Eu não gosto dos jogos da Telltale. Essa, inclusive, não é a primeira vez que falo disso aqui no site. A empresa conquistou a todos com The Walking Dead e seu sistema de decisões que parece trazer diferentes desdobramentos para a história, tornando a experiência diferente para cada um, apesar de essa não ser, exatamente, a realidade. A série de zumbis, entretanto, também não me agrada, o que fez com que os títulos baseados nela não me chamassem a atenção.
O que The Walking Dead fez com boa parte dos que, hoje, são fãs da empresa, Batman: The Telltale Series fez comigo. E se, até agora, os capítulos dessa história mostravam todo potencial, o último, “Cidade de Luz”, foi responsável pelo convencimento. É claro, ainda há muito o que melhorar, e o game é como um Porshe com motor de Fusca. O legado, entretanto, é grande, tanto para a desenvolvedora em si, como para a trama do Morcego.
Logo de começo, já percebemos, finalmente, mudanças importantes no andamento da história, geradas por escolhas anteriores. Até o quarto capítulo, as opções de falas e decisões liberavam nada mais do que cenas novas com o mesmo desenrolar. Agora, entretanto, o caminho tomado ao final do episódio anterior influencia de forma completa o season finale, quase a ponto de termos dois capítulos distintos.
Contando com sua experiência em termos de storytelling, a Telltale cria um ensejo bastante tenso e movimentado, que deixará o jogador ligado durante a hora e meia de duração do capítulo.
Nem tudo se modifica, e atos importantes como a morte de um personagem continuam a acontecer de maneira similar. Os desafios, entretanto, são maiores, assim como a profundidade dada à trama dos protagonistas. Aqui, pela primeira vez, percebemos que, efetivamente, vale a pena jogar o game novamente, fazendo escolhas diferentes para ver o que acontece.
Essa sensação se torna ainda mais forte quando pensamentos na temporada seguinte, uma vez que, aqui, podemos alterar de forma bastante profunda a relação entre alguns protagonistas – a expectativa é que isso tenha influências reais no futuro, apesar de a tradição nos apontar o contrário, assim como a presença, ainda incômoda, de algumas cenas que deixam claro qual o caminho “certo” a ser seguido.
“Cidade de Luz” também é o capítulo com o ritmo mais acelerado de todos. Como já dito antes, todo o mote da série se trata de um ataque direto à figura de Bruce Wayne que nem mesmo o Batman parecia capaz de impedir. Seja por decisões inteligentes do milionário ou pelo fato de os vilões subestimarem o herói, estamos agora em uma posição na qual o Morcego, finalmente, pode agir com toda sua habilidade.
Em uma Gotham City sitiada, a diplomacia exibida pelo empresário parece não ser mais uma solução, apesar de se tornar providencial em alguns momentos. Por outro lado, os punhos pesados e o equipamento de alta tecnologia se tornam a única opção possível quando o último golpe, e aparentemente, o mais dolorido, é desferido por Lady Arkham em sua cartada final. O que se vê é uma série de cenas de ação quase ininterrupta.
Contando com sua experiência em termos de storytelling, a Telltale cria um ensejo bastante tenso e movimentado, que deixará o jogador ligado durante a hora e meia de duração do capítulo. É claro, Batman: The Telltale Series ainda é bastante leniente com relação a erros nos quick time events, mas isso, pela primeira vez, é compensado com um senso de urgência que fará qualquer erro parecer fatal, mesmo não sendo.
Quebras nessa seriedade e tensão, entretanto, aparecem na forma de bugs e falhas de carregamento que, infelizmente, também foram nossos companheiros durante toda a aventura. Como um gato que entra no gramado durante um jogo de futebol, ver um personagem não carregado, apenas com os olhos e uma dentadura flutuantes na tela, durante uma cena de combate, é capaz de cortar o clima tão bem construído pela Telltale.
O jogo traz sinais graves de que o ritmo acelerado de lançamentos está deixando sua marca sobre a qualidade.
E esse é apenas um dos problemas decorrentes da falta de otimização e cuidado da empresa com o game. Possivelmente devido a um desenvolvimento claramente acelerado, causado pela aproximação do fim do ano, “Cidade de Luz” aparece como um dos episódios mais cheios de falhas de toda a série.
Retornam os problemas de tradução que colocam legendas em inglês no lugar daquelas em português, com erros e momentos em que os subtítulos simplesmente não aparecem, deixando os jogadores sem saber o que está acontecendo. As quedas na taxa de quadros por segundo retornam com frequência e, pelo menos na versão PS4, é possível ver, em alguns momentos, indicações de comandos referentes às versões PC e Xbox One.
Mais do que uma engine que está datada já há alguns anos, Batman: The Telltale Series traz sinais graves de que o ritmo acelerado de lançamentos está deixando sua marca sobre a qualidade. Ao se transformar em uma verdadeira padaria de jogos, com títulos lançados um após o outro, a produtora parece estar deixando o cuidado e o polimento de lado, um fator que, no futuro, pode acabar minando um bocado do trabalho feito até aqui.
Felizmente, isso ainda não acontece aqui, mas somente porque a história construída é forte o suficiente para se sobressair. Mesmo com um gancho previsível, o final da temporada é suficiente para que o jogador fique ansioso pela segunda temporada. Afinal de contas, o que temos agora é um Batman amadurecido e reconhecido como um herói. Do outro lado, um de seus principais inimigos, livre, solto e com um plano.
O jogo foi analisado no PlayStation 4.