Vampyr

Vampyr

por Edes WR

Sangue de gosto amargo…

Seja na literatura com as obras de Bram Stoker (“Drácula’) e Anne Rice (“Entrevista com o Vampiro”), no cinema com Béla Lugosi e outras incontáveis encarnações e versões, a lenda dos vampiros sempre geraram fascínio e encanto pelo seu teor assustador e, ao mesmo tempo, atraente e misterioso. É uma descrição que também cabe aos protagonistas da lenda, sejam homens ou mulheres com sede de sangue vivo.

Parece uma temática rica o suficiente para a criação de um jogo imersivo, com personagens interessantes e jogabilidade recheada de poderes sobrenaturais. No entanto, o estúdio responsável pelo excelente e modesto Life is Strange tentou abraçar um mundo maior do que sua limitada experiencia era capaz de lidar…

A sede

Ao despertar em uma vala cheia de corpos em estado de putrefação, nós, jogadores, estamos tão perdidos quanto o próprio protagonista, que vê o mundo sem cores, ouve sons de vozes abafadas e tem o andar cambaleante como o de alguém embragado. A unica orientação disponível é a silhueta feminina que caminha em nossa direção, emanando uma aura avermelhada e tentando um diálogo que soa completamente incompreensível.

Sem controle de suas ações, o protagonista toma a figura feminina em seus braços e, tomado de uma fúria e sede incontroláveis, morde o pescoço da jovem ao mesmo tempo em que suga seu sangue a fim de saciar sua sede. Uma cena clichê e bem previsível no tipo de história em que estamos prestes a embarcar.

Vampyr, ao contar sua história de forma boba, faz uso de todos os elementos conhecidos do mundos dos seres sobrenaturais degustadores de sangue de forma básica e sem inspiração.

Ao recobrar o controle de seus instintos, nosso protagonista, Jonathan, agora já tendo recobrado parte da memória perdida, reconhece a jovem morta em seus braços como sua irmã, Mary. Valendo-se de seus conhecimentos como médico, tenta, em vão, conter o sangramento na jugular, mas já é tarde. Ainda sem entender o que acabou de fazer nem o por que, ele se dá conta que testemunhas estão presentes e passam a persegui-lo pelas ruas de Londres.

Encurralado em uma velha residência e ainda sem entender o que se passa, Jonathan decide por um fim ao pesadelo que está vivendo e, apontando uma arma para o próprio peito, dispara, acreditando que esse ato fará com que desperte daquela insanidade.

Falso mistério…

Após essa intrigante e nem tão misteriosa situação em que nosso protagonista se encontra, despertamos para descobrir que o tiro no peito não fez mal algum, como já era de se esperar. O jogo nos apresenta por textos, de forma extensa, mas bem superficial, uma infinidade de menus e configurações que fazem alusão total à “condição de vampiro” do personagem. E é aqui que o jogo se perde ao colocar, nas mãos de um jogador que sabe exatamente o que se passa, um protagonista confuso e que não está sabendo lidar com o que acontece na sua vida.

Passamos a explorar o mundo, que possui uma boa ambientação vitoriana, exatamente na condições em que estávamos quando despertamos na pilha de cadáveres, ou seja, com roupas semelhantes a trapos, sujos de sangue e provavelmente fétidos como a morte. E é nessas condições que buscamos respostas, seja conversando com transeuntes, entrando em estabelecimentos comerciais, lutando contra criminosos nos becos escuros das ruas e, ainda assim, tendo diálogos cordiais e pomposos com todos os NPCs.

É algo que se esperaria de um lorde inglês e não de alguém sem memória, que acaba de matar a própria irmã a mordidas, tentando suicídio na sequência. Essa falta de credibilidade com a ambientação e uma ausência completa de imersão permeiam Vampyr do inicio ao fim.

Amálgama de jogabilidades

A parte de ação e combate do jogo toma emprestado vários conceitos de RPGs de ação atuais, como o uso de duas armas, uma para curto e outra para longo alcance, um ataque para atordoar o inimigo, itens de cura e vantagens configuráveis para acesso no direcional digital.

A jogabilidade é uma salada de elementos copiados, interessantes de forma isolada, mas que não dialogam de forma equilibrada, tornando tudo enfadonho e sem personalidade.

Uma esquiva propicia alguns segundos de invencibilidade e tudo isso é permeado pelo sistema de “stamina”, que limita a quantidade de ações do personagem, afim de tornar o combate mais equilibrado e não apenas um sequencia de esmagamento de botões. Porém, todos esse elementos estão dispostos de forma pouco equilibrada, sendo o fôlego o mais discrepante de todos, por ser demasiadamente grande.

Isso propicia um maior número de ataques mas, também, demora uma eternidade para ser regenerada, quebrando o ritmo dos combates e deixando tudo muito longo e cansativo, completamente o contrário do que se imagina de uma batalha envolvendo seres com reflexos sobrenaturais.

A quantidade de  menus e submenus presentes é gigantesca e pouco intuitiva, desde os que se referem às habilidades do protagonista até os que representam as condições dos NPCs e áreas da cidade, elementos importantes no decorrer do jogo. Por estarem escondidos e serem pessimamente explicados e demonstrados nos infindáveis tutoriais em forma de texto, são apenas desinteressantes e, talvez por esse motivo, não façam diferença no decorrer da evolução do título.

Clichê

Como dito na introdução, histórias envolvendo vampiros permeiam o imaginário popular de forma que não se pode tratar o espectador como se aqueles elementos fossem algo completamente novo e desconhecido. É preciso, sim, fazer uso de elementos clássicos, mas, também, saber brincar com as expectativas.

Vampyr, ao contar sua história de forma boba em alguns momentos, faz uso de todos os elementos conhecidos do mundos dos seres sobrenaturais degustadores de sangue de forma básica e sem inspiração, chegando ao cúmulo de ter seu desfecho sabido horas antes do embate final, de tão previsível que é a trama.

Da mesma forma, sua jogabilidade é uma salada de elementos copiados de outros jogos de sucesso, interessantes de forma isolada, mas que não dialogam de forma equilibrada entre si, tornando tudo muito enfadonho e sem personalidade. Uma temática tão rica, desperdiçada ao se tentar abraçar mais do que o estúdio é capaz de lidar.

O jogo foi analisado no PlayStation 4, em cópia cedida pela Focus Home Interactive.