No meio da década de 1990, chegava ao Brasil pelo SBT, no meio de um pacotão de anime, vários protagonistas de cabelos espetados, com muita fome e capacidade de disparar rajadas das mãos. Dentre eles estava o que inspirou os seguintes: Dragon Ball, onde um menino caipira inocente com cauda fazia os brasileiros conhecerem, oficialmente, o que o fenômeno japonês de animação podia fazer na infância de uma geração.
Para quem já jogava videogame, a série já havia se apresentado obscuramente em jogos de luta e RPGs difíceis, mas os grandes combates que atiçavam a garotada por mais farão com que Dragon Ball Z: Kakarot seja o mais lembrado no futuro.
Antes de falarmos do jogo, é preciso entender o porque de tantas reações dos fãs sobre este novo título, que já tem mais jogos do que episódios lançados, passando por quase todas as plataformas, portáteis, computadores, mídia escrita, animação, filme (ergh!) e os audiobooks que podem ser novidades aqui no Ocidente, mas no Japão, são idolatrados há décadas. Eles viraram séries e, seus dubladores, tão famosos quanto os personagens a que deram vida.
Dragon Ball Z: Kakarot é a homenagem definitiva a esta franquia que não parece ter hora para acabar e reúne, na mesma emoção, várias gerações de fãs.
No começo dos anos 2000, chegava o mangá Dragon Ball, com ambas as sagas ao mesmo tempo, e o sucesso foi tão imenso que as emissoras disputavam quem iria transmitir aquelas centenas de episódios com muita pancadaria. Nada deteria a grande onda, que tomou conta de todo o mercado infantil e se alinhou com o resto do mundo, ainda mais com a popularização da internet.
Os fãs se uniam e os eventos de anime traziam os cantores originais como atração principal, com muita gente ficando até o fim para escutar Hironobu Kageyama cantar “Chala Head Chala” e “We Gotta Power”, arrepiando todos os tipos de pelos já catalogados pela ciência.
36 anos depois de Goku encontrar Bulma na estradinha de terra de sua casa, chegamos a esta homenagem que vai passar por muitas sagas, vilas, pessoas e gerações de crianças, jovens, adultos e claro, os tiozões!
Dragon Ball Z: Kakarot, como todo o jogo que é uma referência clássica ao anime, traz os efeitos sonoros, trilha sonora e aspecto gráfico da TV, com as devidas censuras. Elas são baseadas na versão Kai, que cortou os fillers do anime, mas como em todo bom RPG, inclui as side quests nas quais personagens do passado irão solicitar missões para conseguir itens raros, experiência, Esferas de Poder e as fichas de personagens, o que as torna tão úteis.
Assim, todas as sagas se juntam na série Z, e da chegada de Raditz em diante, vamos acompanhar os desdobramentos de forma interativa, preenchendo lacunas de forma inteligente e evitando que certos trechos passem em branco ou de forma não-aproveitada.
Kakarot (Kakaroto!) é o nome de nascença do pequeno Saiyajin que foi enviado para o planeta Terra por ter sido considerado fraco demais pelos especialistas bélicos de Vegeta, um local focado em vender mão-de-obra de combate para quem pagar mais, mas estava sob domínio da máfia espacial da família do Rei Cold.
Seu filho Freeza era o responsável por esse setor e, antevendo uma revolta liderada pelo pai do protagonista, e vendo que a lenda do Super SaiyaJin poderia ser verdade, eliminou o planeta todo com uma imensa bola destrutiva. Somente aqueles que estavam fora sobreviveram: Raditz, Vegeta, Nappa e Kakarot. É a partir daí que a saga se inicia, com o nome inicial de Goku trazendo todo seu passado trágico e relações familiares destruídas, esquecidas por uma amnésia acidental.
Como citado antes, o novo game é uma homenagem ao fã e à série, e por isso, tudo vai simular um episódio clássico. Quem assistiu vai tirar de letra o que deve ser feito, mas mesmo assim, o jogo é bem fácil de entender, com uma comunicação intuitiva, principalmente para quem já jogou Final Fantasy XV, com quem Dragon Ball Z: Kakarot compartilha a estrutura de gameplay. Você navega voando, pode marcar no mapa os objetivos com ícones, acampa para recuperar energias, pesca em pequenos atracadouros, reúne ingredientes para cozinhar e ter bônus temporários, pega missões de combate e reporta ao solicitante, só falta chamar a Nuvem Dourada de Regalia, não é mesmo?
A falta de equilíbrio traz missões extremamente fáceis e inimigos totalmente descabidos. O jogo pune a desatenção, fazendo você cair em combates sem saída contra máquinas assassinas de combate.
O jogo possui muitos comandos, em mapa e durante a luta, mas nada em excesso. Isso é até esperado, pois a intenção é fazer o jogador se sentir um SaiyaJin. Pode-se rastrear pessoas, frutas e animais pelo KI, voar em alta velocidade, explorar os terrenos mais atípicos andando, pulando, voando, fazer manobras de vôo e disparando magias para abater torres, dinossauros e caçar. Já em combate, os comandos são esquiva, ataque físico, magia e aumento de força.
É preciso ficar de olho no KI, pois tudo o gasta, no mapa ou nos combates, e é somente em luta que se pode utilizar os super golpes clássicos de cada personagem, com seus próprios gastos de energia, tempo de disparo, efeitos e tudo mais. Novamente lembrando Final Fantasy XV, é possível chamar os amigos para um super ataque auxiliar e evoluir suas habilidades numa árvore de técnicas. Como não existem muitas técnicas diferentes no universo DBZ, o game traz vários tipos de aprimoramentos e alguns golpes que só desbloqueiam com o avanço na história. Para isso, porém, temos o irritante sistema de coletar bolinhas Z.
Falando dos gráficos, temos um cell shading mediano. Depois de Dragon Ball FighterZ, não se aceita algo inferior ao que a Arc System fez sem criticar, apesar de a Cyber Connect ser a pioneira em nesse estilo, com qualidade desde Narultimate Hero, de PlayStation 2. Dessa vez, ela não conseguiu superar sua colega, mas não entregou um trabalho ruim.
Os cenários estão bem fieis à mitologia Dragon Ball Z, mas em voo, é possível ver casas e árvores se formando com o aproximar do personagem e certamente foi necessário economizar para que todas as sagas fossem reproduzidas. Os efeitos especiais não são de encher os olhos, com cutscenes que variam entre tediosas até vibrantes, faltando um equilíbrio na direção. Os comandos respondem bem, sem nenhuma complicação, e usar bem as habilidades disponíveis mostram, até agora, que Dragon Ball Z: Kakarot é um RPG de ação fácil.
Uma comparação óbvia é entre Kakarot e Xenoverse 2 que possui um sistema de jogo parecido e gráficos melhores, mas não segue fielmente as sagas, e sim, coloca um personagem editável do jogador no universo como um ajudante, intruso, seja como for. O mais antigo parece ter uma melhor abordagem gráfica, mas não é um RPG com grande apelo sentimental aos fãs pela fidelidade, enquanto o novo tem a premissa de ser a releitura definitiva de todas as sagas oficiais, com alguns detalhes extras que certamente virão via DLC, com direito a personagens originais feitos pelo próprio Akira Toriyama.
O título não traz um mundo exatamente aberto, como é possível fazer na geração atual, mas divide a Terra em setores. O Radar do Dragão não serve para procurar as Esferas, que são detalhes neste jogo, e sim como mapa. Cada segmento é desbloqueado com o avançar da história enquanto pontos de de pesca e side quests não desaparecem, com um equilíbrio entre missões totalmente aleatório, indo de extremamente fáceis até apresentar inimigos malignos totalmente descabidos de serem enfrentados, mais fortes que o chefe do setor e sem a opção de fuga no menu de combate.
A falta de equilíbrio no desafio faz muitos recursos de jogo serem praticamente inúteis, pois é muito fácil escapar dos ataques adversários com a liberdade que o voo e a esquiva de teleporte permitem, sem falar na habilidade de aparecer atrás do adversário ou explodir o KI na pressão da defesa.
Os personagens começam com muito HP desde o nível 1 e uma sequência simples de ataques físicos, Super Golpes que atordoam e magias vão varrer muitos inimigos barra-pesada da sua frente, a menos que sejam os absurdos oponentes 20 graduações acima, que aparecem no mesmo mapa. O jogo pune a desatenção, fazendo você cair em combates sem saída contra máquinas assassinas de combate.
Dragon Ball Z: Kakarot é a homenagem definitiva a esta franquia que não parece ter hora para acabar e reúne, na mesma emoção, várias gerações de fãs que não têm vergonha de dizer que levantaram as mãos para doar suas energias para Goku vencer seus inimigos mais terríveis. Um Super-Homem que precisa de amigos e tinge seus cabelos sem química, só com o poder da gritaria. E pensar que tudo começou em um despretensioso mangá de comédia baseado nos filmes antigos de Jackie Chan e a lenda “Viagem para o Oeste”?
Assim como em Kakarot, acompanhamos nosso Goku desde criança até mais velho, com filhos, e avô, enquanto ele também acompanha nossa vida. É paralelo de um torcer pelo outro que faz Dragon Ball Z ser tão marcante no coração de todos.
O game foi testado no PC, em cópia cedida pela Bandai Namco.