A evolução é algo central em Pokémon. E essa característica sempre representou muito bem tudo aquilo que a série foi ao longo dos últimos 20 anos, muito além da mecânica em si. Assim como os agora mais de 800 monstrinhos, a franquia se transformou diversas vezes para se tornar mais forte e relevante a cada novo lançamento. E a chegada de Sun e Moon mostra o quanto esse paralelo continua verdadeiro.
Os novos títulos chegam ao 3DS como uma revolução dentro da saga ao mesmo tempo em que mantêm tudo exatamente como antes. Embora pareça contraditório, essa relação é o grande segredo de sucesso de Pokémon. Não se trata de inovar e se reinventar, mas de aprimorar aquilo que já existe adicionando novas camadas. É um processo contínuo de aprimoramento. Do mesmo modo que seus monstrinhos, é se transformar sem ignorar o que foi conquistado até aqui.
E, com Sun e Moon, tudo isso se torna mais relevante. Eles chegam ao portátil logo após o sucesso de Pokémon GO e isso fez com que não apenas os holofotes se voltassem para a série, como também atraiu uma série de novos jogadores. Assim, o desafio estava exatamente em equilibrar a evolução que os veteranos esperavam com mecânicas acessíveis para quem estava tendo seu primeiro contato com os jogos. E esse é o seu maior acerto.
Tornar o game mais acessível para todo mundo era uma preocupação que a Game Freak já apresentava há tempos, mas que se torna muito mais evidente em Pokémon Sun/Moon. Os novos jogos entregam tudo aquilo que você precisa para dar início à sua jornada já nos primeiros minutos, tornando esse começo bem mais acessível e agradável. Quem se aproximou da série por Pokémon GO, por exemplo, não vai se assustar com a lentidão e nem achar difícil montar um time equilibrado.
É claro que essa mudança torna as coisas relativamente mais fáceis, mas isso está longe de ser algo ruim. A abordagem mais abrangente significa abrir mão de velhos cacoetes e pensar em formas de fazer com que a experiência seja realmente mais prazerosa e divertida. E ele faz isso muito bem.
Pokémon Sun/Moon atualiza vários conceitos da série, facilitando o progresso e deixando tudo muito mais acessível e divertido tanto para novatos quanto para veteranos.
Apenas para ter uma ideia, o jogador já consegue uma grande quantidade de Poké, Great e Ultra Balls ainda na primeira cidade de Alola. Isso sem falar de itens que aceleram o ganho de experiência e até mesmo um Tauros para montar, fazendo as vias da velha bicicleta. São pequenas rupturas com o formato engessado de antes que criam um dinamismo muito maior na forma que você progride neste mundo.
Aliás, o uso do próprio Tauros e de outros Pokémon como montaria é outra adição interessante que apenas complementa essas pequenas alterações para a criação de um jogo mais redondo. Ao longo de toda a sua jornada por Alola, o herói pode invocar alguns monstrinhos que vão ajudá-lo em tarefas específicas, como destruir rochas, mover blocos, nadar ou voar de uma cidade para outra.
É uma saída muito inteligente para substituir os velhos HM que há tempos serviam apenas para irritar os treinadores. Com isso, você não precisa mais manter um Pokémon inútil em seu time e nem sacrificar um golpe para carregar movimentos ruins como Cut ou Flash. A partir de agora, essas tarefas passam a ser cumpridas por esses aliados em uma alternativa muito mais elegante e atraente.
Outro ponto é o fato de que o próprio jogo informa quais golpes são mais ou menos eficientes contra determinado Pokémon. É algo que pode passar quase despercebido à primeira vista, mas que faz toda a diferença, principalmente para quem está tendo seu primeiro contato com a série. Decorar as vantagens e fraquezas de todos os 18 tipos de Pokémon existentes é algo complicado até para veteranos, então Sun/Moon resolve isso de maneira bastante simples.
Já para os velhos conhecidos da série, Pokémon Sun/Moon quebra a sua própria estrutura para apresentar algo novo. Depois de 20 anos, a Game Freak finalmente decidiu imaginar um mundo com uma organização bem diferente daquela que nos acostumamos a ver. Ao contrário de Kanto, Johto e todos os demais continentes que já visitamos, Alola possui regras bem peculiares, como o fim dos velhos ginásios.
Os Trials substituem os velhos ginásios que vimos até hoje e oferecem uma nova dinâmica na hora de avançar por Alola.
Nesta nova região, eles são substituídos pelos Trials, desafios que vão desde enfrentar alguns Pokémon selvagens até tirar fotos e participar de um jogo de sete erros. É claro que, na prática, a lógica ainda é a mesma, mas o simples fato de não ter de apenas enfrentar um líder já cria uma dinâmica diferente que faz com que cada Trial seja realmente único.
Por outro lado, o fato de Pokémon Sun/Moon apresentar tarefas mais variadas acaba se tornando uma dor de cabeça por conta de um problema bastante local. Essa mudança cria uma dependência muito maior dos diálogos e da história do que nos jogos anteriores e a Nintendo segue sem localizar seus jogos para o português. Assim, quem possui um pouco mais de dificuldade com o inglês ou com algum dos outros idiomas vai certamente bater um pouco de cabeça para entender o que precisa ser feito.
Essa barreira linguística também atrapalha o entendimento de uma história que evoluiu junto com o jogo em si. A trama da nova aventura está longe de ser profunda e madura como de outros títulos, mas é nitidamente melhor trabalhada do que nos títulos anteriores. Além de trazer bons diálogos a todo momento, a história se amarra muito bem com toda a série, faz referências ao desenho e à própria história em diversos momentos. Assim, para quem acompanha a franquia há tempos, certamente vai aproveitar muito mais. Sem falar que, em alguns momentos, as coisas ficam surpreendentemente sombrias.
Só que Pokémon Sun/Moon não se resume apenas a dar nova roupagem à estrutura clássica. Como dito, estamos falando de evolução e isso é feito de várias formas por aqui. A mais clara delas, por exemplo, é a adição de 80 novos monstrinhos à já extensa lista. Com isso, já são mais de 800 Pokémon dos mais diferentes tipos, o que altera de maneira drástica as estratégias adotadas até então.
Os Z-Moves são mais democráticos que as Megaevoluções e, por isso, se tornam muito mais imprevisíveis nas batalhas. Você nunca sabe quando eles podem vir.
Essa preocupação com o metagame é algo que sempre esteve presente na série e que vemos se repetir por aqui. O simples fato de termos um aumento na quantidade de Pokémon do tipo inseto, por exemplo, já mostra o cuidado de manter as coisas equilibradas. As Alolan Forms seguem a mesma lógica, alterando o tipo de monstrinhos clássicos e seu potencial de combate.
Porém, a maior adição nesse sentido não são as criaturas em si, mas o que elas são capazes de fazer. Como mostrado intensamente nos trailers, os Z-Moves são golpes poderosos que todos os Pokémon podem utilizar uma única vez em combate e que podem virar o resultado de uma luta de uma hora para outra.
E, aqui, há uma diferença fundamental em relação às Megaevoluções de X/Y — que ainda estão presentes em Sun/Moon, ainda que de maneira quase escondida. Enquanto a transformação que vimos na geração passada realmente mudasse toda a dinâmica da partida, alterando tipos, atributos e habilidades dos Pokémon, os Z-Moves são bem mais pontuais. É como se fosse aquele ataque especial que o herói dá no final do episódio para acabar com o vilão.
Só que o fato de ser algo mais “contido” não significa que a novidade seja de menor impacto. Na verdade, ela é ainda maior. Isso porque as Megaevoluções afetavam apenas alguns pouco Pokémon, enquanto os Z-Moves podem ser usados em qualquer um dos 801 monstrinhos disponíveis. Isso significa que, durante uma batalha, você realmente não tem a menor ideia de quando esse ataque vai vir e nem como isso vai afetar sua estratégia — o que obriga os treinadores a repensarem suas táticas a todo momento.
Porém, nem tudo é alegria em Alola. Apesar dos vários acertos do jogo, há algumas alterações que parecem não ter funcionado como o esperado, como é o caso da interface. Enquanto Pokémon X/Y e Alpha Sapphire/Omega Ruby usavam muito bem as duas telas para facilitar a vida dos jogadores com atalhos e acesso às principais funções do game, Sun/Moon parece dar um grande passo para trás nesse sentido.
Tudo bem que a touchscreen é usada pela RotomDéx e a exibição do mapa — o que é realmente muito útil para explorar os ambientes totalmente tridimensionais —, mas é curioso ver como as coisas ficaram um pouco mais burocráticas. Seria uma forma de acabar com a dependência da segunda tela para levar o jogo para o Switch, como já apontam alguns rumores?
Outra decisão que soa equivocada diz respeito à parcela online do jogo. Até então, tudo poderia ser acessado com um único toque na tela inferior. Contudo, isso acabou sendo descartado para se adequar ao chamado Festival Plaza, uma área com vários minigames e outras atrações.
O espaço em si não é o problema, mas o modo como os meios de troca e batalha acabaram sendo inseridos ali. Ele abre mão do formato intuitivo usado anteriormente para coloca algo desnecessariamente burocrático. Interagir com amigos é muito mais complicado e pode frustrar quem espera só trocar um Pokémon com seus contatos.
De resto, na parte técnica, Pokémon Sun/Moon é tudo aquilo que a gente poderia esperar em termos de evolução. O jogo conta com os melhores gráficos de toda a série, com novas animações que tornam os confrontos bem mais interessantes. A trilha sonora é outro aspecto bem positivo por aqui, principalmente em relação ao tema da região de Alola.
Em termos quantitativos, os novos jogos adicionam bem menos novidades do que as gerações anteriores. Gold/Silver, por exemplo, representam uma revolução muito maior no metagame e nas mecânicas como um todo. No entanto, o que Sun/Moon faz para renovar essa fórmula e torná-la mais atraente para novos e velhos jogadores é algo incrível. Sem qualquer exagero, trata-se de uma das melhores e mais divertidas aventuras de toda a série exatamente por saber dosar o novo com o velho. É a evolução perfeita daquilo que vimos ao longo dos últimos 20 anos.
Seja você um veterano, alguém que deixou de acompanhar a série há tempos ou mesmo um novato que veio por conta de Pokémon GO, saiba que Pokémon Sun/Moon é a melhor experiência que você vai encontrar em sua jornada. Pelo menos até a próxima geração — afinal, evolução é isso.