Encerrou-se no dia 30 de junho o Brazil’s Independent Game Festival de 2019, também conhecido simplesmente como BIG Festival, o maior evento de jogos independentes da América Latina. O que se percebia em mais uma edição, logo de cara, era a imensa influência mundial, com um sutil aumento de títulos europeus nesta edição. Como o grande foco sempre foi a indústria nacional, além de títulos acontecem também palestras com cases de sucesso, no primeiro dia de evento, com criadores falando dos percalços de ser um criador independente neste Brasil varonil.
A primeira grande surpresa, além da mudança de local (o evento aconteceu no Clube Homs, em São Paulo), foi a imensa parcela de mulheres em um evento que antigamente era dominado por pessoas como eu, homens brancos pançudinhos com óculos e barba, o que me faz pensar que estou no UliVerso, e agora correspondendo levemente às pesquisas sobre a maioria delas no público gamer brasileiro. Elas estavam lá, se aventurando com grande dedicação aos jogos, além de termos os títulos criados também por garotas.
O orgulho LGBT+ também estava bem representado nos games com Amanda Sparks, que ficou conhecido como o criador de Duel Toys e trouxe sua persona feminina no jogo de vôlei Spikes in High Heels/ e a dupla do estúdio Pixel Punk, palestrando sobre o maravilhoso Unsighted e seu Pixel Art espantoso, que estranhei náo estar concorrendo a nada.
Quem conhece o BIG Festival sabe que os fatores sociológicos estão sempre presentes e os jogos educativos dividem espaço com os de conscientização social. Tinha até game sobre a onda do momento, chamado Fake News! Isto não é um jogo!, mas o campeão foi Cidade em Jogo nesta categoria, mostrando na pele como seria gerenciar uma cidade e a importância do cidadão ser parte da gestão municipal. Um destaque interessante ficou com o prêmio de o melhor jogo de estudante, o promissor Burning Daylight, com suas luzes e visual imersivo pessimista.
Como de hábito, discordo de certos vencedores, mas é questão de opinião, fazer o que? A parte boa é que não tem problema nisso, pois são todos ótimos jogos e cada um tem um acabamento gráfico que parece ter saído de grandes empresas. Gris, do estúdio espanhol Nomada, traz gráficos incrivelmente animados e além da imaginação enquanto controlamos uma garota em um mundo onírico, superando desafios que não envolvem riscos ou agressão à personagem.
O jogo também levou como Melhor Arte, título que achei que deveria ficar com Forgotten Anne, a obra-prima do estúdio dinamarquês Throughline Games por ser, praticamente, um anime do estúdio Ghibli jogável. Outro que tem destaque em arte, cultura e diversidade é o indígena Huni Kuin: Os Caminhos da Jiboia, que faturou o prêmio de Melhor Jogo de Diversidade com sua mitologia Kaxinawá em um game de plataforma.
Pessoalmente, achei Fate of Kai com um acabamento artístico muito melhor, mas falando de mais jogos maravilhosos, temos o vencedor Adore, o Melhor Jogo Brasileiro com seu “Moba single player” e summons em cenários muito bem compostos e coloridos, desbancando Pixel Ripped 1989 e Starlit on Wheels, vencedores de outras categorias. Como Melhor Jogo XR/VR temos o apaixonante Moss, que mistura “Stuart Little” com The Legend of Zelda em gráficos de fantasia de contos de fadas e desafios de gente grande.
O Melhor Jogo em Voto Popular foi Spaceline Crew, que pode ser resumido como um Overcooked do espaço, o que era previsível visto que este já era o melhor jogo da edição 2017 do BIG Festival por ser cômico, divertido e multiplayer, fator que fazia lotar as filas de espera em todos os títulos desse gênero lá presentes. Ao meu ver, Hookbots deveria ter levado pelo menos o prêmio de melhor multiplayerm mas perdeu para Spitlings, um Battle Royale entre bactérias que tentam sobreviver prejudicando às outras em organismos apertados. O melhor jogo da América Latina também é para mais de uma pessoa, Quantum League, um FPS colorido que lembra Overwatch.
Patrocínio estatal e privado
Como já dito antes, esta edição teve um foco especial para os criadores indies nacionais, com conteúdo que ia desde palestras sobre como planejar, onde estudar game design, conseguir distribuidoras, como ser contratado por empresas e todo o perrengue que títulos já lançados passaram, desde possíveis problemas relacionados à monetização ou o atendimento à demanda depois que se tornam sucesso.
Uma grande novidade foi a presença, além da ABRAGAMES e SPCINE patrocinando os projetos, do Facebook Gaming e Google palestrando sobre onde publicar, fazer streaming e conseguir parcerias para tirar seu jogo do papel e mostrá-lo ao público, pois a demanda é imensa e pode ser atendida, bastando que criadores, publicadores e divulgadores trabalhem em sinergia.
Um fator incomodante de trocar o Centro Cultural Vergueiro, onde ocorreram as edições anteriores do BIG Festival, pelo Clube Homs foram os espaços para os jogos, que pareceram preteridos em relação aos palcos de apresentações. Tínhamos um na entrada, outro na área de jogos e um interno onde aconteceram as palestras. Os games ficaram todos apertados ali, prejudicando a passagem e aumentando as filas de espera.
Somando os jogos de estudantes e o espaço Panorama, com títulos que não entraram na premiação, mas eram expostos em estandes ao fundo, tivemos mais uma ótima edição do BIG Festival, que se consagra como um evento obrigatório no calendário dos criadores independentes e cria relevância brasileira para a indústria de games no mundo todo. Outra parte boa é que teremos mais jogos para a coluna INDIEcações! Fica a expectativa de que, no ano que vem, ele retorne ao valioso Centro Cultural Vergueiro, um local espaçoso e arejado, além de multicultural.