A inveja é um sentimento maligno, feioso e anticristão que todo mundo tem, mas disfarça como se fosse uma espinha que apareceu, simetricamente, no meio da testa, bem no dia daquele rolê programado há semanas. Com alguma clareza quase sobrenatural, lembro-me perfeitamente do momento em que esse pecado capital apareceu pela primeira vez e fulminou meu pâncreas. Ele estava dentro de um deck novinho, mega brilhante e caro de Yu-Gi-Oh! que um amigo meu tinha acabado de ganhar, do Seto Kaiba. Com os três dragões brancos e tudo. Pronto, passo dado para os anos seguintes tentando suprir essa falta jogando Magic The Gathering – onde aprendi que ser mais complexo não significa ser mais divertido.
Então vieram os tablets. Hearthstone chegou e se consagrou – com todos os méritos – como o card game mais jogado da plataforma, mesmo com aplicativos dos próprios Magic e do Yu-Gi-Oh! rodando por aí. Ambos, no entanto, bastante exclusivos dos jogadores que já conheciam sua base e sem o elemento principal, que sobra no jogo da Blizzard, o fator simplicidade.
Os jogos do Magic The Gathering, lançando temporadas ano após ano, continuam confusos, mas, de certa forma, fiéis ao original. Entretanto, a Konami – veja só – com o ouro nas mãos e com o dever de casa feito, resolveu, enfim, unir o simples, o adorado e o divertido, lançando para iOS e Android, Yu-Gi-Oh!: Duel Links.
Trocando os excessos por funcionalidades
Quem assistia religiosamente ao anime na época e sonhava com um jogo daquele jeito, o mais próximo que conseguia disso nos videogames era com o Yu-Gi-Oh!: Forbidden Memories para o primeiro PlayStation. E mesmo assim, estava longe de ser igual.
Na tentativa de mesclar com o desenho, foram lançados vários títulos – tanto para os consoles quanto para os portáteis -, todos com tantos detalhes e regras que acabava tornando-os enfadonhos e até esquecíveis. Nos tablets, como o local ideal para que o card game se firmasse, continuou com o estigma de jogo quadradão graças à insistência em manter os cenários e o grid para as cartas com dados demais e funcionalidades de menos.
Yu-Gi-Oh!: Duel Links conseguiu remover tudo que atrapalhava, deixando na tela apenas o que é essencial para se jogar, mantendo suas particularidades e dando um toque especial nas animações das cartas. E com o jogo totalmente em português, uniram, enfim, a diversão do jogo remetendo de maneira fiel ao anime.
Por dentro do coração das cartas
As regras básicas do jogo permaneceram as mesmas, com suas fases, cartas de armadilha e magia, cartas de efeito, fusões e invocações, e elas são bem definidas e explicadas dentro do tutorial chamado Escola de Duelo. É esse lugar que faz Yu-Gi-Oh!: Duel Links pegar emprestado o conceito dos combates com o taverneiro de Hearthstone, ensinando de uma forma simples e didática o caminho das pedras para o iniciante e mostrando oportunidades e ideias para o jogador veterano aplicar o que aprendeu.
E essa simplicidade já começa pelo próprio grid das cartas, com apenas três campos para monstros, magia ou armadilha para cada jogador. Isso acaba deixando as batalhas mais rápidas, permitindo que a estratégia no momento em que for montar o deck seja a real responsável por uma vitória ou derrota.
Para criar um deck e montar a estratégia certa, além do baralho padrão, compramos boosters, com itens conquistados no jogo ou dinheiro real, cada um com três cartas. Ou seja, Yu-Gi-Oh!: Duel Links trata-se de um jogo freemium. No entanto, entrega tantas chances de avançar dentro do game, comprar cartas e criar táticas para vencer, que o termo vira quase uma força de expressão.
As opções de qual tipo de duelista o jogador será começa na escolha do “herói” utilizado. Inicialmente com Yami Yugi, no decorrer dos níveis outros personagens vão sendo liberados para o uso, cada um com suas habilidades desbloqueáveis, deck padronizado e cartas características. Essa escolha, porém, limita apenas a habilidade que melhor couber à estratégia do jogador, sendo possível refazer o baralho com as cartas recebidas nos boosters em eventos e em duelos vencidos.
Nessa etapa, caso necessário, o próprio game auxilia o jogador que esteja começando criando um deck com as cartas que o jogador já possui. Entretanto, organiza apenas 2o dessas, deixando para o jogador a escolha de mais dez que preferir – normalmente cartas de magia e armadilha. Dessa forma, é possível se divertir duelando contra os mobs, adversários mais fracos e até nas bases do PVP – ou JxJ conforme a tradução. Evoluindo, assim, o próprio conjunto de maneira natural e até incentivadora.
Eventos, recompensas e rage quit
Da mesma forma que em outros jogos online, para manter a atenção e dar o desafio e a recompensa que o jogador deseja, eventos pontuais são disponibilizados, mudando a perspectiva e trazendo novos ares ao game. Yu-Gi-Oh!: Duel Links já possui o seu primeiro evento, chamado “Welcome to Toon World!”, mostrando o clássico vilão Maximillion Pegasus – que toma uma bela enquadrada do Yami Yugi logo quando chega – como desafiante e futuro personagem debloqueável.
Com quatro níveis de dificuldade e muitos itens, boosters e cartas depois, ele mostra que o desafio do game não fica restrito aos bons jogadores no PVP. Em sua última etapa, Pegasus se transforma no personagem apelativo e infernal do cardgame – bem como no desenho. Com cartas precisas, os embates que já são rápidos por natureza, viram um verdadeiro massacre em fast forward. Um ou outro rage quit pode ocorrer. Assim, apenas com um deck bem pensado, uma dose cavalar de sorte e seja lá o que diabos contenha no coração das cartas, é possível vence-lo.
Uma carta armadilha virada pra baixo
Prosseguir dentro das fases do game, avançar nas partidas ranqueadas no PVP e negociar melhores cartas no Mercador requer tempo e dedicação, que podem ser perdidos devido um problema no início de Yu-Gi-Oh!: Duel Links. É possível jogar normalmente sem o cadastro da Konami ID, porém, se o aplicativo precisar ser reinstalado, todo o percurso vai para o ralo.
Cabe ao jogador, logo na tela inicial, transferir seus dados dentro de uma área específica da Konami e pronto. Dali em diante, estará preparado pra jogar o mais divertido Yu-Gi-Oh! já feito – enquanto eles não criam, na vida real, toda aquela arena do anime, com direito aos hologramas e os efeitos 4D, obviamente.