urgência a um título que é tudo, menos isso. Felizmente, dá para desligar as ajudas do cientista nas preferências do game e explorar os cenários sem ser incomodado, apesar de isso também significar que, em alguns momentos, dicas úteis podem acabar sendo perdidas.
A prova de que praticamente não existe urgência em Luigi’s Mansion 3 é o fato de os inimigos comuns e até mesmo chefes de fase sempre darem o espaço necessário para que o jogador manobre o personagem e a direção de sua lanterna e aspirador. Há um verdadeiro nó na cuca quando controlamos esses dois aspectos ao mesmo tempo, com cada um tendo funcionamento bem diferente do outro.
Enquanto Luigi anda por aí do jeito convencional, caminhando na direção em que o jogador aponta o analógico, suas armas adotam um estilo tanque semelhante ao dos antigos games da série Resident Evil. Isso significa que o personagem gira sobre o próprio eixo quando a alavanca é colocada para o lado, enquanto a altura dos disparos ou iluminação é feita quando se leva o controle para cima ou para baixo. Essa mistura confunde e, muitas vezes, dificulta uma ação mais rápida.
Mostrando ser um game que parece conhecer das próprias deficiências, além do espaço dado pelos inimigos, Luigi’s Mansion 3 usa outras formas compensar isso, como uma suave mira automática que ajuda a situar os disparos em momentos em que a precisão é necessária. É possível usar os sensores de movimento do Switch para controlar as armas, mas essa também é uma alternativa pouco agradável.
Essa, ao lado de um incômodo alarme sempre que estamos com a vida baixa, impedindo que a gente escute a trilha sonora e os sons do game, é a única grande falha de um game que leva as próprias base adiante e adiciona novas para se tornar incrível. Uma tônica atual do mercado de jogos é que nem todos os jogos são para todos, mas Luigi’s Mansion 3, sem dúvida, passa longe desse tipo de palestrinha prepotente.
Muito pelo contrário, sem ser ambicioso nem subestimar sua audiência, o novo exclusivo do Nintendo Switch apresenta uma diversão na medida para todos os públicos, desafiando sem se tornar punitivo e tendo simplicidade o bastante para abraçar jogatinas rápidas. Sua história e enigmas maiores sustentam uma experiência mais longa, enquanto a criatividade geral sempre instiga o jogador a seguir adiante para descobrir o que os novos andares reservam.
O cuidado dado pela empresa a uma franquia que muitos viam, até agora, como secundária, por si só, é capaz de mudar essa exata mesma concepção. Se Super Mario Odyssey é considerado como um dos melhores jogos da carreira do encanador vermelho, seu irmão agora tem, em Luigi’s Mansion 3, também o seu apogeu merecido e há tantos anos esperado.
O jogo foi analisado em cópia cedida pela Nintendo. Este review também foi publicado no Canaltech.