Uma das coisas mais importantes a se dizer sobre Watch Dogs é justamente o título dessa análise: o jogo não é uma cópia de GTA ou uma tentativa da Ubisoft de emplacar um GTA próprio/genérico. Existem sim semelhanças com o jogo da Rockstar e até mesmo algumas coisas copiadas, algo bastante normal nos tempos atuais, onde as empresas apostam suas fichas em mecânicas consagradas e introduzem novidades num ritmo de conta-gotas. Com Watch Dogs não seria diferente, há mecânicas de GTA, de Assassin’s Creed e até mesmo de Metal Gear, a maioria delas muito bem executadas pela equipe da Ubi, que ainda introduziu uma pitada de inovação, embora ela tenha sido menor do que era esperado.
A premissa inicial de Watch Dogs é hackear. Com um smartphone na mão, Aiden Pearce, o protagonista, consegue penetrar em praticamente todos os sistemas da cidade e estabelecer o caos, quando necessário. Com um sistema simples e de fácil aprendizado, hackear é mais do que a principal arma, é também a maior diversão do jogo.
De caixas eletrônicos a complexos sistemas de segurança, passando por uma imensa quantidade de NPCs, praticamente tudo no jogo pode ser descoberto invadindo o sistema certo ou a pessoa chave. Alguns puzzles são oferecidos ao jogador na hora de penetrar sistemas mais complexos, mas a curva de aprendizagem do hackeamento é bastente coesa, e a dificuldade vai aumentando conforme o jogador progride no jogo. Aliás, esse é um ponto notável do jogo: a dificuldade das missões, invasões, batalhas e afins vão progredindo de acordo com a avanço do jogo, o que torna quase tudo bastante simples mas coerente.
Com um sistema simples e de fácil aprendizado, hackear é mais do que a principal arma, é também a maior diversão do jogo.
Uma árvore de habilidades é apresentada ao jogador, e fica livre a escolha de quais delas serão adquiridas primeiro. Tudo depende da forma que o jogador prefere encarar a jornada, se prefere encarar o jogo focando na furtividade, existem habilidades que o ajudarão; se preferir partir para combates e tiroteios, algumas habilidades também podem ser adquiridas para auxiliar nesse aspecto. Assim como quase tudo no jogo, a progressão das habilidades é simples, intuitiva e ajuda o jogador a melhor compreender e encarar os desafios existentes.
Aiden Pearce age sozinho, no máximo recebendo suporte remoto de um de seus aliados, e por isso em quase todas as missões o jogador tem a opção de cumprir o objetivo de forma sorrateira, usando a furtividade como maior aliada. Hackear câmeras para observar o posicionamento dos inimigos, interferir em suas comunicações e criar distrações são essenciais para conseguir passar por determinados pontos sem ser notado. O sistema de cover é praticamente perfeito, fácil de compreender e ainda mais simples de usar em situações perigosas. Com apenas um botão, o jogador pode fazer Aiden se deslocar curtos espaços para buscar proteção em outro lugar, evitando o inimigo que se aproxima ou para ter acesso a um novo ponto que permite o hackeamento de novas câmeras.
Quem prefere chumbo grosso também não tem do que reclamar. O jogo oferece uma enorme quantidade e diversidade de armas, que vão desde pistolas, shotguns, sub-metralhadoras, rifles e bombas variadas. Aqui também o sistema de cover é importante e funciona de forma excepcional, auxiliando a movimentação rápida do jogador em meio a tiroteios.
Um dos pontos mais desapontantes do jogo é a falta de carisma ou de empatia de Aiden Pearce.
De uma forma geral, o ideal é misturar a furtividade e o combate aberto, apesar de ser possível usar somente um ou outro, a melhor forma de se chegar ao objetivo da missão depende muito de uma série de fatores e apostar somente em um desses métodos pode tornar o jogo mais difícil. Mas de qualquer forma, vale o desafio e vai do julgamento de cada jogador escolher o que se adequa melhor ao momento.
Uma das promessas e dos aspectos mais propagandeados pela produção do jogo é que Chicago seria uma cidade viva, livre… não é bem assim. Existem milhares de NPCs diferentes para você hackear (dentre eles alguns easter eggs como um ex-funcionário da Abstergo), você interage de diferentes formas com a cidade e pode ser visto como um vigilante ou como um mero bandido pela população de acordo com suas atitudes, mas a Chicago “viva” para por aí.
Em sua imensa maioria, as edificações são meros elementos de cenário, blocos de pixels sem nada para ser invadido ou para se fazer em seus interiores, e isso é bastante frustrante, ainda mais em uma cidade tão cheia de arranha-céus e construções que chamam a atenção.
Apesar disso, a cidade é cheia de becos, ruas estreitas, passarelas e corredores, quase sempre cheio de NPCs que podem ser hackeados, ou então missões paralelas que no fim das contas são o verdadeiro filé mignon do jogo, que levam Aiden até mesmo a desmantelar um esquema de tráfego de pessoas, explorando o submundo de Chicago e se envolvendo no meio das mais perigosas gangues.
Um dos pontos mais desapontantes do jogo é a falta de carisma ou de empatia de Aiden Pearce. Um personagem que passou por um grande trauma familiar e busca vingança, mas que faz isso de uma maneira gélida, sem emoção e parecendo estar completamente desligado dos supostos laços que ainda possui. Mesmo com todo o drama que a história tenta criar em torno de sua vida, isso acaba não funcionando, e os momentos mais marcantes do jogo são os que colocam Aiden em situações de investigações sobre o tráfico de seres humanos, ou então seu estranho relacionamento com Clara Lille, uma das personagens que auxilia e dá suporte a ele durante suas missões. Aliás, os personagens secundários em muitos momentos são mais interessantes e parecem ser mais bem construídos do que o próprio protagonista do jogo.
A campanha principal do jogo é realtivamente curta para um jogo de mundo aberto, podendo ser finalizada em torno de 20 a 25 horas, porém existe uma enorme quantidade e variedade de missões extras que dão uma grande vida útil ao jogo e adicionam horas de diversão.
As missões são as mais variadas e vão de impedir crimes pela cidade, invadir torres de comunicação, desmantelar um cartel de tráfico de seres humanos e algumas insanas como uma competição pra ver quem aguenta beber mais em bares pela cidade, fazer Aiden entrar em uma espécie de sonho e pular em flores psicodélicas e até mesmo desafios com cara de arcade do fim dos anos 1980.
Citar todas aqui, provavelmente faria com que esse texto quase dobrasse de tamanho, mas o importante mesmo é que a Chicago de Watch Dogs está repleta de coisas para serem feitas, desde as mais simples até as mais insanas e inimagináveis.
Sem dúvidas, Watch Dogs foi muito mais caprichado para o PS4 e Xbox One, e isso é bastante frustrante. É claro que não se poderia esperar a mesma qualidade gráfica nas duas gerações, porém, o jogo fica devendo no PS3/X360, especialmente na parte gráfica. Não serão poucos os momentos em que o jogador literalmente verá a cidade se construindo na sua frente, especialmente se estiver dirigindo um veículo em alta velocidade. Algumas texturas são bem pobres, sem falar que quando Aiden é forçado a nadar, quase não há movimento na superfície, dando a impressão que o personagem está se movimentando em uma geléia dura, sem respingos, sem movimento.
É triste constatar essa defasagem gráfica, principalmente quando se pega um jogo lançado pela própria Ubi em 2013, Assassin’s Creed IV: Black Flag, que é um colírio para os olhos, e apresenta incríveis movimentos na água e texturas muito bem produzidas. Lembrando que estamos falando da geração do PS3/X360, já que no PS4/XOne, o jogo parece estar com visuais soberbos, mesmo nos pontos citados aqui como negativos.
Sem dúvidas, Watch Dogs foi muito mais caprichado para o PS4 e Xbox One, e isso é bastante frustrante. É claro que não se poderia esperar a mesma qualidade gráfica nas duas gerações, porém, o jogo fica devendo no PS3/X360, especialmente na parte gráfica.
Constatado isso e fazendo essa comparação com AC4: Black Flag, fica até a dúvida se esse downgrade tão evidente não foi proposital, para que houvesse uma melhora comercial nas vendas do jogo para a nova geração. Bem, é algo a se pensar, mas prefiro acreditar que a Ubi não faria uso de tal artimanha.
Já que comparei Watch Dogs com Assassin’s Creed no parágrafo acima, é impossível não estender essa comparação pensando que Watch Dogs pode vir a se tornar uma franquia.
O primeiro Assassin’s Creed, causou grande alvoroço e abriu uma enorme porta. O jogo teve lá suas críticas, principalmente por ter missões muito repetitivas, mas a Ubi soube absorver as críticas e quando lançou o segundo jogo da franquia, entregou talvez o mais fantástico jogo da série. AC2 melhorou todas as mecânicas implementadas no primeiro jogo e trouxe um mundo muito maior, com um personagem muito mais interessante e com uma diversidade de ações bem maior.
Com Watch Dogs, podemos esperar que aconteça o mesmo. A Ubi já deixou a porta aberta para que uma nova franquia seja estabelecida, e com o enorme sucesso que o jogo fez, é quase certo que tenhamos um Watch Dogs 2. Fica então a esperança que assim como aconteceu com Assassin’s Creed, a produtora consiga consertar os erros e os pontos criticados, melhorar tudo aquilo que já funcionou bem e que o segundo título da franquia traga a mesma evolução que o segundo Assassins’s Creed trouxe em relação ao primeiro, e dessa forma poderemos ter mais uma boa franquia de jogos em mundo aberto, coisa que a Ubisoft já demonstrou ser bastante capaz de fazer.
Se tudo se confirmar e Watch Dogs se tornar uma franquia, ela chega para ocupar seu lugar entre as maiores da atualidade e crava de vez o nome da produtora francesa como uma das maiores e melhores desenvolvedoras de jogos. Apesar disso, Watch Dogs tem algumas falhas comuns de uma franquia em estréia e, mesmo já nascendo como uma gigante, há muito trabalho a ser feito para que o futuro seja tão brilhante como o de outras franquias AAA.
Este jogo foi analisado no Xbox 360.