Feche os olhos e pense em uma trilha sonora icônica, daquelas que marcam quem escuta e funcionam tão bem em um game quanto em uma apresentação ao vivo, no palco, com banda de rock e tudo. Abra os olhos e veja um desenho animado se desenrolando à sua frente, sóque quem controla o personagem principal é você, com uma jogabilidade precisa e simples, como nos melhores jogos do passado. E, então, se dê conta de que você não está sonhando.
Tudo isso é real e maravilhoso. O que temos diante de nós é o retorno de um dos maiores personagens do mundo dos games, em sua melhor forma e, acima de tudo, da forma como não apenas ele, mas também os fãs merecem. Bem-vindo de volta, Mega Man. A gente estava com saudades e sua volta não poderia ser melhor.
O 11º episódio da série principal de um dos mais famosos personagens da Capcom marca a estreia efetiva do protagonista nesta geração, com a mistura mais equilibrada entre passado e presente. Quem joga Mega Man desde a infância, nos idos do Nintendo, ou passou pelas diferentes iterações dele ao longo dos anos, vai se sentir mais do que abraçado. Enquanto isso, aqueles que estão chegando agora não poderiam conhecer o personagem de maneira melhor.
O game entregando aquilo que o personagem e os fãs merecem, com belos gráficos e um bom equilíbrio entre passado e presente. Bem-vindo de volta, Mega Man. A gente estava com saudades e sua volta não poderia ser melhor.
As bases são as mesmas do passado, com o jogador selecionando chefes e seguindo à fase de cada um deles, enfrentando perigos relacionados à seu poder. Um vilão de fogo, por exemplo, terá asseclas cujos ataques se baseiam em projéteis, enquanto a já tradicional fase da neve apresenta piso escorregadio e desafios que envolvem a precisão nos saltos entre plataformas. E esses são apenas dois exemplos clássicos, presentes em um game que também inova em seus conceitos.
Chama a atenção, por exemplo o estágio de Bounce Man, um jogo de balões voadores e borracha em que quase não existem superfícies planas e comuns, representando uma dificuldade a mais em um título já naturalmente difícil. A fase é bonita, divertida e apresenta um pensamento fora da caixinha, de uma forma surpreendente para um jogo que poderia fazer o básico e, simplesmente, se focar em entregar uma nova experiência, só que igual a todas as outras.
Destaque, também, para o estádio de Torch Man, com um desafio daqueles de jogar o controle na parede quando a tela é tomada por labaredas que exigem velocidade nos movimentos, tiros poderosos e, acima de tudo, precisão para não errar o caminho. É o tipo de desafio que vai atrair os fãs do passado, que gostavam de sofrer com Mega Man.
Não que os estágios como um todo sejam fáceis, e este uma exceção. Na verdade, é exatamente o contrário, a ponto de muitas das fases de Mega Man 11 serem mais difíceis até mesmo que os próprios chefes que aguardam ao final delas. Quem usar a já tradicional sequência “correta”, aproveitando a arma do vilão anterior para atacar o ponto fraco do seguinte, vai conseguir passar dos robôs principais sem muita dificuldade – às vezes, de forma até fácil demais, enquanto alguns sub-bosses e desafios “cotidianos” representarão um terror à parte.
Isso é tão verdade que, ao final de Mega Man 11 e na medida em que os desafios vão se tornando maiores (o castelo de Dr. Willy, nas dificuldades mais altas, é de um desgraçamento bastante peculiar), chega a soar como um alívio a tradicional fase em que enfrentamos todos os chefes em sequência. Fruto, talvez, de uma falta de balanceamento por parte da Capcom, mas provavelmente, uma forma de presentear um jogador que chegará quase morto ao final de alguns estágios.
Tanta dificuldade poderia afastar os novatos, principalmente aqueles acostumados com o estilo dos jogos de hoje, em que protagonistas não morrem e os checkpoints estão por todo lado. Para facilitar um pouco as coisas, Mega Man 11 traz um sistema de seleção de dificuldade, com quatro níveis que vão desde o melzinho na chupeta até a insanidade absoluta.
Além disso, dentro do próprio game, também existem algumas colheres de chá. Desde o começo, temos acesso às Double Gears, que servem como artifício adicional nos momentos mais complicados. A primeira delas aumenta a força dos disparos de Mega Man, enquanto a segunda reduz a velocidade do mundo, permitindo escapar de forma mais fácil dos disparos inimigos ou acertar aquele pulo mais complicado em uma plataforma móvel. Caso a energia esteja abaixa, é possível utilizar as duas engrenagens para um ataque devastador.
Mega Man 11 é uma marca não apenas do retorno de um personagem querido, mas também de uma empresa que parecia perdida ao longo dos últimos cinco anos, mas, agora, parece ter voltado aos trilhos.
Um sistema de upgrades e compras de itens leva esses conceitos ainda mais adiante. Os tradicionais tanques de energia voltaram, assim como os que enchem as barras de energia das armas. Além disso, temos o amigo robô que busca o protagonista no abismo por uma única vez, caso ele caia, e as botas poderosas que permitem pisar nos espinhos, também, uma vez. São respiros em cenários muitas vezes caóticos, que servem para perdoar vacilos e permitir seguir em frente com mais tranquilidade.
Melhorias para o robozinho azul também fazem parte do game. Um deles, por exemplo, faz com que o personagem se mova na velocidade normal enquanto o mundo está em câmera lenta – e este que voz escreve, particularmente, só conseguiu passar do estágio de Torch Man depois de adquirir esse upgrade. Outros aumentam a quantidade de itens que podem ser levados para as fases ou carregam disparos automaticamente, uma mão na roda, principalmente, diante dos inimigos com escudo ou sub-bosses.
Mesmo com tudo no máximo e com a dificuldade configurada para o mínimo possível, Mega Man 11 ainda oferece dificuldade. Terminá-lo não vai ser tarefa fácil para ninguém, apesar de o jogo não poder ser colocado entre os mais difíceis da saga, mesmo em seus níveis mais altos. Não há nada como os games antigos, mas a decisão de reduzir um pouco as coisas é acertada, principalmente, para tornar o jogo adequado com o estilo dos dias de hoje.
Quem quiser insanidade, porém, pode encarar os desafios que são abertos após a finalização do game ou, então, as conquistas especiais que exigem, por exemplo, finalizar os estágios rapidamente ou não ver nenhuma vez a tela de Game Over. Tais elementos, logicamente, não fazem parte da experiência central de Mega Man 11, cuja balança acaba pendendo mais para a acessibilidade, com os momentos de desafio mais alto, do que para o contrário.
O conjunto visual, entretanto, não tem nada de passado. É claro, a estrutura é a mesma dos clássicos dos clássicos, assim como a divisão de fases e até a trilha sonora da apresentação dos inimigos. Mas para por aí. Mega Man 11 tem um estilo cartunesco que se adequa muito bem ao personagem e que faz esperar por mais títulos com esse visual no futuro.
Colorido e agradável aos olhos, o game usa cores fortes e bastante contraste para exibir, muitas vezes, a dualidade entre Mega Man e seus oponentes. Muda, também, a armadura utilizada pelo protagonista de acordo com o poder escolhido, uma representação visual que facilita muito no calor da batalha, quanto mudamos rapidamente de armamento com os gatilhos superiores. Claro, na medida em que o título avança, se torna mais fácil recorrer ao menu, mas quem precisar alterar as opções rapidamente não terá muita dificuldade em ver o que está fazendo.
O título também pode ser considerado como um dos mais detalhados de toda a série, não apenas no cenário mas também nos personagens, que aparecem na tela como figuras grandes e bonitas. Há sempre muito acontecendo e o game não apresenta nenhum tipo de falha de performance, como já era de se esperar em um título dessa categoria, rodando em hardware da atual geração. A mistura de tudo é um deleite aos olhos e ouvidos, às mãos e à memória.
Mega Man 11 não possui cutscenes e os momentos que contas a história são breves, com personagens praticamente parados na tela e diálogos falados. Cutscenes mais interessantes fazem falta, mas não são exatamente uma necessidade, assim como a localização ausente para o português brasileiro. Não é como se o título tivesse uma trama e tanto, mas o cuidado com o restante do game é tamanho que, nestes dois aspectos, a sensação é de um esquecimento esquisito.
São falhas daquelas que não maculam o conjunto total. É uma alegria ver Mega Man 11 funcionando, principalmente para quem cansou de jogar os títulos do passado já distante. Lá se vão mais de duas décadas e, além disso, um longo e tenebroso inverno para fãs de todo o mundo, que viram o que foi um dos maiores bastiões o mundo dos games quase que desaparecendo na obscuridade, sendo esquecido pela produtora que o trouxe ao mundo e o transformou em um clássico dos clássicos.
O título é uma marca não apenas do retorno de um personagem querido, mas também de uma empresa que parecia perdida ao longo dos últimos cinco anos, mas, agora, parece ter voltado aos trilhos do alinhamento com o mercado e, principalmente, os anseios dos fãs. Se essa volta será definitiva, não temos como saber, mas Mega Man 11 é uma demonstração de que, se depender deste começo, temos um futuro glorioso pela frente.
O jogo foi testado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Capcom.