Um lugar-comum quando se fala em automobilismo é a citação de que, não importando a categoria, estão na pista apenas os melhores e mais privilegiados do mundo. Mesmo o segundo piloto da escuderia mais fraca da Fórmula 1, chegando em último em uma corrida, ainda é o 20º mais importante do mundo. Apesar de existirem controvérsias quanto a qualidade, uma coisa é certa: nesse mundo, não existe lugar para fracos.
Se a indústria de jogos fosse o circo do automobilismo, Project CARS 2 seria a Fórmula 1. E se existe um exemplo claro de evolução no mundo dos games, é o título da Slightly Mad Studios, que sai de uma já bastante incrível primeira versão para entregar aqui um dos melhores títulos do gênero na atual geração, apresentando um verdadeiro deleite para os jogadores avançados.
Na sequência, a desenvolvedora consegue um feito incrível, fazendo com que os jogadores efetivamente sintam o carro, mesmo que estejam jogando com o controle. Uma união de jogabilidade apurada, simulação bem feita e calibração perfeita dos comandos faz com que a experiência de pilotar seja realista e joga a dificuldade lá para cima. Ao mesmo tempo, temos aqui um dos games mais desafiadores do gênero, mas também um dos mais recompensadores.
A falta de suporte para novatos é a única falha de Project CARS 2, um jogo que é impecavelmente feito para os amantes da velocidade digital. Mas eles precisam saber o que estão fazendo.
Isso está presente não apenas no controle, mas também em todos os outros aspectos. Use um bom sistema de som e você sentirá cada solavanco e movimento das peças, desde as pancadas mecânicas dos modelos mais antigos até aquele assobio delicioso do turbo. Jogar na chuva permite ouvir os pingos na lataria, enquanto as pedrinhas atingindo o assoalho serão a triste trilha da perda de controle em uma curva.
Na parte gráfica, a mesma coisa. Os carros estão finamente reproduzidos, desde modelos de passeio de marcas como Ferrari ou BMW até máquinas clássicas das pistas de corrida, como a famosa “Lotus Preta” de Ayrton Senna ou modelos anuais dos Dallaras usados na Fórmula Indy.
O mesmo vale, em nota ainda maior, para as pistas, que também chegam reproduzidas fielmente e ganham um incremento ainda maior pelo sistema de clima. Ele pode ser dinâmico, nas provas mais longas, ou assumir características específicas de acordo com a vontade do jogador.
Para atender aos anseios dos pilotos virtuais, não faltam opções. São mais de 100 carros e dezenas de pistas, que com diferentes climas, categorias e configurações, podem resultar em milhares de configurações diferentes, desde uma viagem ao passado a bordo de um Escort 1972 por uma versão ensolarada de Spa-Francorchamps até uma prova de monopostos sob uma forte nevasca que jamais cairia sobre o circuito de Silverstone.
A liberdade é um dos grandes méritos de Project CARS 2, entregando o controle completamente nas mãos dos jogadores. A maior força do game está, justamente, nas corridas simples, montadas ao prazer de cada usuário, e é esse modo, também, que traz a maior variação. Dá para perder horas apenas experimentando configurações e jogando provas curtas com veículos variados, observando os efeitos do clima sobre os carros e melhorando a pilotagem sob diferentes condições.
Quem procura mais profundidade, entretanto, pode encontra-la no modo campanha. É aqui que o piloto galga os degraus que começam no anonimato e levam às maiores categorias do mundo. Mas há, também, liberdade, com o jogador podendo escolher por onde começar. Você não precisa iniciar no kart e pode escolher sua categoria preferida, entre diversas opções de base, desde o início mostrando suas aptidões.
Bons resultados garantem a subida na tabela e a promoção para novas categorias. Há persistência e repetição aqui, com a busca por pontuação e treinos classificatórios, mas também variação, pois os bons resultados garantem convites para eventos especiais, com carros clássicos, veículos de passeio ou provas de exibição mais curtas, que contam com condições específicas e servem como um respiro.
Tudo isso, entretanto, já eram características do game anterior, agora levadas a novos horizontes nesta sequência. Uma das principais adições é um sistema de engenharia que permite tanto ajustes finos nos veículos quanto traz um toque de inteligência artificial à parte mecânica, aprendendo com seu comportamento nas pistas e sugerindo mudanças.
Project CARS se posiciona cada vez mais como um concorrente de peso a franquias como Forza Motorsport e Gran Turismo. Falta apenas a tradição, que não deve demorar a chegar.
Você pode não saber o que é um turbocharger ou um sistema de recuperação de energia, mas é capaz de perceber que o carro precisa de mais estabilidade nas retas ou de mais potência ao final de uma curva. Usando o sistema, é possível indicar exatamente esse tipo de coisa para seu engenheiro virtual, com ele fazendo os ajustes necessários em todas as peças, de forma a tornar o carro uma extensão do piloto.
Esta é, entretanto, uma das únicas instâncias em que a Slightly Mad Studios parece se preocupar com aqueles mais leigos no automobilismo virtual. A ideia é que dá para ser um bom piloto sem conhecer as entranhas de um carro, mas a colher de chá acaba por aqui. Na maioria do tempo, Project CARS 2 soa como um game feito para os profissionais dos games.
Isso se traduz não apenas em um intenso foco nas categorias de eSports, com uma liga oficial e até mesmo recursos para transmissões e comentários à disposição dos jogadores, mas em todo o pacote. Dificilmente, alguém sem intimidade com o volante digital vai se sentir bem aqui.
Assistências e auxílios estão presentes, como em todos os jogos de corrida, mas mesmo com eles é preciso saber o que está fazendo. A linha que indica o melhor traçado está presente, assim como a ativação automática dos freios, controle de tração e outros aspectos desse tipo. Ainda assim, o tempo todo, é preciso saber o que se está fazendo, caso contrário, o passaporte para o muro é carimbado.
A falta de suporte para novatos, inclusive, é a única falha de Project CARS 2, um jogo que é impecavelmente feito para os amantes da velocidade. Com milhares de opções disponíveis e um conjunto robusto de funcionalidades, dá para dizer sem sombra de dúvida que temos aqui um dos melhores simuladores da atual geração.
Mais do que isso, Project CARS se posiciona cada vez mais como um concorrente de peso para nomes como Gran Turismo e Forza Motorsport, mesmo que ainda sem a tradição dos rivais – algo que não deve demorar a chegar, caso a produtora continue nesse caminho estrelado.
O jogo foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Bandai Namco.