A Ubisoft não é uma empresa lembrada exatamente pelo ronco dos motores. Apesar de já ter trabalhado com games de corrida em seus tempos como publicadora, ela é muito mais reconhecida pela ação enlouquecida de Far Cry ou pelas mortes furtivas dos personagens de Assassin’s Creed. O anúncio de The Crew, então, deixou muita gente curiosa por, simplesmente, marcar a entrada da companhia em um novo terreno.
Por meio de testes e divulgações na imprensa, aquilo que inicialmente pareceu um título mais simples e com forte apelo social foi ganhando moldes de gente grande. A ideia, aqui, mais uma vez, é dar liberdade total ao jogador, num dos maiores mundos abertos desenvolvidos na história da empresa, e acima de tudo, criar um jogo que não acabaria nunca, nos mesmos moldes dos melhores MMOs do mercado.
A ambição era imensa, e apenas poderia ser alcançada na nova geração de consoles. Por mais que exista uma edição Xbox 360, é nos PCs e aparelhos de nova geração que o jogo brilha e mostra a que veio. Uma proposta extremamente promissora que, como na maioria das coisas que são tentadas pela primeira vez, não atinge esse potencial máximo.
Não é por acaso que a Ubisoft investiu no tamanho do mundo aberto de The Crew como o principal ponto do título – é justamente ele que mais brilha aqui. Aos moldes de outros jogos da série, o game apresenta um cenário gigantesco, cheio de detalhes e com muitas atividades para serem realizadas.
A diferença é que, aqui, em vez de uma ilha fictícia e paradisíaca ou cidades de um passado distante, temos os Estados Unidos do mundo contemporâneo. Claro que não com todas as sua cidades e extensão, porque isso seria simplesmente impossível, mas reduzido a uma escala não menos impressionante, que revela a diversidade, privilegia os diferentes estilos de pilotagem e, acima de tudo, permite uma verdadeira viagem virtual.
Quem já passou por alguns dos locais vistos no título – ou então, assistiu a filmes em que as cidades são um cenário de destaque – com certeza vai reconhecer muito do que é visto em The Crew. Pontos turísticos estão lá, assim como a fauna e a flora locais, além dos estilos arquitetônicos e diferenças regionais. Uma viagem de uma ponta a outra desse país leva cerca de duas horas, tamanha sua extensão. Para ver tudo e visitar todas as cidades então, é melhor preparar a água e o lanchinho, pois você vai passar algumas semanas dirigindo.
The Crew vem com um sistema de progressão e avanço bastante linear. Por mais que seja possível viajar por toda a extensão do país desde o começo do jogo, haverá muito pouco para fazer por lá caso você ainda não esteja em um determinado nível de habilidade.
É nesse caminho entre regiões diferentes dos EUA que os elementos visuais aparecem em grande estilo. É possível conferir, em ação, todos os elementos do clima dinâmico do jogo, desde o nascer do Sol até ele se por no dia seguinte. Nesse meio tempo, temos a luz batendo contra o painel e incomodando os olhos, uma maior quantidade de carros nas autoestradas durante os horários de pico e a aparição de animais nas laterais da pista, fazendo com que o jogador tenha que tomar muito cuidado para não se envolver em um acidente por causa deles. Como em uma situação real, basicamente.
Por outro lado, a arquitetura de mundo aberto e tantos elementos funcionando simultaneamente cobram seu preço. Ao contrário de games como Far Cry 4, que continuam belíssimos mesmo com muita coisa rolando, The Crew diminui a qualidade gráfica em prol do dinamismo do mundo. Além disso, é possível perceber diversas ocorrências de flickering e elementos pipocando aqui e ali, que acabam dando um resultado um pouco mal-acabado ao game.
Mas apesar de tudo isso, não há muito o que fazer nesse mundo aberto e diversificado. É claro, podemos visitar locais turísticos, encontrar torres para liberar o mapa e até localizar peças para abrir carros secretos, mas ao contrário de outras propostas da Ubisoft, The Crew vem com um sistema de progressão e avanço bastante linear. Por mais que seja possível viajar por toda a extensão do país desde o começo do jogo, haverá muito pouco para fazer nas cidades mais distantes caso você ainda não esteja em um determinado nível de habilidade.
A campanha de The Crew te levará por todo o país, sim, mas se você decidir explorá-lo fora dela, terá pouco a fazer a não ser rodar por aí. Desafios de habilidade, por exemplo, exigem que o jogador esteja com uma determinada quantidade de experiência e são inacessíveis de outra maneira. Também, não é possível ganhar pontos desse tipo sem participar das missões do modo campanha ou das tarefas já citadas. Você pode até viajar por aí, mas estará apenas na função de turista caso decida fazer isso.
Absolutamente tudo está ligado à campanha principal, e praticamente não existem side missions. O resultado dessa decisão da Ubisoft é uma jogabilidade que, apesar de se passar em um mundo aberto, é bastante objetiva. Poucas missões da campanha são abertas por vez e o jogador precisa passar obrigatoriamente por elas para liberar novas. E o pior de tudo, assim como em outros títulos da empresa, a liberdade proporcionada por The Crew parece muito mais interessante do que a história que ele se propõe a contar. A diferença é que, aqui, você está completamente preso ao enredo se quiser seguir em frente.
Não é por acaso que a Ubisoft investiu no tamanho do mundo aberto de The Crew como o principal ponto do título – é justamente ele que mais brilha aqui.
Toda a imensidão de The Crew também se estende ao conjunto de carros disponíveis. Temos quase uma centena deles, dos mais diferentes modelos, marcas e, acima de tudo, estilos. Construir uma garagem diversificada é importante para o progresso, uma vez que não será possível usar uma Ferrari em uma prova off-road, enquanto um jipe não terá a mesma potência da terra em uma estrada lisinha.
Mais do que veículos para todos os gostos, o game também traz peças e opções de personalização para adaptar a pilotagem ao estilo e habilidade de cada jogador. E aqui, elas são muitas, pois praticamente todos os desafios de habilidade, missões e qualquer outra ação realizada no game dão direito a partes obtidas de acordo com o progresso e permitem uma customização completa das máquinas em termos visuais e de performance.
Apesar de falar em escapamentos, rodas diferentes, componentes de motor e outras peças, The Crew passa longe de ser um simulador. Muito pelo contrário, as alterações no veículo são mostradas por um sistema simples. Ao ganhar uma peça, você descobre com poucas palavras o que ela é capaz de fazer e, pelos números, conhece exatamente como aquela parte terá impacto no veículo em uso. Se decidir utilizá-la, ela é instalada automaticamente, tudo sem que você precise interromper e pilotagem para ir até a garagem e lidar com gráficos e coisas do tipo.
O conjunto de carros também incentiva a viagem pelos Estados Unidos. Concessionárias de diversos pontos do país possuem diferentes tipos de carro, e a liberação de cada território dá direito a novas máquinas que, caso você possua o dinheiro, podem ser adicionadas a seu inventário. E falando nas moedas, quem quiser acelerar a progressão pode investir também grana de verdade em The Crew, comprando por preços diferentes carros que, de outras maneiras, levariam algumas horas para serem liberados.
Apesar disso, o sistema de monetização não se mostra agressivo e, mesmo nas partidas online, o balanceamento é bem feito. Você não irá ser prejudicado por aquele seu amigo riquinho que tem dinheiro a rodo, enquanto você ainda está nos estágios iniciais do game. The Crew vai cuidar de te colocar lado a lado com pilotos de uma mesma categoria, de forma a criar uma experiência justa e progressiva.
The Crew deixa clara mais uma característica que também está se tornando uma marca da Ubisoft: existe sempre algo a melhorar no primeiro episódio de uma nova franquia.
Falando em modo online, ao contrário do que se esperava, tudo está funcionando bem. Neste jogo, mais do que nunca, era essencial que a experiência conectada aparecesse livre de problemas e falhas, e a Ubisoft obteve sucesso nessa empreitada que, infelizmente, é cada vez mais incomum na indústria atual. Testamos The Crew intensamente durante sua primeira semana de lançamento e foram esporádicas as quedas de conexão ou problemas relacionados a essa parte do game.
Esse, inclusive, era um resultado mais do que esperado. O modo online é o terceiro pilar deste jogo e, inclusive, o responsável por dar o título a ele. Em The Crew, é totalmente possível correr e vencer sozinho, mas montar equipes e disputar ao lado de outros jogadores no modo cooperativo torna a experiência muito mais rica e vantajosa para todo mundo.
A todo momento, é possível encontrar jogadores conectados passeando pelo mundo. Ao entrar em missões, é possível criar equipes com os amigos ou membros aleatórios da comunidade de maneira rápida, com os sistemas do próprio game cuidado de todo o trabalho. É nesse segundo quesito que algumas falhas acontecem e, muitas vezes, o jogo tem dificuldade em contrar jogadores próximos. Mas, na maioria das vezes, tudo funciona bem e as conexões acontecem sem instabilidades. Essa dificuldade para se conectar com estranhos, aliás, é um problema recorrente em qualquer jogo da Ubisoft, e algo a que a empresa deveria dar mais atenção.
Além das mecânicas de mundo aberto e do sandbox gigantesco, The Crew deixa clara mais uma característica que também está se tornando uma marca da Ubisoft, só que de maneira não muito lisongeira: existe sempre algo a melhorar no primeiro episódio de uma nova franquia. Em The Crew, assim como foi com Watch Dogs e Assassin’s Creed, existe muito espaço para melhorar e, acima de tudo, fica claro quais são exatamente os pontos que precisam de um pouco mais de trabalho.
Levando em conta que seu único título de corrida é Trials, não necessariamente uma série de jogos de velocidade, o saldo é positivo. The Crew marca a estreia da Ubisoft no mundo dos motores de forma extremamente positiva e, acima de tudo, firma os pés em um terreno que, no futuro, deve nos render jogos bastante interessantes. A promessa é grande e o espaço para explorar, assim como o próprio mapa dos Estados Unidos visto aqui, é gigantesco. Resta apenas que os responsáveis consigam chegar lá, com os acertos corretos para o desafio que estão prestes a enfrentar.
The Crew foi analisado no PlayStation 4.