“I wonder how long it’s been since my brother and I began to see things other people can’t see.”

“Hyaku monogatari” é uma brincadeira japonesa onde os participantes acendem velas e contam cem histórias de terror, apagando pouco a pouco as luzes da sala ao fim de cada narrativa assombrosa. As entidades, com isso, começam a rodar o aposento, esperando a escuridão completa para tramar algo terrível. Não sei se há muita diversão nisso tudo, mas sei que os japoneses adoram pensar que falar de espíritos atraem os espíritos. E eu concordo um pouco com isso: são 3h38 da manhã e estou sentindo calafrios enquanto a janela da sala começa a bater como nunca fez em toda a minha vida.

Mas há um bom motivo para continuar por aqui firme, forte e escrevendo esse artigo especial. Afinal, a saga Fatal Frame está completando 15 anos de lançamento no Ocidente nesse sábado (4). Lá atrás, em 2002, milhares de PlayStation 2 e Xbox rodavam uma das cem histórias de terror que muitos jogadores presenciariam na sua vida gamer: a caminhada da garota Miku Hinasaki para descobrir o paradeiro do irmão Mafuyu em uma misteriosa e assombrada mansão.

Fatal Frame integra a lista das franquias Survival Horror mais relembradas entre os fãs desse gênero. Ao lado de Silent Hill e Resident Evil, a série da Koei Tecmo é uma das poucas que se mantém mesmo com o passar dos anos e dos consoles — um feito considerável visto que, hoje em dia, os direitos da franquia estão exclusivamente nas mãos da Nintendo. E, mesmo com o tempo, ela preza pelas suas origens e mistura sustos em primeira e terceira pessoa com a arma mais inusitada que alguém poderia imaginar: uma câmera fotográfica capaz de exorcizar os espíritos.

A série evoluiu, passou por mudanças e fez história modesta perto de tantos outros títulos de terror. Mas, para honrar o seu aniversário, o NGP assopra as velinhas do bolo e comemora com uma retrospectiva completa ao lado dos detalhes, curiosidades e destaques que os títulos tiveram ao longo desses tenebrosos anos.

Baseado em uma história real?

Cada game da série Fatal Frame está ligado a um ritual diferente, e o desastre é um resultado comum para muitos deles. Nem precisamos falar que os fantasmas estão relacionados diretamente a realização deste evento, indo de um mero espectador de um vilarejo local para até mesmo uma das oferendas vivas para fechar os portões do inferno. O mais chocante, no entanto, foi que o primeiro jogo da série chegou ao Ocidente com um subtítulo no mínimo curioso: “baseado em uma história real”. E, se não bastasse isso, a narrativa apresenta o jogador à mansão Himuro, um local que realmente existe no Japão.

Com isso, o debate entre os fãs se acirrou para saber se realmente há um fundo real em toda a história ou se apenas foi uma jogada de marketing para atrair os curiosos ocidentais para o jogo — principalmente porque o título do primeiro game no Japão, “Project Zero”, não contém nenhum subtítulo como encontramos por aqui. Embora haja pouco material sobre isso, a própria Tecmo tratou de explicar sobre as referências do primeiro título.

No release para a imprensa que anunciava Fatal Frame em abril de 2002, o estúdio detalhou que “a história assustadora do jogo é baseada em dois contos japoneses, ambos originados nas regiões montanhosas do país”. Makoto Shibata, criador de toda a série, conta da lenda de uma casa onde sete pessoas morreram, seguidos de relatos que batem muito com os eventos presenciados no game — mãos de sangue aparecendo nos muros, espíritos nas redondezas, túneis que ninguém sabe da existência e um talismã que provoca a morte das pessoas com cordas invisíveis.

O outro conto se refere a uma árvore onde dois amantes se encontravam toda noite, mas ambos não podiam se ver. A mulher, desesperada, se enforcou nos galhos; e tempo depois a própria árvore começou a balançar com um barulho estranho, como se fosse um choro lançado ao vento.

Como muitas lendas e contos, não há registros oficiais dessas histórias mesmo com várias discussões e viagens dos mais apaixonados membros da comunidade. Muitos inclusive concordam que misturar fantasmas com o conceito de “uma história real” forçou um pouco a barra para um jogo novo que estava entrando no mercado, mas eu gosto de pensar que o plano da Tecmo era provocar os jogadores. “Tudo isso é real?”, todos se perguntavam desde os primeiros minutos de jogatina.

Conheça a série

Ao todo, sete jogos estrearam no universo de Fatal Frame, passando do PlayStation 2 ao Wii U, com passagens até mesmo pelo 3DS.

Fatal Frame

Lançamento: 4 de março de 2002 (Estados Unidos).

Plataformas: PlayStation 2, Xbox, PlayStation 3 (port).

Nota Metacritic: 74 (PS2).

Personagens principais: Miku Hinasaki e seu irmão, Mafuyu Hinasaki.

Pontos positivos:

  • Impressionou pela proposta inovadora dentro dos Survival Horrors, misturando fantasmas em primeira e terceira pessoa junto de uma arma inusitada no gênero (Camera Obscura).
  • Apresentou os pontos de replay que se manteriam firmes na franquia, como os modos de missões, final alternativo e as famosas listas de aparições (Ghost List).
  • Tem bons momentos de ambientação e quebra-cabeças interessantes.

Pontos negativos:

  • De todos os jogos da franquia, este é o mais escuro — algo que atrapalha bastante na hora de se movimentar ou mesmo localizar os fantasmas.
  • Mafuyu. Chegue ao final e você entenderá como não se deve ser um irmão.

Curiosidades:

  • A versão do Xbox contém conteúdos adicionais, incluindo notas, diários, um novo final, uma nova dificuldade e até mesmo um chefe extra. Isso também aconteceria no segundo jogo.
  • Você pode usar o disco de Fatal Frame na versão de PlayStation 2 de Monster Rancher 4 para conseguir um monstro exclusivo, a Miku Monster.
  • É um dos jogos mais rápidos da série. O recorde atual de speedrun pertence ao francês Alien, com 1h19m40s. Você confere a jogatina aqui.

Fatal Frame II: Crimson Butterfly

Lançamento: 10 de dezembro de 2003 (Estados Unidos / PS2).

Plataformas: PlayStation 2, Xbox, PlayStation 3 (port).

Nota Metacritic: 84 (Xbox).

Personagens principais: Mio Amakura e sua irmã gêmea, Mayu Amakura.

Pontos positivos:

  • Ápice da pressão psicológica com sustos inesperados.
  • Ambientes característicos e recheados de inspiração na cultura japonesa.
  • Combates mais dinâmicos; fantasmas mais rápidos e com ataques inesperados.
  • Personagens se integram na narrativa do jogo.

Pontos negativos:

  • O desafio verdadeiro se concentra nos modos mais difíceis e no modo de missões.
  • Os controles ainda incomodam alguns jogadores, principalmente na movimentação do personagem.

Curiosidades:

  • Fatal Frame 2 é sempre lembrado pela crítica como um dos títulos que mais influenciaram o gênero Survival Horror, sendo considerado também como um dos melhores de toda a série.
  • Neil Druckman, produtor de The Last of Us e de Uncharted 4, já elogiou o jogo e comentou que “Fatal Frame 2 é a experiência mais assustadora em qualquer mídia”, comparando os jogos com os filmes e dizendo que nunca viu uma produção cinematográfica chegar perto disso.
  • Foi o primeiro jogo da série a ter uma música no encerramento: “Chou”, por Tsukiko Amano. A cantora ficou bastante conhecida entre os fãs e fez o tema musical de outros jogos a partir do segundo título.

Fatal Frame III: The Tormented

Lançamento: 8 de novembro de 2005 (Estados Unidos).

Plataformas: PlayStation 2, PlayStation 3 (port).

Nota Metacritic: 78.

Personagens principais: Rei Kurosawa, Miku Hinasaki e Kei Akamura.

Pontos positivos:

  • Mistura personagens e ambientes dos dois jogos anteriores.
  • Cada personagem tem upgrades e forma diferentes de jogar com a Camera Obscura.
  • Os combates são um pouco mais rápidos e os controles são mais leves — muito embora os personagens continuam correndo lentamente.
  • A Ghost List é imensa e com aparições difíceis de capturar.

Pontos negativos:

  • Não tem um terror tão denso e ambientado dos primeiros jogos.
  • Não há muitas inovações em quebra-cabeças ou no gameplay em geral.

Curiosidades:

  • Foi o primeiro título que aproximou a série da época contemporânea. A maldição de Rei começa a transportar os fantasmas dos seus sonhos para o mundo real, chegando a assombrar a casa da protagonista.

Fatal Frame IV: Mask of the Lunar Eclipse

Lançamento: 31 de julho de 2008 (somente Japão).

Plataforma: Wii.

Personagens principais: Ruka Minazuki, Misaki Asou, Madoka Tsukimori e Choushiro Kirishima.

Pontos positivos:

  • Um dos títulos da série com a trilha sonora mais vasta e bem trabalhada.
  • Quatro personagens jogáveis, construindo uma narrativa densa e com diferentes cenários.

Pontos negativos:

  • Nunca foi lançado oficialmente ao mercado ocidental, ficando restrito ao Japão.
  • Os comandos ainda são confusos, ainda mais nos diferentes controles do Wii.

Curiosidades:

  • Há um trabalho de tradução do jogo ao português.
  • O designer japonês Suda51 esteve envolvido como um dos co-diretores do game, ajudando na narrativa e em outros elementos do game.

Spirit Camera: The Cursed Memoir

Lançamento: 13 de abril de 2012 (Estados Unidos).

Plataforma: 3DS.

Nota Metacritic: 54.

Personagens principais: Maya e o próprio jogador.

Pontos positivos:

  • A realidade aumentada é interessante, principalmente porque os fantasmas aparecem no cômodo em que você está através da tela do 3DS.
  • Os conteúdos adicionais (filtros de fotos com fantasmas e minijogos), divertem principalmente se você quiser zoar com seus amigos.

Pontos negativos:

  • As batalhas exigem movimentos diversos de rotação e mira com o 3DS, sendo desconfortável para o jogador principalmente se ele estiver em ambientes pequenos.
  • A história é bem fraquinha, com personagens rasos e pouco explorados.

Curiosidades:

  • Vem junto com um livrinho “amaldiçoado” que o jogador usa em diferentes momentos da história.
  • Há pouquíssimas relações do jogo com a trama de Fatal Frame, sendo apontado pelos fãs como um spinoff da série.
  • Alguns modelos remasterizados de fantasmas da série (e das irmãs Mio e Mayu) aparecem dentro do jogo, causando hype entre os fãs para uma possível remasterização do segundo título (e que aconteceu meses depois).

Fatal Frame II: Deep Crimson Butterfly

Lançamento: 29 de junho de 2012 (Europa).

Plataforma: Wii.

Nota Metacritic: 77.

Personagens principais: Mio Amakura e sua irmã gêmea, Mayu Amakura.

Curiosidades:

  • É a versão remasterizada do segundo jogo, trazendo gráficos muito mais refinados, áreas novas, uma jogabilidade inspirada no quarto título e conteúdos adicionais para os fãs. A trama, com exceção dos número de finais, ficou inalterada.
  • Enquanto a versão original tinha três finais (quatro no Xbox), a versão do Wii conta com nada menos que seis finais diferentes. Alguns são tristes e outros mais perturbadores — mas há uma versão mais “bonitinha” para amolecer o coração dos fãs.
  • Não tem o clássico modo de missões, mas aposta em um modo adicional chamado Ghoust House. Neste, o jogador explora uma mansão abandonada com vários minijogos.

Fatal Frame V: Maiden of Black Water

Lançamento: 20 de outubro de 2015 (Estados Unidos).

Plataforma: Wii U.

Nota Metacritic: 67.

Nota NGP: 70.

Personagens principais: Yuri Kozukata, Miu Hinasaki e Ren Hojo.

Nota: Você confere a análise deste jogo aqui mesmo no New Game Plus!

Curiosidades:

  • Foi lançado em setembro de 2014 para o mercado japonês, mas sem planos para os jogadores ocidentais. Depois de uma vasta campanha liderada pela página Operation Zero, a Nintendo e a Tecmo trouxeram a versão para a Europa e a América do Norte.
  • Explora temas mais chocantes que os títulos anteriores, principalmente com cenas de suicídio.
  • O jogo foi anunciado junto de um filme da série (exclusivo para o Japão) e uma série de histórias em quadrinhos.

O futuro de Fatal Frame

Com a compra da exclusividade da série pela Nintendo desde 2008, os fãs estão sempre de olho nos anúncios da gigante nipônica para um novo título da franquia Fatal Frame. E, por coincidência, nessa semana estreia o Nintendo Switch, o que dá ainda mais esperanças para a comunidade.

Mesmo assim, há muita insegurança entre os fãs. O quarto título, lançado em 2008, nunca chegou oficialmente ao território ocidental. O mesmo quase aconteceu com Fatal Frame V, lançado nas terras nipônicas em 2014 e que esperou treze meses — com o empurrão de campanhas ferrenhas entre os fãs — para a estreia ocidental. E, mesmo assim, a versão norte-americana é exclusivamente digital.

O ritmo de um título por cada console da Nintendo também indica que o Switch é o alvo mais provável da um novo game da série. E é possível que, com políticas mais abertas da Big N ao console, a franquia possa também estrear por aqui com muita mais facilidade. O desafio, no entanto, seria em adaptar essa proposta ao novo hardware e a nova jogabilidade do pequeno aparelho. O que nos resta, até o momento, são inspirações, ideias e esperanças. Afinal, não é de hoje que eu penso em adaptar o conceito do “Hyaku monogatari” para uma versão mais moderna e interessante — ou você não teria a coragem de participar das cem histórias de fantasmas nos videogames?

Caso você esteja de olho nas discussões da comunidade e queira encontrar outros fãs de Fatal Frame ao redor do mundo, aconselhamos a entrar na Beyond the Camera’s Lens, um dos fóruns mais antigos e mais ativos da série.

Encontrou um erro?

Envie um email para contato@newgameplus.com.br com a URL do post e o erro encontrado. Obrigado! ;-)