A produção de Sonic Mania começou lá em meados de 2015, sob o título fake de “Sonic Discovery”, e, apesar de a Sonic Team querer criar um novo jogo do borrão azul em 2D, eles não queriam fazer um simples remake. Então, para esta importante missão, a Sega se aliou às duas principais figuras por trás dos ports dos jogos clássicos do personagem para aparelhos mobile: Christian Whitehead e Simon Thomley (cabeça por trás da Headcannon), além do grupo indie PagodaWest Games para que eles conduzissem esta importante celebração da franquia.
Houve uma grande comoção quando Sonic Mania foi oficialmente anunciado na festa de aniversário de 25 anos do ouriço azul, em junho de 2016. Foi quase como a segunda vinda de Jesus na Terra, afinal, o grandioso ícone da Sega durante os anos 90 parecia estar finalmente de volta, e com força total. Pequenino, gorduchinho, fofinho… com apenas dois companheiros ao seu lado e, claro, estrelando um novo jogo totalmente em 2D.
Foi um pouco mais de um ano de espera até que o game fosse finalmente lançado para todas as plataformas da atual geração; e ao longo deste tempo a publicidade de Sonic Mania pegou pesado em seu principal aspecto: a nostalgia. Apresentando imagens, músicas e vídeos do ouriço percorrendo fases clássicas e um pouquinho de uma fase nova aqui e acolá, a Sega fez um ótimo trabalho para manter a chama do hype acesa.
Contudo, o golpe de misericórdia veio com o primeiro trailer animado, que referenciava até mesmo os concept arts de Sonic, e mostrava um pouco da identidade visual que vislumbraríamos na versão final do título.
Agora que Sonic Mania finalmente está em nossas mãos, que todo o embalo do hype pré-lançamento finalmente passou e que, enfim, provamos, destrinchamos e detonamos este novo título do ouriço azul mais veloz dos games (se é pra ser nostálgico, então velhas gírias são necessárias!), é possível afirmar que a espera valeu mais do que a pena.
Um dos pilares que sustenta Sonic Mania é a nostalgia, disso não há dúvidas. Mas, hey! Isso não é ruim, de forma alguma. Tal constatação se dá não apenas pelo revival das memórias afetivas em si (que é um sentimento bom de ser apreciado vez ou outra), mas também porque o game é bastante capacitado ao apresentar uma completa repaginação de tudo que conhecíamos dos jogos 2D do ouriço, até então. E claro, apresentar novidades de uma forma singular.
Em outras palavras, além de pegar carona na nostalgia de uma forma competente para conduzir todo o cerne do jogo, Sonic Mania reinventa (e melhora) praticamente tudo que já tínhamos visto no universo de Sonic, e traz particularidades ao trazer novidades que irão agradar a todos os públicos – e especialmente os fãs de longa data.
De acordo com o produtor Takashi Iizuka, Sonic Mania nasceu da paixão que os fãs têm pelos jogos clássicos do Sonic em 2D.
De acordo com Takashi Iizuka, líder e produtor na Sonic Team em uma entrevista ao IGN, Sonic Mania nasceu como um projeto de amor, que nasceu da paixão que os fãs têm pelos jogos clássicos do Sonic em 2D. Para este esquema, até mesmo uma colaboração com outros grupos foi feita: “É a primeira vez que a Sega faz este tipo de parceria e nós esperamos que todos se surpreendam e se contentem com este título”, alegou Iizuka.
“Mas o que é esta repaginação/reinvenção que você tanto fala, Jejé?”. Esta reelaboração diz respeito não apenas às fases clássicas que trouxeram de volta em Sonic Mania, mas também às mecânicas, à jogabilidade, às músicas, aos inimigos, ao design e todas as suas subdivisões, às animações e cutscenes… enfim, praticamente tudo!
Se antes você achava os jogos do Sonic chatos por serem incoerentes com sua própria proposta (um jogo que combina velocidade com platforming), saiba que as mecânicas aqui foram melhoradas (e agora tudo está realmente veloz!). E, ao casar esta característica com uma jogabilidade clássica/simples – isto é, apenas pular obstáculos/inimigos e seguir em alguma direção, praticamente – e um objetivo e ao mesmo tempo divertido level design repleto de caminhos alternativos, referências ao universo do ouriço e conceitos bacanas por trás da criação dos cenários; temos um dos melhores títulos 2D do borrão azul já feitos em questão de tecnicidade.
No que diz respeito às fases, no total elas são 13 contando com Ato 1 e Ato 2, e destas, apenas 5 são cenários completamente originais: Studiopolis, Press Garden, Mirage Saloon, Titanic Monarch e Egg Reverie. Há ainda 2 tipos de bonus stage, o Blue Spheres que retorna diretamente de Sonic The Hedgehog 3 (só que com uma resposta de comandos muito mais calibrada e uma variação maior de cenários), e o Dimension Heist, que é bastante similar à fase bônus de Sonic CD.
E por mais legal que estas novas fases sejam, é bacana perceber como as clássicas são revividas e reinventadas. Explicando melhor: em seu Ato 1, os cenários antigos mesclam todos os Atos das fases originais em uma só; enquanto que em seu Ato 2, trazem referências à todas as fases semelhantes que existem em outros jogos do ouriço. A Green Hill Zone de Sonic Mania, por exemplo, mescla em sua primeira parte o Ato 1, 2 e 3 da Green Hill Zone original de Sonic The Hedgehog. Já a parte 2 do cenário combina um pouco da Emerald Hill (Sonic The Hedgehog 2), da Angel Island (Sonic The Hedgehog 3) e da Palmtree Panic (Sonic CD), além de apresentar novas rotas e novos inimigos.
Outra re-imaginação bacana em Sonic Mania é a campanha de Knuckles. O equidna briguento possui algumas diferenças em sua aventura – poucas, mas ainda assim divertidas o suficiente para se tornarem memoráveis, tal qual em Sonic & Knuckles. Em algumas fases, por exemplo, ele começa em lugares diferentes de Sonic e/ou Tails, e na Mirage Saloon Zone em específico, ele tem até mesmo sua própria música durante o Ato 1. Em outro segmento do jogo, Knuckles ainda tem uma boss battle exclusiva, e se o jogador abrir os modos secretos do título, consegue até mesmo desbloquear um final alternativo para o personagem.
Por falar em modos secretos, assim como seus predecessores, Sonic Mania também traz outras formas de jogar e de se divertir. Além do Mania Mode, que é onde o jogador escolhe um save slot e um dos 3 personagens disponíveis para começar a aventura principal (tal qual o menu principal de Sonic 3 & Knuckles); há ainda o Time Attack para aqueles que quiserem correr contra o relógio e desafiarem a si mesmos, e o Competition onde você tem que vencer uma corrida contra outro personagem em uma tela split-screen.
Por fim, ainda há o Options, onde é possível selecionar o idioma, mudar os controles, ajustar o volume das músicas e dos efeitos sonoros, e até mesmo alterar os filtros de vídeo – o que funciona melhor se você tiver uma TV de tubo.
Coletar todas as esmeraldas no Dimension Heist e todas as medalhas de prata no Blue Spheres, por mais difícil que sejam, recompensam o jogador com ótimos conteúdos extras.
Ao jogar o bonus stage Blue Spheres e coletar as medalhas prateadas é possível também desbloquear habilidades in-game para os personagens (como o Insta-Shield de S3&K e o Super Peel Out de Sonic CD). Além destas técnicas, pode-se habilitar também os modos secretos de jogo, dentre os quais estão o Debug Mode, “& Knuckles Mode” (que adiciona o Knuckles como segundo personagem ao invés do Tails), e o saudoso Stage Select. Infelizmente todos estes modos secretos podem ser acessados apenas através do save slot “No Save” dentro do menu Mania Mode.
Coletando todas as medalhas prateadas no clássico bonus stage de S3&K também garante ao jogador acesso a 2 minigames e um último e cobiçado menu: o Mean Bean (um minigame onde você joga Puyo Puyo contra alguém ou contra a AI), o Blue Spheres (no modo clássico e no modo reinventado de Sonic Mania) e o D.A. Garden, que é basicamente o Sound Test.
E já que mencionamos música, porque não falar das canções? Grande parte das melodias de Sonic Mania foram compostas por Tee Lopes, um usuário do YouTube responsável por remixes de diversas faixas de diferentes trilhas sonoras da franquia. E apesar de ele ter sido escolhido pela Sega para a composição das novas faixas e também rearranjos das fases clássicas, o veterano Jun Senoue ainda esteve envolvido na área de engenharia de som do game – o que, convenhamos, ele manja como mais ninguém nos jogos do ouriço.
Sobre as músicas em si, é impressionante como Tee Lopes conseguiu a proeza de manter o sentimento de nostalgia com os samples rearranjados dos cenários re-imaginados; utilizando bitrates que remetem ao áudio dos consoles 16bit, mas sem perder a fidelidade de um som de alta qualidade. Todas as melodias combinam perfeitamente com as fases, batalhas e cutscenes, tornando todos estes momentos marcantes e, porque não dizer, dançantes até.
A dupla Hyper Potions também precisa ser creditada pelo ótimo trabalho com algumas faixas promocionais da trilha sonora de Sonic Mania. A dupla é responsável pela música da primeira abertura do game, por exemplo; cujo estilo de animação aliás, lembra muito a de Sonic CD.
A parte gráfica do título, por sinal, também merece destaque. As cutscenes in-game lembram muito as de S3&K e Sonic CD, e continuam com o papel de manterem a narrativa fluindo de maneira sútil e envolvente, mesmo não havendo nenhum diálogo. Por outro lado, os movimentos dos personagens estão amenos, idílicos até, repletos de zelo e polidez em sua modelagem para presentear os jogadores com breves e marcantes momentos.
Em entrevista, Iizuka disse que a regra geral para a arte, era que Sonic Mania estivesse acima da qualidade dos jogos de MegaDrive, mas abaixo dos de Saturn.
Já as aberturas e os encerramentos do game são reproduzidos como se fossem desenhos animados, o que marca mais um ponto na tabela da memória afetiva. Iizuka, que também atuou como supervisor de animação, até mesmo disse em entrevista à Famitsu que a regra geral para a arte, era que Sonic Mania estivesse acima da qualidade dos jogos de MegaDrive, mas abaixo dos de Saturn, muito possivelmente a fim de manter a lembrança e o sentimento de nostalgia.
Por sinal, como você bem deve saber, tal qual em todos os jogos do borrão azul, para conseguir ver a animação verdadeira de encerramento é preciso coletar todas as 7 esmeraldas do caos, certo? E é aqui que entramos em um tema bastante discutível e relativo: a dificuldade. Para um jogador veterano da franquia Sonic, talvez não seja impossível realizar este feito, afinal o bonus stage Dimension Heist é bem similar ao de Sonic CD… e, portanto, igualmente difícil. Todavia, para os jogadores de primeira viagem, a tarefa pode se tornar um ponto passível de crítica.
Outro aspecto que deve incomodar um pouco os jogadores novos e/ou desacostumados com este tipo de artifício é a narrativa utilizada em Sonic Mania. O plot, simples e até um pouco bobo como sempre deveria ser, é explicado unicamente através do manual do game: o Dr. Ivo “Eggman” Robotnick subitamente descobre uma brecha dimensional na atmosfera através da detecção de uma onda diferente, emitida na Angel Island. Se dando conta de que isto poderia ser uma fonte de poder incomensurável, ele imediatamente envia sua elite de robôs assistentes – os Hard-Boiled Heavies (HBH) – para recuperar o que quer que fosse isto.
A partir deste ponto, o jogo enfim tem início, e passamos a acompanhar a narrativa através de cutscenes entre as fases do título: Sonic e Tails aterrissam em Angel Island bem no momento em que os HBH já estavam lá, escavando uma misteriosa gema do solo (a Phantom Ruby). Assim que eles retiram a pedra, o tempo e espaço ao redor de todos subitamente se transforma, e imediatamente catapulta-os para a Green Hill Zone. Agora resta a Sonic, Tails & Knuckles impedir que os HBH entreguem esta misteriosa gema ao Dr. Eggman.
Em uma época em que reinam os jogos com diálogos repletos de escolhas e longas cutscenes cinematográficas, talvez jogadores novos sintam certa estranheza com esta maneira simples e sútil com a qual uma história é contada.
As referências, inclusive, apesar de serem um deleite para os fãs antigos, talvez não sejam tão bem apreciadas (quiçá percebidas) assim pelos jogadores novos também. Um bom exemplo é na fase Mirage Saloon, onde os obscuros personagens Fang the Sniper, Bark the Polar Bear e Bean the Dynamite fazem aparições especiais. Ou ainda, a boss battle da Chemical Zone Act 2, que é uma homenagem direta ao pouco conhecido título Dr. Robotnik’s Mean Bean Machine.
Até mesmo uma das músicas da trilha sonora tem uma referência a Michael Jackson.
Até mesmo uma das músicas da trilha sonora tem uma referência a Michael Jackson: a faixa voltada aos mini bosses de Sonic Mania chama-se “Danger on the Dance Floor!”, uma alusão à canção “Blood on the Dance Floor” do falecido astro do pop, que teve uma famigerada participação na trilha sonora de Sonic The Hedgehog 3.
Outro fator que pode incomodar a todos os jogadores é o level design das fases antigas. Em sua grande maioria, todos os cenários brilham com caminhos intuitivos e divertidos, e em especial no Ato 2 (que, como citado anteriormente, é uma fase quase que totalmente nova). Todavia, o Ato 1 de algumas áreas clássicas não recebeu uma devida alteração/correção em seu design, o que pode frustrar muitos jogadores, mesmo os veteranos.
Muitos bugs também já foram relatados internet afora. E apesar de não terem ocorrido comigo em minha jogatina, boa parte das reclamações diz que estes bugs ocorrem geralmente em outros modos de jogos, e não na tanto na campanha principal.
E embora todas as cinco fases novas sejam um primor em sua música, arte, design e conceito; ainda acho uma quantidade muito pouca. Ainda me fascina, por exemplo, a concepção por trás da Press Garden Zone, cujo Ato 1 é uma catedral em ruínas com um jardim repleto de árvores japonesas, mas transformada pelo Dr. Robotnick em uma fábrica de impressão de jornais. Na passagem dos atos segue então uma mudança de estação do ano, revelando por fim no Ato 2 um jardim recoberto por neve e pétalas de cerejeiras caídas… eu honestamente, gostaria de ver mais fases com este tipo de apreço em sua criação, mesmo nos mínimos detalhes.
De toda forma, nenhuma destas possíveis características passíveis de críticas diminuem a qualidade de Sonic Mania. Mesmo que você se incomode com a forma que a narrativa segue, ou se assuste com uma tela de game over que o fará jogar toda uma fase do começo novamente, ou fique irritado por conta dos bugs ou porque agora o Sonic está veloz demais e você não consegue acompanha-lo, ou se frustre por não conseguir pegar nenhuma das 7 esmeraldas; todos estes pontos possivelmente negativos, na verdade, são bastante subjetivos. Isto só prova que que este título é certamente um dos melhores jogos do ouriço, em muito tempo.
O jogo foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Sega.