Os video games possuem um longo histórico de grandes títulos que se inspiraram em Hollywood; cada vez mais vemos jogos com enredos cinematográficos que dialogam com o jogador de forma muito similar ao cinema. Até a jogabilidade de alguns títulos atuais são pensadas de forma que o jogador tenha a sensação de estar jogando um filme, mas o curioso é ver o quanto essa sinergia está desalinhada quando ocorre o processo contrário.
A migração dos games para o cinema possuem pouquíssimos títulos com uma qualidade aceitável. Filmes como “Super Mario Bros.” (1993) e “Street Fighter: A Batalha Final” (1994) quase fizeram a indústria cinematográfica desistir de tal feito, mas entre erros e acertos vemos que ainda há muito para os profissionais do cinema aprenderem sobre o universo subestimado dos games.
Jogos eletrônicos se popularizaram nos anos 1980 somente como uma simples plataforma de entretenimento, um brinquedo na percepção dos adultos. Com o passar do tempo a tecnologia foi se aperfeiçoando permitindo que enredos mais elaborados fossem criados e obviamente o sucesso estrondoso dos brinquedos digitais chamou a atenção de outros setores da indústria do entretenimento.
Street Fighter: O Filme foi massacrado pela crítica
Algumas tentativas foram feitas durante os anos 1990, em sua maioria fracassos, com uma falta de respeito com o material original estampada nas grandes telas do cinema. É até possível imaginar que os produtores não tiveram contato com os games antes de iniciar a produção dos filmes, ou até mesmo escrever o roteiro, pelo péssimo resultado do produto final.
Nos anos 2000, produções chamaram a atenção como “Resident Evil: O Hóspede Maldito” (2002) e “Terror em Silent Hill” (2006). No caso da produção da Capcom, a história é praticamente uma obra independente sem muita ligação com o jogo, criando sua própria legião de fãs com suas várias continuações. Silent Hill, por outro lado, utilizou de forma respeitosa o máximo de elementos do game que pode, só que não conseguiu transmitir o sentimento de angústia da mesma forma que o jogo, o que é intrigante. Estava tudo lá, a menina desaparecida, os monstros deformados, o mesmo objetivo, tudo! Mesmo assim, permanece aquela sensação de que falta algo.
Qual é formula do sucesso?
É importante aceitar que videogames e cinema são mídias distintas. Tendo isso em mente, é compreensível que haja diferenças de história, personagens e outros aspectos. Mesmo assim, a pessoa responsável pelo projeto precisa vivenciar esse universo.
Imagine que estranho seria se o diretor de Harry Potter não tivesse lido o livro até o final e pedisse para alguém lhe contar. Não é a mesma coisa, não são os mesmo sentimentos que esse diretor teria na hora de adaptar a história para as grandes telas. Obviamente, o que estou citando é apenas uma suposição, até porque um diretor nunca admitiria que não teve contato com a mídia original para fazer uma adaptação.
Outro ponto importante é levar a história a sério, lembremos do caso do primeiro filme de Street Fighter, em que os protagonistas originais tornaram-se irreconhecíveis e um personagem secundário torna-se o principal foco da trama, só para inflar mais ainda o ego americano. As semelhanças com o jogo se resumem as roupas e nada mais. Estamos falando de 1994, época em que a visão dos videogames como brinquedo era ainda mais forte.
No ano seguinte Paul Anderson lança “Mortal Kombat – O Filme”, onde vemos Liu Kang lutando junto aos outros guerreiros da Terra em um torneio para salvar o mundo. Parte deles estava sem roupas parecidas com o jogo, mas quem jogou MK consegue reconhecer todos, vilões e mocinhos. Outros personagens aparecem e vemos cenas que remetem ao passado de cada um, fator que não foi mostrado visualmente no jogo e estava no filme. Esses detalhes fazem uma grande diferença, deixam nítido que PA jogou Mortal Kombat, e muito! Não duvido que até tenha lido a cartilha que vem com o cartucho.
O caso do filme Silent Hill é diferente, no qual vemos o respeito e cuidado que os produtores tiveram com os fãs do game. O problema é que a história é complexa e quando isso acontece resumir o enredo se torna um grande desafio. No fim, o longa nos ganha pela nostalgia ao vermos as criaturas da cidade e cenas idênticas com o game, mas que peca no fator terror psicológico que é o carro chefe da franquia, é visível o esforço merecidamente reconhecido.
As boas adaptações existem, em número muito menor do que as ruins. Para fazer com que esse cenário atual mude, os próprios profissionais do cinema precisam deixar os preconceitos (ou preguiça) de lado respeitando o material base. Ato que não é garantia de sucesso, mas essencial para realizar qualquer tipo de adaptação.
Ainda há esperança
Mesmo que um estúdio se interesse em levar um game específico para cinema ou para a TV, ainda existem outros fatores que podem interferir na qualidade do produto final. Fatores que vão desde inexperiência por parte da pessoa responsável até a falta de vontade em realizar o trabalho. Toda produção em conjunto está sujeito à esses problemas, o que não justifica a falta de repertório e respeito por parte de alguns profissionais de Hollywood quando o assunto é videogame.
Só neste ano, temos três adaptações de games para o cinema. “Angry Birds”, – que estreou em maio -, “Warcraft: O Primeiro Encontro de Dois Mundos”, – que estreou em junho com uma recepção “morna” da crítica-, e Assassin’s Creed, que está sem data de estreia para o Brasil.
Todas parecem incríveis pelos trailers, mas devido ao tortuoso histórico na relação entre os jogos e o cinema, é difícil tirar conclusões precipitadas. Será que aquele enredo que te fez ficar horas na frente do seu console até ver o desfecho foi respeitado? Aquele personagem que fez o jogador criar uma empatia imediata terá a mesma personalidade? São muitas questões e, até o lançamento, poucas respostas.
Talvez este ano seja marcado pelas super produções inspiradas nos games que dão início a uma nova era das adaptações, trazendo trabalhos tão admiráveis quanto os longas baseados em quadrinhos que tivemos recentemente.