Bleeding Edge

por Caio Vicentini

Potencial pouco explorado

Bleeding Edge é a primeira empreitada da Ninja Theory desde que foi adquirida pela Microsoft (ostentando até o logo da Xbox Game Studios na abertura), como também a primeira vez que a empresa trabalha em uma experiência multiplayer, criando um combate competente e com personagens criativos. Por outro lado, há um tropeço nos detalhes e a quantidade pequena de conteúdo, que poderia levar a experiência à um patamar superior.

O brawler competitivo é o total oposto do último trabalho da desenvolvedora, Hellblade: Senua’s Sacrifice, se afastando do clima sombrio e dando espaço para cenários coloridos e vibrantes povoados por personagens com características muito distintas um do outro. A quantidade de heróis disponíveis é um pouco escassa, considerando que um dos atrativos do gênero são as diversas composições possíveis de personagens.

A falta de opções acaba transformando as partidas em ciclos repetitivos e previsíveis, pelo menos no primeiro mês do jogo. Felizmente, os desenvolvedores parecem ter noção disso, pois Mekko, um golfinho no comando de um traje robótico de quatro patas, já é o primeiro conteúdo pós lançamento planejado.

Em combates de 5 contra 5, nos quais é incentivado que pelo menos um membro seja suporte e outro um tanque, os modos de jogo principais variam entre dominar a maior quantidade de partes específicas do mapa ou coletar células de energia espalhadas por ele. Ao contrário de jogos como Overwatch ou Paladins, nas quais os cenários estão atrelados aos objetivos, como um específico para escolta de carga ou dominação de objetivo, em Bleeding Edge, eles podem funcionar para ambos os modos. Alguns são versáteis e funcionam bem em ambas as dinâmicas, enquanto outros favorecem uma experiência mais divertida em uma modalidade do que na outra.

Ambos são divertidos, com o modo de coleta de energia sendo um pouco mais emocionante, com a ideia de que é preciso ficar de olho nas células que seu time carrega, evitando que um aliado tenha sua carga roubada pelos adversários, como também prestar atenção para uma oportunidade de fazer o mesmo.  Ainda assim, seria interessante se no futuro fossem adicionados novas modalidades de jogo, pois, como outras coisas já mencionadas aqui, a falta de variedade pode cansar rapidamente.

Muito mais

Falar que Bleeding Edge se resume a esmagar botões é negar o cuidado que a Ninja Theory teve na criação de cada personagem. Primeiramente, cada um se comporta de maneira diferente e tem um uso mais adequado para cada situação. Personagens como Daemon são frágeis no combate direto e franco, sendo muito mais efetivo flanqueando os suportes com ataques rápidos, e usando suas habilidades para fugir de cena quando as coisas começam a complicar; já Makutu, um gigante corpulento, pode isolar facilmente inimigos da equipe com sua investida, quebrando formações e encarando vários adversários ao mesmo tempo, graças à sua resistência elevada. Nenhum personagem funciona perfeitamente em todos os casos, o que torna a troca de personagens durante as partidas essencial para se adaptar às mudanças do campo de batalha.

Um aspecto interessante é o fator estratégico de montar uma build para se encaixar melhor ao seu estilo de jogo. Semelhante ao que é visto em MOBAs, é possível destravar melhorias para aspectos específicos do personagem. Esses upgrades vão desde aumentar a duração dos movimentos especiais ou o dano dos ataques básicos até a velocidade de movimento. O jogo providencia uma build pronta para cada personagem, caso você não queira se embrenhar nessa parte mais técnica, mas que vale muito a pena para quem deseja se aventurar no meta game do que é o mais efetivo durante das partidas.

Não apenas nas builds, mas a sinergia das habilidades entre os heróis adicionam outra camada de estratégia necessária para tirar o que há de melhor no seu time. Heróis como Maeve e Nidhoggr têm habilidades capazes de manter adversários presos em uma posição, perfeitos para personagens como Daemon usarem sua habilidade especial e causar um grande estrago no inimigo. Essas combinações entre personagens, vista frequentemente em jogos como Overwatch, acaba se perdendo um pouco por não haver muita comunicação entre jogadores.

Em quase todas as partidas, não havia pessoas no chat de voz para tentar coordenar algum combo entre os heróis. Isso obviamente não é culpa do jogo, mas também não existe uma alternativa rápida de comunicar esse tipo de informação, como é encontrado no jogo da Blizzard, por exemplo.

O problema ainda se estende na carência de alguns feedbacks que são normalmente encontrados em outros títulos, de forma que todos fiquem cientes do que acontece durante a partida. Avisos como a iminência de que o adversário está prestes a ganhar a partida, ou que um item de valor está disponível no mapa, por exemplo, parecem coisas pequenas, mas ajudam a dar um rumo de urgência na partida. Sem elas, o risco é cair em um marasmo que pode arrastar a rodada indefinidamente, já que o final está atrelado quem cumprir o objetivo pedido primeiro.

Chega a ser frustrante o quão perto Bleeding Edge está de ser um excelente jogo. Os elementos mais importantes como o combate e a capacidade de se aprofundar num meta game através de composições e builds estão lá, mas as partidas dependem demais do investimento dos jogadores em cumprir o que é pedido, sem feedback suficiente para fazê-los ir atrás dos objetivos, ou pelo menos não ficarem matando indefinidamente os adversários.

Com a chegada de Warzone, o Battle Royale gratuito de Call of Duty, e o iminente lançamento de Valorant, empreitada da Riot no mundo dos FPS, a nova IP da Ninja Theory tem um páreo duro para ganhar seu espaço no cenário competitivo de jogos online. Com um pouco mais de atenção na melhoria da qualidade de experiência do jogador e adições constantes de novos conteúdos, talvez o jogo alce voo e alcance o seu potencial pleno.

O jogo foi analisado no PC, em cópia cedida pela Microsoft.