Ao lado da série Civilization no que é referente a “aulas de história”, a série Assassin’s Creed sempre se destacou ao tornar interessante o que os livros da escola podem vir a apresentar de forma maçante. Claro que liberdades poéticas são propositalmente tomadas para tornar a experiência mais agradável e divertida, porém, a informação histórica está lá para aqueles que quiserem ir além do jogo.
De fato, quanto mais próximo da realidade, mais difícil é transformar acontecimentos reais em aventuras épicas, vide os decepcionantes Assassin’s Creed 3 e Unity, com suas premissas históricas riquíssimas, mas que não conseguiram capturar a audiência pela falta de, ao meu ver, elementos fantásticos.
E é nesse ponto que a série Assassin’s Creed, ao se reinventar no jogo anterior com a temática egípcia, consegue com Odyssey elevar a barra novamente, abraçando tanto um período histórico repleto de significado na evolução da sociedade como também se valendo de lendas e mitos fantásticos que servem de pano de fundo para a aventura do jogador. Bem vindo à sua própria odisseia!
Descendentes do lendário rei Leônidas de Esparta, os protagonistas de nossa odisseia são Alexios e Kassandra, ambos com personalidade forte e independente graças às adversidades que enfrentaram desde muito cedo, seja na primeira infância, com sua família na terra natal, sendo criados em uma sociedade amplamente militarizada; seja na vida posterior à tragédia que se abateu bem cedo em suas vidas.
Sendo agraciados pelos deuses, como alguns próximos a eles dizem, os irmãos tem uma conexão com a águia batizada de Ikaros (recurso de jogabilidade introduzido no game anterior), que auxilia na observação dos arredores e busca por inimigos. Graças à sua linhagem, eles ainda são portadores da poderosa “Lança de Leônidas”, uma relíquia dotada de poderes que desafiam a compreensão, concedendo ao seus portadores a força e a fúria do lendário rei espartano.
Ao optarmos por Alexios ou Kassandra no início do jogo, escolhemos não apenas o gênero do nosso avatar dentro da trama, mas também o ponto de vista pelo qual queremos viver a experiência, uma vez que são personagens independentes, com suas próprias jornadas. Ambos têm um papel importante a desempenhar no mundo do jogo, introduzindo assim algo inédito na franquia.
Odyssey é o ponto mais alto da série Assassin’s Creed, e muito mais uma origem que seu antecessor, revitalizando o mundo dos assassinos encapuzados e entregando uma verdadeira aventura épica.
Não importando qual dos irmãos escolhemos, já de inicio, somos tirados de nosso lugar comum quando mercenários tentam cobrar do protagonista uma divida que não lhe diz respeito, mas sim ao homem quem lhe deu abrigo desde quando nosso herói ou heroína foi separado de sua família. A partir daí, uma série de acontecimentos nos jogam em uma rede intrincada tramas de interesses sombrios, assassinatos, influências religiosas, políticas e financeiras.
Quanto mais exploramos o mundo ao nosso redor, a construção da trama e a importância que damos às demandas daquela jornada vão se tornado interessantes, nos mantendo engajados do início ao fim da história. Esse fator é uma lição aprendida pelos desenvolvedores, como resultado direto da falta de empatia que os jogadores tiveram com o protagonista do título anterior.
Seguindo a remodelagem feita por Assassin’s Creed Origins, o combate de Odyssey é fácil de se apreciar e bastante desafiador de dominar. O jogador tem à disposição espadas, maças, lâminas duplas e lanças, além do arca e flechas, com cada arma possuindo um set de movimentos específicos, se adaptando melhor tanto ao jogador quanto com as situações de combate intenso ou aos momentos de furtividade.
Atributos podem ser adicionados às armas, seja em ferreiros encontrados nos grandes centros urbanos ou acampamentos de guerra, ou por meio da árvore de evolução do personagem, onde os pontos de evolução podem ser distribuídos quantas for necessário até se obter a combinação de atributos ideais para cada situação. Tudo funciona da forma que o jogador bem entender, uma excelente forma de não o frustar.
O jogo conta com um novo elemento de interação na trama, chamado de “Batalhas de Conquista”, onde, após cumprir certas missões paralelas, como destruir um estoque de suprimentos, assassinar comandantes ou sabotar o arsenal de um dos exércitos envolvidos na trama, escolhemos lados para participar de uma batalha campal bastante desafiadora. Apesar desse desafio ser divertido, não é para todos, por isso, participar destes combates e conquistar seus itens bônus são completamente opcionais.
As cidades estão muito bem representadas, levando em conta o imaginário popular da época. À noite ou em plena luz do dia, sempre existirá ao seu redor uma paisagem de tirar o fôlego.
Assim como nosso personagem é um mercenário, com seus próprios objetivos, mas, ainda assim, trabalhando para quem melhor lhe pagar, uma outra novidade que adiciona um caráter de urgência ao jogo é a existência de uma vasta casta de guerreiros de aluguel que também estão trabalhando por dinheiro. Muitos deles, inclusive, estão atrás de sua cabeça em uma bandeja, com a localização deles ficando visível no mapa.
Essa proximidade com outros guerreiros torna qualquer missão uma tarefa muito mais tensa, pois existem dois caminhos possíveis: enfrentar nosso nemesis ou fugir e buscar informações sobre quem está pagando pela morte do protagonista. Uma vez identificado o contratante, basta pagar pela vida ou executar o mandante, com a escolha ficando nas mãos do jogador, que sempre precisa ter em mente que a caçada e o preço pela podem aumentar muito dependendo da escolha.
Odyssey não tenta esconder suas fontes de inspiração, seja para a jogabilidade, história, gráficos, a forma como o jogo se desenvolve e como seu mundo é estruturado. The Witcher 3, Dark Souls, God of War e a própria série Assassin’s Creed são claramente referenciadas, propositalmente ou não, como exemplos de aprendizado para a construção do game.
Do anterior, podemos notar a expansão da linha que conduz a trama principal, que é a existência de uma organização secreta manipulando politicamente os acontecimentos que guiam a sociedade da época, bem como também o retorno dos combates navais originados em Black Flag.
A politica é muito presente em todos os momentos da trama de Odyssey e o jogo acerta ao mesclar a mitologia da série, bem como os mitos gregos, a fim de criar motivações e panos de fundo interessantíssimos, que vão manter o jogador curioso no início ao fim. Épico é a palavra que emoldura o jogo como um todo e onde esse aspecto mais se destaca a primeira vista é na parte gráfica e trilha sonora.
As cidades estão muito bem representadas, levando em conta o imaginário popular da época, ficam ainda mais impressionantes com suas estátuas e construções gigantescas, dramaticamente iluminadas dentro do sistema de clima dinâmico do jogo. Seja à noite ou em plena luz do dia, sempre existirá ao seu redor uma paisagem de tirar o fôlego, ainda mais com a trilha de fazer inveja a muitas produções cinematográficas. Um dos jogos mais belos artisticamente, e dramaticamente, que já foram produzidos.
Sem estragar a experiência, é possível se dizer que Odyssey é muito mais uma origem para a franquia que o jogo anterior, que levava Origins no nome. Dito isso, também é possível afirmar que o DLC já lançado, “O Legado da Primeira Lâmina”, é tudo que um fã da série poderia querer em termos de preencher lacunas e amarrar pontas que foram ficam soltas ao longo dos anos. E isso só na primeira parte.
O título é, sem dúvida o ponto mais alto da série Assassin’s Creed, demonstrando que mesmo sem inovar no mundo dos games como um todo, foi capaz de aglutinar de forma coesa muito do que outros jogos fizeram com excelência, revitalizando assim o mundo dos assassinos encapuzados e entregando uma verdadeira aventura épica. Imperdível!
O jogo foi analisado no PlayStation 4 em cópia cedida pela Ubisoft.