A opressão e a angústia são marcas registradas do Survival Horror. Em clássicos como Resident Evil, Silent Hill e tantos outros, o que assusta não é apenas algo saltando na tela ou o fato de estarmos diante de criaturas do inferno, mas sim, a sensação de estarmos despreparados e sem saber o que vem a seguir. Com ângulos de câmera, gerenciamento de itens ou poderes, são diversas as formas que os criadores do passado — e por que não, do presente — usaram para nos aterrorizar.
Dawn of Fear bebe da fonte mais antiga de todas, a dos Survival Horrors de meados dos anos 1990, para trazer de volta um estilo que há muito havia sido deixado de lado e, agora, parece dar sinais de retorno. Como tantos outros títulos que se focam demais na forma, este também acaba caindo na velha armadilha de olhar demais para o passado e esquecer do básico que torna um game interessante.
Estamos falando de um jogo independente e, mais do que isso, de um estúdio iniciante, a Brok3nsite, escolhido pela Sony entre diferentes candidatos da Espanha para um programa de fomento e distribuição exclusiva no PS4. Sendo assim, poderíamos até desculpar a falta de dublagem e a fonte padrão usada para contar a história, bem como a falta de escala que faz com que o personagem principal seja da altura da maçaneta das portas.
Não é possível que Dawn of Fear tenha sido testado e aprovado, pois possui falhas tão claras e uma ausência completa de polimento. As poucas qualidades ficam totalmente de lado quando você precisa recomeçar o game por causa de um bug.
Poderíamos relevar também a forma estranha com a qual os diálogos são apresentados — é a primeira vez que notamos um game que apresenta falta de sincronia com falas escritas —, os erros de digitação e grafia ou os indicadores esquisitos de itens na tela, que por vezes brilham, e outras estão camuflados no cenário. Até mesmo a falta de sutileza e a linearidade de um cenário que parece oferecer muito, mas entrega um caminho que apenas nos leva de A a B poderia ser entendido quando falamos de um estúdio que ainda dá seus primeiros passos.
Chegar à sutileza de um Resident Evil ou às brincadeiras com diferentes realidades de Silent Hill é difícil, mas a produtora até acerta em alguns momentos. É um fator de tensão, por exemplo, ouvirmos os sons dos zumbis em uma sala antes mesmo de nos encontrarmos com ele, com o jogador sabendo que um combate está por vir e contando uma munição inteligentemente escassa.
Mas uma coisa não dá para deixar de lado: Dawn of Fear é simplesmente injogável. E esse aspecto, sozinho, acaba invalidando todas as outras poucas qualidades de um game que chama mais a atenção em sua teoria do que quando é efetivamente experimentado.
E aqui não estamos falando da movimentação travada, dos prompts de interação com elementos do ambiente ou dos tiros que não atingem o inimigo, mesmo que disparados corretamente. Este é daqueles games que fazem você ter que começar tudo do início pois um item simplesmente sumiu durante a resolução de um enigma essencial para seguir adiante.
Aconteceu diversas vezes em nosso processo de análise e, inclusive, foi registrado em nosso gameplay ao vivo. A falta de polimento de Dawn of Fear é tão extrema que somos obrigados a utilizar ao máximo o limitado sistema de saves, gravando o progresso a cada passo pois, nunca se sabe, uma chave pode sumir do inventário ou uma peça pode simplesmente desaparecer ao ser utilizada.
Aos moldes dos antigos Survival Horrors, este também é um título em que só há uma vida e onde game over significa exatamente o que a frase quer dizer. Só que não é nada legal usar itens de cura e ver os criativos indicadores de vida, que funcionam por meio dos rasgos e manchas de sangue no inventário, recuperados, apenas para morrer com um único golpe de um oponente porque o jogo decidiu que, não, aquela cura não seria registrada.
São problemas que acontecem o tempo todo e muito mais do que deveriam, transformando uma experiência de poucas horas, que poderia ser até prazerosa, ainda que truncada, em um pesadelo pelos piores motivos possíveis. Você vai levar dias para terminar Dawn of Fear, não pelo desafio ou pelos cenários interessantes, com muitos elementos, ainda que pouco interativos, e até bonitos, mas pelo fato de ter vontade de mastigar o controle toda vez que se vê obrigado a resetar ou voltar a um save por causa de um bug.
É impossível dizer que este é um título no qual faltou polimento, pois este é um em que o processo de verificação e testes parece não ter existido. Com falhas tão claras, uma movimentação atravancada e quedas de frame rate até quando nada está acontecendo, qualquer controle de qualidade, por mais leniente, reprovaria Dawn of Fear. Mas não, ele foi lançado e, inclusive, custa caro.
Os jogos de terror voltaram, sim, com muitos abandonando o casamento abusivo com a jogabilidade de ação. Aos poucos, a nostalgia noventista e o Survival Horror também começam a mostrar sinais de retorno, mas Dawn of Fear, definitivamente, não é o tipo de game que trará o velho estilo a uma nova era. Muito pelo contrário, inclusive.
O jogo foi testado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Brok3nsite.