Em seu lançamento original, The Last of Us já apresentou um roteiro bem diferente de tudo ao que estamos acostumados. A sutileza do enredo e as nuances da condição humana, em meio à violência de um apocalipse que devastou o mundo, constituíram um dos maiores jogos da geração passada e, sem dúvida nenhuma, o melhor jogo de 2013.
Agora, oito meses depois, a Naughty Dog volta à carga com Left Behind, DLC que expande a história da protagonista Ellie, por meio de uma visita ao passado dela. É um flashback de um mundo bem diferente daquele que vimos no game normal, mesmo que essa mudança exista apenas aos olhos da personagem principal. Não é um jogo de ação, é uma experiência lúdica.
Se você espera ação desenfreada e muito tiroteio, pode ir jogar seu Call of Duty e não se aventure por Left Behind. Se o jogo normal já era mais focado na furtividade e na inteligência, em vez da força bruta, esse DLC leva isso às últimas consequências. Ao longo das cerca de duas horas necessárias para chegar ao final da expansão, você enfrentará poucos inimigos e se verá em menos de meia dúzia de situações de combate.
A história é contada em dois momentos distintos. O primeiro se passa durante os incidentes do game principal, durante o período em que Joel fica incapacitado devido a um ferimento. E o segundo, que constitui boa parte da experiência, mostra situações antes da aventura por meio de um encontro entre Ellie e sua amiga Riley.
É aí que a Naughty Dog exibe, mais uma vez, sua capacidade de inovar. Mostrando muita coragem, a empresa entrega uma experiência baseada completamente nos diálogos e situações muitas vezes infantis, mas que trazem um sorriso ao rosto de qualquer um que não tenha um coração de pedra. Afinal de contas, quem, quando criança, não se alegrava ao ver um carrossel todo iluminado ou dançava sozinho ao ouvir uma música boa? Tem gente que faz isso até hoje.
Se você espera ação desenfreada e muito tiroteio, pode ir jogar seu Call of Duty e não se aventure por Left Behind.
Esta é a maior elegância do roteiro de Left Behind. Por meio dos cortes secos criados por uma direção visual muito bem feita, observamos o que levou Ellie a se transformar de uma pré-adolescente que via o mundo com simplicidade a alguém capaz de lançar um tijolo em meio a um grupo de humanos e infectados, fazendo com que os dois se matem mutualmente. É a morte da inocência e a noção de que o mundo pode ser muito, mas muito desgraçado.
Em seus aspectos técnicos, Left Behind é uma experiência tão profunda, densa e intuitiva quanto seu irmão maior. A jogabilidade realista e ao mesmo tempo livre retorna em grande estilo, com novos cenários enormes e cheios de detalhes que contam uma história por si só. Documentos relatam a luta de um novo grupo de sobreviventes, enquanto elementos como manchas de sangue mostram que muito aconteceu por ali.
Um toque de novidade é adicionado pelos momentos em que humanos e infectados interagem em um mesmo cenário. Ao contrário do durão e resistente Joel, Ellie é pequena e fraca, portanto, a estratégia é mais do que nunca necessária aqui. Essas situações, se bem usadas pelo jogador, podem representar um trunfo, ou então, a morte de maneiras extremamente cruéis.
O único ponto negativo de Left Behind, na verdade, relaciona-se à versão nacional do título. A dublagem, outro ponto que mereceu elogios no game original, aparece aqui pouco inspirada e cheia de problemas de tradução. Felizmente, isso não mina a experiência, mas ela será melhor aproveitada com o áudio original e apenas as legendas em português.
Ainda falando sobre a parte sonora, Gustavo Santaolalla retorna com mais uma trilha sonora inspirada. No tema “Left Behind”, que serve como fundo dos créditos finais, ele fará com que você fique mais uma vez grudado ao sofá escutando a música triste, enquanto reflete sobre tudo o que acaba de acontecer. É o final épico e intimista para uma experiência envolvente e profunda.
Left Behind é difícil de definir em palavras. Há muito a ser dito e muito pouco que possa ser expressado de maneira rápida, em poucos parágrafos. Mas fica, mais uma vez a certeza: The Last of Us mostra, novamente, que os jogos ultrapassaram o caráter de mera diversão descompromissada e se tornaram verdadeiras obras de arte. À Naughty Dog, obrigado por tudo.