Antes que você corra para os comentários com xingamentos à minha pessoa, acredite, eu também estou impressionado com isso. Como fiquei durante todo o tempo que passei assistindo a “Dead Rising: Watchtower” neste final de semana, uma produção original do Crackle que, por algum bizarro acordo de licenciamento, deu as caras recentemente no Netflix nacional.
Era um filme que eu já ensaiava assistir há tempos, mas a perspectiva de perder tempo com algo medíocre impedia até mesmo que eu fosse procurar por ele. Mas ali estava ele, bastava um clique, e foi. E talvez, justamente por não esperar absolutamente nada, eu acabei gostando bastante do que vi. “Dead Rising: Watchtower” não é um ótimo filme. Mas quando se leva em conta o que temos em termos de adaptações de games, ele acaba sendo o melhor, o que mostra o quão ruim estamos nesse segmento.
https://www.youtube.com/watch?v=VL9zrnD1NeM
A produção, acima de tudo, faz a lição de casa, e parte de um pressuposto que gosto bastante. Em vez de tentar levar para as telas aquilo que a gente já cansou de ver nos jogos, o longa conta uma história auxiliar, passada em algum momento indefinido entre o segundo e terceiro jogos da franquia. Os desastres de Willamete e Fortune City aconteceram e o mundo convive com a ameaça zumbi de forma quase apática, com os infectados tomando doses diárias de Zombrex, o remédio que impede que eles se transformem em mortos-vivos.
A desgraça começa a acontecer em East City quando o vírus, aparentemente, se torna forte demais para o medicamento. E no meio disso tudo está Chase Carter, um repórter que quer mais do que tudo se tornar o novo Frank West, cobrindo de perto um desastre desmorto. A história é clichê, e é claro que, no caminho, ele vai dar de cara com os rostos e tragédias que compõem esse tipo de situação, tendo uma mudança de atitude para se transformar em um herói.
Mas se a trama não traz nada de novo ao gênero nem compõe um filme de terror daqueles maravilhosos, é no quesito adaptação que “Watchtower” acaba reinando. Parece que todo mundo ali fez a lição de casa, desde o roteirista Tim Carter até o diretor Zach Lipovsky, passando pelos departamentos de arte.
O que temos aqui é uma reprodução bastante fiel dos jogos. Isso se traduz em absolutamente qualquer coisa sendo transformada em armas, a criação de engenhocas insanas com lâminas, eletricidade e explosivos, gangues esquisitas que parecem terem saído dos anos 80 e até mesmo um contador que, apesar de não ser em tempo real, dá a noção de que as coisas terão um fim logo menos.
Uma mistura completamente idiota para quem não conhece a franquia, encarada como se fosse a coisa mais normal do mundo pelos protagonistas. E uma adaptação que vai além de, simplesmente, atores usando cosplays de personagens em cenas iguais às dos jogos, como normalmente se vê por aí. As referências não são descaradas, há elementos escondidos aqui e ali e o todo tem aquele cheiro meio bizarro e divertido de Dead Rising.
Os atores não trazem nada demais, e inclusive, temos vários clichês em termos de personagens e seleções de papeis. Isso, por outro lado, faz com que o destaque seja todo dado ao próprio Frank West, que sentado na cadeira de comentarista de um telejornal, tem as melhores sacadas do filme. Rob Riggle mostra que entendeu o personagem e, mesmo não sendo tão parecido com ele, faz com que a gente o enxergue em sua interpretação.
A tradição de termos filmes baseados em jogos sempre muito ruins levou a uma série de mudanças nesse mercado, com empresas como a Blizzard (World of Warcraft), Ubisoft (Assassin’s Creed) e Naughty Dog (The Last of Us) estando envolvidas diretamente na produção de adaptações. “Dead Rising: Watchtower”, entretanto, é uma relíquia de um passado em que os direitos simplesmente eram vendidos e as empresas mandavam um “façam aí” para as produtoras.
Apesar disso, se comporta como se fosse dessa segunda leva, e levando em conta a minha insatisfação atual com a Capcom, me faz pensar que o filme é até melhor do que se a companhia tivesse dado seus pitacos. É uma pena, entretanto, que ele não tenha tanto destaque justamente por causa da sequência de lixos e absurdos que o sucederam.
“Dead Rising: Watchtower” não é ótimo, mas é daqueles filmes que merecem sua atenção, principalmente se você se divertiu com os títulos da franquia. No Brasil, o longa está disponível no Netflix e YouTube, além de ter sido lançado em Blu-ray e DVD. Uma sequência já está nos planos e deve sair ainda neste ano, com o subtítulo “Endgame” e uma personagem chamada Jill, interpretada por Jessica Harmon. Isso não pode ser uma coincidência…
E não, não acho “Terror em Silent Hill” um filme bom, apesar de ser bem fiel em alguns conceitos e no clima do jogo.