Por muito tempo a sociedade não se incomodou em segregar minorias na tentativa falha de estabelecer um padrão de ser humano. Vivemos um tempo de transformação, para melhor, de atitudes que antes eram consideradas “comuns”. A zoeira (em alguns casos) agora é bulliyng, o julgamento é preconceito e mulher que cozinha não é “feita pra casar”. Esses são só alguns exemplos, lembrando que eu não estou falando do “politicamente chato”, termo que também surgiu graças à incrível capacidade das pessoas de se ofenderem com qualquer coisa, fazem uma brincadeira com João e Maria, e o Fulano vem tirar satisfações.

O ponto é que essas mudanças ajudaram, e ainda ajudam, muitas pessoas que são marginalizadas, seja pela cor da pele, sexualidade, gosto musical e até interesse por games. Sim, ainda existem pessoas que colocam os jogos na categoria “brinquedo de criança”. Cosplay ainda é tabu para aqueles que não entendem seu significado e ficam até impressionadas quando descobrem que é possível viver disso como profissão. Triste, mas realidade.

Nem tudo está perdido, a humanidade evolui no ritmo de um conta-gotas, mas o importante é que ainda evoluímos. As mudanças no modo de pensar e agir ocorrem devido as influências que sofremos no dia-a-dia. Tudo ao nosso redor pode contribuir para percebemos que o mundo não é como imaginamos ser ou como nossos pais descreveram, parte dessas influências no pensamento acontecem por conta da representatividade.

Ver um personagem gay ou uma mulher forte e trabalhadora em uma novela não é apenas ficção, é um espelho da realidade. Realidade esta que muitas vezes não vemos por estarmos dentro da “caixa” em que colocamos nossas mentes. A princípio podemos até resistir ou ignorar, porém acaba sendo inevitável reconhecer que as diferenças existem e as mudanças precisam acontecer.

Obviamente nem tudo é perfeito, as mídias demoram para acertar na representação que demonstre respeito e abusam de estereótipos causando o efeito contrário. É importante ter em mente que tais personagens e histórias querem tirar as pessoas da zona de conforto, mostrar algo diferente para causar um impacto maior na sua percepção sobre a vida e a sociedade em que vivemos. Tais objetivos podem se expressar em qualquer mídia, tais como: livros, HQs, séries, música e games.

Nada de sexo frágil

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A representatividade da mulher nos games começou cedo, em 1986. Samus apareceu pela primeira vez em sua árdua missão de combater os Space Pirates e superar seus traumas do passado. Em uma primeira impressão errônea, o jogador pensa que Samus é só mais um herói no universo do sci-fi com sua armadura cheia de apetrechos quase indestrutível. O que os gamers da época nem desconfiavam é que o herói do jogo Metroid surpreenderia a todos no final, revelando que na verdade é uma heroína.

Na tela final do game,  ela aparece sem a armadura, pegando o jogador de surpresa. A caçadora de recompensas mostrou que é capaz de fazer coisas inimagináveis da mesma forma que um homem faria, ou até melhor. Inspirando pequenos jogadores, e consequentemente as jogadoras da época sobre a força que cada um tem dentro de si para realizar seus objetivos.

Só que um detalhe desse final chamou a atenção: dependendo do desempenho do jogador  Samus aparecia com menos roupas! E isso nos leva a outro tópico na questão da representatividade que é o apelo sexual.

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Em um primeiro momento você pode até se questionar: qual o problema ela estar de biquíni? Mas a pergunta que você provavelmente não fez é: qual a necessidade de ela estar de biquíni?

O ano era 1986 e os jogadores, em sua maioria garotos entre a puberdade e adolescência, precisavam de uma justificativa para terem terminado o jogo com uma personagem mulher (pois pressupõe-se que jogar com personagens femininas é coisa de “viado”), então o que fazer? Nesse caso a solução foi colocá-la seminua, porque mesmo que o garoto se irritasse pelo menos pensaria “ela é gostosa” e tudo ficaria bem. Infelizmente, por muito tempo Samus fez parte das personagens sexualizadas, tendo sua mensagem sobre força feminina ofuscada pelo seu corpo escultural.

Sexo vende!

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Esse subtítulo não poderia ser mais óbvio, mas ele é apenas um resumo de um mercado que explorou, e ainda explora, a imagem das mulheres como sendo somente um objeto sexual. Tanto que existem pessoas que escolhem  a Mai Shiranui (da série The King of Fighters) somente para ver seus volumosos seios balançando e não por sua força, diferente do motivo de quando escolhem Iori ou Kyo, por exemplo.

A boa notícia é que isto está mudando. Podemos dar uma olhada na própria história de Lara Croft para comprovar. Com seus seios absurdamente desproporcionais a capacidade de realizar acrobacias, muita sensualidade, lábios carnudos e por último, e menos importante, sua força. Croft conquistou os gamers instantaneamente, mas seu sucesso como sexy simbol teve seus dias contados, graças a qualidade duvidosa de suas sequências e seu carisma comparável a uma tábua.

Tomb Raider já teve seis milhões de cópias vendidas

Lara começou a se destacar mais por sua beleza do que sua personalidade e as pessoas começaram a perceber isso, em especial as próprias mulheres. Logo após o lançamento de “Tomb Raider: Underworld” em 2008, os produtores começaram a trabalhar no novo projeto que tentaria novamente contar quem é Lara Croft. Para isso eles precisavam mostrar as respostas e deixar que os jogadores descobrissem por si sós.

O resultado foi uma personagem que deve superar suas adversidades e lutar por sua sobrevivência. Tomb Raider de 2013 não só deu um novo fôlego para a série, mas também apresenta uma nova Lara. Uma que tem medo, inseguranças, que se machuca, sente dor e mesmo assim faz de tudo para salvar seus amigos. Tomb Raider (2013) é um excelente exemplar do arquétipo de heroína que o mundo atual precisa.

L,G,B,T e o alfabeto inteiro se for preciso

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Seria até um crime falar sobre representatividade e não citar Poison, a personagem é a protagonista número um em piadas transfóbicas e homofóbicas. Mas o que muitos não perceberam, ou realmente não sabem, é sua origem conturbada, desrespeitosa e absurda. A garota do time de vilãs da série Final Fight nasceu criando polêmica já em 1989.

Final Fight foi desenvolvido e distribuído pela gigante japonesa Capcom, originalmente para os arcades. O game foi sucesso absoluto no Japão e garantiu seu passaporte para ser distribuído em outros continentes. Quando isso ocorre os jogos passam por um processo de regionalização, no qual os órgãos regulatórios de cada país alteram ou removem qualquer característica que possa ofender ou não se adaptar bem naquela cultura.

Poison era membro de uma gangue de rua Mad Gear e tocava o terror em  Metro City. Por se tratar de um jogo no estilo beat-‘em up obviamente os heróis dariam uma surra em todos os vilões, incluindo Poison. O problema foi que quando o game foi regionalizado para o Estados Unidos, acreditava-se que não seria bem visto pela sociedade da época ver homens agredindo mulheres. A solução foi atualizar o perfil da personagem dizendo que ela era um homem que se vestia de mulher.

Isso deixou bem explícito o pensamento de que agredir pessoas LGBT é algo comum, aceitável. Só com o passar dos anos Poison foi definida como uma personagem transexual e conseguiu os respeito de (alguns) marmanjos mostrando que é boa de briga. Hoje com o assunto da transexualidade ganhando cada vez mais evidência, ela tornou-se um belo exemplar de força e beleza das pessoas trans. Ela entrou para o elenco de “Street Fighter” e fez participações em outros games da empresa como “Marvel VS Capcom 3” e “Street Fighter X Tekken”, além de conquistar uma legião de fãs.

Ellie encontra Riley em trailer de The Last of Us: Left Behind

Outra história clássica de homofobia é o caso das personagens Ellie e Riley, na DLC “Left Behind” do jogo “The Last of US”. Esse capítulo extra se propõe em contar como a protagonista foi infectada e nos apresenta sua melhor amiga que estava com ela no momento do acidente. Com um primor impressonante, o game mostra o relacionamento das duas de forma delicada fazendo com que o jogador sinta uma empatia quase que imediata pelas duas enquanto brincam.

Mas todo essa empatia se transformou em indiferença, nojo e até ódio quando as duas se beijaram. Não acredita? Então eu te convido a ler os comentários do vídeo abaixo:

É bizarro ver a decepção das pessoas com a personagem, como se todo seu caráter, carisma e personalidade se desmanchassem no momento em que eles descobriam sobre a sexualidade dela. Alguns ficam em negação, dizendo que ela está confusa por não ter referências de relacionamentos heterossexuais, outros culpam a idade e acreditam que aos 14 anos ela não sabe o que quer, “É só um beijo inocente” muitos disseram.

Mais uma vez, entramos na questão que realmente tem que ser feita: por que você se incomoda?

Ellie não deixou de ser a garota que o jogador salvou no game, nem tentou fazer mal a alguém. Ela foi julgada simplesmente por demonstrar seu amor pela amiga,  por tentar ser feliz. E é isso que o jogo tenta transmitir representando o amor para que ele seja aceito.

E daí?

Cada vez mais forte, a representatividade existe para tentar desconstruir os valores misóginos que se estabeleceram há milênios. Dando uma voz para as mulheres, gays, negros e outras minorias, que sempre foram ensinados que são inferiores. Mostrando que a capacidade humana vai além de qualquer característica negativa impostas por pessoas que não fazem esforço algum para tentar se colocar no lugar do próximo.

E se você ainda dúvida pesquise, leia, use sua internet para entender a história da sociedade em vivemos. Pois tudo de ruim que a humanidade ainda pratica e acha normal, é o reflexo do passado que não podemos esquecer, mas usá-lo como exemplo para não cometer os mesmos erros no futuro.

 

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